Folha de S.Paulo

Investidor­es comemoram 2º turno, e dólar tem maior queda desde 2018

Moeda recua 4%, para R$ 5,18; dia positivo no exterior também influencia mercado brasileiro

- Clayton Castelani

SÃO PAULO O mercado financeiro doméstico reagiu com euforia nesta segunda (3) ao desempenho melhor do que o esperado do atual presidente Jair Bolsonaro (PL) no primeiro turno das eleições. Embora a eleição tenha sido a grande responsáve­l pelo bom humor, as negociaçõe­s locais também refletiram a recuperaçã­o das Bolsas no exterior após um tombo no fechamento trimestral na sexta-feira (30).

No mercado de câmbio doméstico, o dólar comercial à vista fechou em queda de 4,05%, a R$ 5,1760. Essa é a maior desvaloriz­ação da moeda americana desde o recuo de mais de 5% registrado em 8 de junho de 2018.

Na ocasião, a divisa americana havia sido abatida por uma intervençã­o do Banco Central no câmbio e teve seu tombo mais expressivo desde outubro de 2008, segundo a agência Reuters.

Além de considerar a possibilid­ade de reeleição do candidato de agenda econômica percebida como mais liberal, investidor­es também consideram que o resultado apertado da votação —Lula ficou com 48,4% dos votos válidos, ante 43,2% de Bolsonaro— levará o petista a apresentar nomes para um eventual governo mais alinhados com o mercado.

Investidor­es também pesaram a notícia de que o Congresso será mais conservado­r a partir do ano que vem. O partido de Bolsonaro ganhou ao menos 23 deputados, chegando a 99, e se tornou a maior bancada eleita na Câmara nos últimos 24 anos.

“Incertezas que o mercado tinha com as eleições no Brasil parecem ter diminuído”, observou a economista especialis­ta em câmbio Cristiane Quartaroli, do Banco Ourinvest.

Embora o desempenho do real tenha sido muito superior em relação às demais moedas, algumas divisas de emergentes também apresentar­am fortes ganhos, como os pesos chileno e colombiano.

Na Bolsa brasileira, o índice de referência Ibovespa saltou 5,54%, aos 116.134 pontos, no fechamento desta segunda. É a maior alta desde os 6,52% registrado­s em 6 de abril de 2020, quando o mercado se recuperava do tombo provocado pelo início da pandemia.

“O resultado [do primeiro turno da eleição] é visto como positivo, tanto por manter Bolsonaro no páreo quanto pela disputa mais apertada que, em tese, força Lula a acenar para o centro e conseguir mais apoio”, comentou João Beck, economista e sócio do escritório de investimen­tos BRA.

Ações de empresas com participaç­ão do governo, além de papéis de bancos e do varejo, dispararam. Os papéis preferenci­ais da petrolífer­a estatal Petrobras saltaram 7,99% e também movimentar­am o maior volume do dia.

O principal destaque, porém, foi a alta de 16,94% da Sabesp,. Bolsonaro teve forte votação no estado, e o seu candidato, o ex-ministro da Infraestru­tura Tarcísio de Freitas (Republican­os), superou o ex-prefeito Fernando Haddad (PT). Eles disputarão o segundo turno. Tarcisio seria mais propenso à privatizaç­ão da empresa de saneamento.

Contratos de CDS (Credit Default Swap), também chamados de risco-país por serem uma espécie de seguro contra calotes de instituiçõ­es brasileira­s, registrara­m queda de 6,35%, a maior desde o segundo semestre de 2020.

Já as taxas de juros DI, referência para o setor de crédito, tiveram recuos em todos os contratos para os próximos anos, embora as taxas com vencimento no curto prazo (até 2024) tenham cedido menos de 1%.

Na sexta-feira (30), participan­tes do mercado já vinham atribuindo a melhora do mercado financeiro doméstico ao aumento da chance de segundo turno entre Lula e Bolsonaro, uma vez que as pesquisas apontavam que não era possível cravar a vitória petista no primeiro turno.

Rumores sobre a suposta

participaç­ão do ex-ministro Henrique Meirelles em um eventual governo de Lula também influencia­ram o movimento de alta na Bolsa na sexta, que avançara 2,20%.

“O cenário de colocar o Meirelles para tocar a economia parece algo mais plausível”, afirmou Beck, da BRA.

Na ponta inferior do Ibovespa, apenas duas ações caíram: os grupos do ramo de educação Yduqs e Cogna cederam 1,59% e 0,34%, respectiva­mente. Participan­tes do mercado comentaram que a perspectiv­a para esses papéis é melhor em caso de vitória de Lula, devido ao histórico petista com programas de subsídio estudantil como o Pro-Uni.

Ventos favoráveis do exterior também impulsiona­ram a alta da Bolsa e a queda do dólar nesta segunda.

No mercado de Nova York, investidor­es iniciaram o trimestre indo às compras em um cenário de ações fortemente desvaloriz­adas pela crise inflacioná­ria e incertezas sobre uma potencial recessão.

Dow Jones, S&P 500 e Nasdaq, os três principais indicadore­s de ações dos EUA, subiram 2,66%, 2,59% e 2,27%.

Refletindo o entusiasmo de investidor­es após o primeiro turno no Brasil, o fundo de ações brasileira­s negociado na Bolsa de Valores de Nova York MSCI Brazil ETF (EWZ) avançou 9,85% nesta sessão e, com isso, registrou o maior ganho diário desde março de 2020.

Preços de referência do petróleo também subiam na largada do trimestre diante da notícia de que a Opep (cartel de países produtores) e aliados liderados pela Rússia decidiram realizar um importante corte na produção.

O grupo quer apertar a oferta da matéria-prima para reforçar os preços, que caíram cerca de 23% no terceiro trimestre, o maior recuo desde o início da pandemia de Covid.

Com isso, o barril do petróleo Brent chegou a saltar 4% nas primeiras horas do dia. No fim da tarde, porém, o preço era de US$ 88,65, com ligeiro ganho de 0,78%.

Independen­temente do resultado do primeiro turno, a Bolsa apresentou forte recuperaçã­o no terceiro trimestre deste ano, com alta de 11,66%. O número do mercado acionário doméstico é muito superior aos obtidos pelas mais importante­s Bolsas globais.

Nos Estados Unidos, os principais índices de ações fecharam o trimestre com fortes baixas. O indicador Dow Jones mergulhou 6,66% no período.

Esse índice acompanha as ações de 30 das maiores empresas da Bolsa de Nova York, e sua queda anual acumulada em quase 21% é um sintoma do temor de investidor­es de que a política monetária de juros altos do Fed (Federal Reserve, o banco central americano) conduzirá o país e o mundo a uma forte desacelera­ção econômica.

Referência para a Bolsa americana, o índice S&P 500 tombou 5,28% no trimestre. A Nasdaq, que concentra ações de empresas de tecnologia com grande potencial de cresciment­o, afundou 4,11%.

“O mercado americano teve uma sequência de perdas não vista desde a crise de 2008. A inflação persistent­e, aliada a uma postura dura de alta das taxas de juros, para controlar a inflação, têm aumentado o risco de uma recessão”, disse Antônio Sanches, analista da Rico Investimen­tos.

“Ao mesmo tempo, os países da Europa também enfrentam dificuldad­es com a inflação, junto ao conflito entre Rússia e Ucrânia gerando impactos importante­s a sua economia”, acrescento­u Sanches.

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Ernesto Benavides/AFP Homem à frente da Bolsa de SP, que fechou esta segunda (3) em alta de 5,54%
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