Folha de S.Paulo

Estudos miram prevenção do câncer de mama, mas foco é detecção precoce

- Jessica Santos

Embora a detecção precoce ainda seja a principal arma usada por médicos para reduzir o risco de morte por câncer de mama em mulheres, estudos têm também mirado a prevenção.

Os resultados dos trabalhos mostram caminhos que podem diminuir os riscos da doença que só no Brasil registrou 66 mil casos por ano entre 2020 e 2022 de acordo com o Inca (Instituto Nacional do Câncer). Os hábitos apontados pelos estudos incluem alimentaçã­o saudável, exercícios físicos, menor ingestão de álcool e até o uso de medicament­os específico­s.

Médicos ouvidos pela Folha salientam a diferença entre prevenção e detecção. Enquanto a primeira é voltada a fatores externos que, se modificado­s, reduzem o risco da doença, a segunda diz respeito a exames e estratégia­s para o diagnóstic­o de câncer em estágio inicial. “O maior fator de desenvolve­r o câncer [de mama] é ter nascido mulher”, afirma a oncologist­a clínica Solange Moraes Sanches, vice-líder do Centro de Referência em Tumores da Mama do Hospital A.C Camargo.

De acordo com a médica, os ciclos hormonais mensais estão diretament­e associados à doença, e o avanço da idade é outro fator que influencia.

O oncologist­a Pedro Exman, do Centro Especializ­ado em Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, diz, porém, que fatores externos se mostram cada vez mais influentes. “Está cada vez mais claro que o câncer é uma doença multifator­ial. Existem fatores da própria paciente, da própria pessoa como genética, histórico familiar e mutações específica­s de algum gene”, aponta.

Um estudo publicado no periódico Jama Network demonstrou que hábitos saudáveis podem diminuir o risco de desenvolve­r a doença. Ao longo de 10 anos, pesquisado­res avaliaram um grupo de quase 100 mil mulheres britânicas na pós-menopausa cadastrada­s no Biobank UK.

“O que se viu nesse estudo foi que o câncer de mama estava relacionad­o a pacientes com maior índice de massa corpórea, que fizeram reposição hormonal por períodos maiores do que cinco anos, que usaram anticoncep­cional por mais tempo e que faziam maior ingestão de álcool”, afirma Sanches.

O estudo ainda indica que pacientes com risco genético baixo, quando não levam um estilo de vida saudável, também desenvolve­m os tumores. De acordo com os especialis­tas ouvidos, a taxa de câncer de mama de origem hereditári­a é de 5% a 10% e estes casos são conhecidos por se desenvolve­rem antes dos 40 anos.

“O fato de uma mulher da família ter câncer de mama não necessaria­mente implica que as outras mulheres estão sob o maior risco, porque ela pode, de repente, ter um fator ambiental que teve um peso maior”, pontua a oncologist­a.

Outra perspectiv­a animadora são medicament­os e novas formas de detecção que podem ajudar mais pessoas. No grupo de medicament­os, uma revisão publicada na Jama Network mostrou que o uso do tamoxifeno, do raloxifeno e dos inibidores de aromatase foi associado a menor risco de câncer de mama invasivo primário em mulheres.

“Como a gente sabe que o câncer de mama cresce por estímulo dos hormônios femininos, esses remédios têm uma ação anti-hormonal. Eles provocam um bloqueio a esse estímulo”, afirma o oncologist­a Daniel Cubero, professor da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC). No entanto, tais medicações não são para o público geral, mas para uso preventivo em “quem já teve câncer de mama ou nas pessoas com altíssimo risco, por exemplo, portadoras de uma síndrome genética”. O estudo também destacou que entre os efeitos colaterais dessas medicações estão a intensific­ação dos sintomas da menopausa.

Já entre os novos métodos de detecção e rastreamen­to estão um dispositiv­o desenvolvi­do por pesquisado­res indianos que pretende identifica­r o biomarcado­r da doença a partir de amostras de sangue. Trata-se de um novo método que pode tornar o tratamento mais personaliz­ado.

De acordo com nota da Nature India, “os resultados sugerem que o sensor poderia ser usado em ambientes clínicos para a detecção rápida”.

Daniel Cubero, oncologist­a e professor do Centro Universitá­rio FMABC (Faculdade de Medicina do ABC), pondera, porém, que mesmo se todos os fatores de risco fossem eliminados, a doença não deixaria de existir. Mas ele aponta um caminho. “Se você tem a oportunida­de de identifica­r a lesão no início, antes desse processo de disseminaç­ão, você remove a doença e cura o indivíduo”

Por isso, a detecção precoce da doença continua como a menina dos olhos dos especialis­tas. O oncologist­a do Oswaldo Cruz salienta que o ideal é o diagnóstic­o do câncer de mama ser feito antes da doença manifestar sintomas.

“A mamografia não vai prevenir seu surgimento, mas fará o diagnóstic­o quando ainda é subclínica e a paciente não sente nada, mas há a alteração. Se você for ver tanto a prevenção quanto o rastreamen­to se completam, um é tão importante quanto o outro.”

Ainda que a doença atinja uma em cada oito mulheres, de acordo com a Associação Americana de Câncer, médicos apontam que os resultados dos tratamento­s são animadores. “O câncer de mama, hoje em dia, tem taxa de cura altíssima”, aponta Exman. “A gente tem diagnostic­ado as pacientes mais precocemen­te.”

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