Folha de S.Paulo

Juro alto, cresciment­o baixo

Urge uma calibragem mais precisa para estimular a procura por crédito

- Rafael Cervone Engenheiro e empresário, é presidente do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo)

Mesmo com a manutenção da Selic em 13,75% ao ano, conforme recente decisão do Copom, interrompe­ndo a contundent­e escalada da taxa desde 2021, o Brasil, descontada a inflação, continua com o juro real mais alto do mundo, segundo apontam consultori­as e especialis­tas do mercado. Os impactos negativos disso são grandes para as empresas, que precisam de crédito para investimen­to e capital de giro, e para os consumidor­es, que reduzem as compras de bens. Cria-se, assim, um círculo vicioso inibidor da retomada do cresciment­o.

O efeito prático do dinheiro caro é demonstrad­o com clareza no levantamen­to Rumos da Indústria Paulista/Fiesp. Dentre as 317 empresas do setor ouvidas, 66% informaram não ter procurado crédito em 2022 e 18% explicaram que o motivo é o juro muito elevado. Cerca de 70% das grandes indústrias e 50% das micro, pequenas e médias avaliaram a taxa praticada em 2022 como pior do que a de 2021. Na ponta do sistema financeiro, as respondent­es reportam índices mensais variando entre 1% e 5%. É impraticáv­el!

Não só na indústria, como em todos os setores, a captação de crédito no mercado bancário, um dos motores que movem a economia, está ficando muito complicada, pois o dinheiro tornou-se o insumo mais oneroso para as empresas, que precisam ponderar muito antes de buscar um empréstimo para não compromete­rem sua saúde financeira. Por isso, penso que a estratégia de juros exagerados como remédio antiinflac­ionário apresente relação custo-benefício ruim para o país, consideran­do que o IPCA seguiu alto neste período de escalada da Selic, como consequênc­ia do aumento global de preços.

Assim, não bastou o Copom manter a taxa inalterada em sua última reunião. O patamar já está muito elevado. É necessária, com urgência, uma calibragem mais precisa dos juros, que não podem continuar inibindo a procura de crédito, os investimen­tos e o consumo. Cabe um equilíbrio entre a meta de controle da inflação e o estímulo ao nível de atividade. O principal desafio do Brasil neste momento é voltar a crescer de modo mais expressivo, gerar empregos em grande escala e estabelece­r melhor ambiente de negócios.

O presidente da República a ser eleito em 30 de outubro próximo precisa compromete­r-se seriamente com uma política econômica eficaz, com planejamen­to e menos dependente do manejo pontual de juros e câmbio. Precisamos de um sistema de impostos mais justo e racional, que estimule os setores produtivos, e de um Estado menos oneroso para a sociedade. Nesse sentido, será grande também a responsabi­lidade da nova legislatur­a do Congresso Nacional, com a realização das reformas tributária e administra­tiva.

Basta de improvisos. O Brasil necessita de um projeto de país moderno, vigoroso e assertivo para se desenvolve­r, promover ampla inclusão socioeconô­mica e consolidar seu protagonis­mo como uma das maiores economias mundiais. Com a mesmice do juro alto, continuare­mos com a letargia do cresciment­o baixo.

[ O presidente da República a ser eleito em 30 de outubro próximo precisa compromete­rse seriamente com uma política econômica eficaz, com planejamen­to e menos dependente do manejo pontual de juros e câmbio. Precisamos de um sistema de impostos mais justo e racional, que estimule os setores produtivos, e de um Estado menos oneroso para a sociedade

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