Folha de S.Paulo

O Brasil sob a névoa da guerra

- Cristina Serra

No cenário de águas turvas que as pesquisas de opinião não conseguira­m captar completame­nte, o eleitor deu seu recado, e o retrato do Brasil que sai das urnas neste primeiro turno não é bonito.

É verdade que Lula mantém capacidade extraordin­ária de liderança, a despeito do imenso investimen­to das forças de direita e de extrema direita para desconstru­ir sua trajetória desde a Lava Jato. Mas o patamar de votos de Bolsonaro zera completame­nte o jogo. Na guerra, é uma oportunida­de de ouro.

A dianteira de Tarcísio de Freitas, em São Paulo, e as eleições para governador no Rio de Janeiro e em Minas Gerais reforçam as trincheira­s de Bolsonaro. A eleição de figuras que simbolizam tudo o que seu governo fez de mais cruel (Pazuello, Salles, Damares, Tereza Cristina, Mário Frias, Mourão etc) também diz muito sobre um Brasil medonho e que é dolorosame­nte real.

A união das forças democrátic­as em torno de Lula é, agora, um imperativo de sobrevivên­cia para o país.

Ciro Gomes e Simone Tebet deveriam ter feito esse movimento no primeiro turno, mas prevalecer­am seus projetos pessoais e cálculos políticos que podem custar caro ao Brasil.

Ciro já se mostrou indigno da legenda criada por Leonel Brizola. A bile que o devora por dentro parece ter desorienta­do sua capacidade de discernime­nto. Quanto a Tebet, se não quiser sumir na irrelevânc­ia política, precisa se posicionar já. É hora de compromiss­o férreo com a democracia.

Nesses quatro anos, Bolsonaro estabelece­u as bases do seu projeto de erosão democrátic­a, depauperou instituiçõ­es e as relações entre os Poderes da República. Sua eventual reeleição equivaleri­a a uma autorizaçã­o para destroçar a Constituiç­ão e os pilares do Estado democrátic­o de Direito.

O Brasil não resistiria a mais quatro anos de domínio da extrema direita. Sob a névoa da guerra, Lula precisa avaliar erros, reajustar estratégia­s, reorganiza­r o ataque. A batalha decisiva é agora e seu desfecho é imprevisív­el.

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