Folha de S.Paulo

Alcolumbre articula reeleição de Pacheco de olho em 2025

Protagonis­mo gera incômodo e é atribuído a negociaçõe­s com gestão Bolsonaro

- Julia Chaib, Thaísa Oliveira, Ranier Bragon e Danielle Brant

BRASÍLIA Ex-aliado de Jair Bolsonaro (PL), o senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) se tornou uma das principais pontes do PT com o Senado. Ele é um dos responsáve­is por afiançar acordos em busca da reeleição de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) à presidênci­a da Casa.

Em diálogo constante com integrante­s da gestão Lula, Alcolumbre articula sua permanênci­a no comando da CCJ (Comissão de Constituiç­ão e Justiça) —a mais poderosa do Senado—, mas desde já mira no apoio do PT ao seu projeto de concorrer à presidênci­a do Senado em 2025.

Senadores —aliados e adversário­s de Alcolumbre— reconhecem que ele é individual­mente uma das principais lideranças da Casa. A ele são atribuídos adjetivos como “cumpridor” de acordos e bom articulado­r político.

Além disso, parlamenta­res apontam que, nos quatro anos de gestão Bolsonaro, Alcolumbre foi um dos principais operadores das emendas de relator no Senado, o que lhe garantiu ascendênci­a sobre os pares.

Mesmo que esse instrument­o tenha sido extinto por decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), a avaliação no Congresso é a de que a negociação pelo uso dessas verbas deu grande capital político ao senador.

A influência de Alcolumbre virou motivo de ciúmes no PT e, principalm­ente, na União Brasil. Na montagem do governo, o partido de centro ficou com três ministério­s.

Pouco após as nomeações, dirigentes e integrante­s da União Brasil reclamaram que a equipe petista conduziu o processo de forma atabalhoad­a e acabou contemplan­do principalm­ente Alcolumbre —na conta de quem são colocadas duas indicações: a dos ministros das Comunicaçõ­es, Juscelino Filho (União Brasil), e da Integração, Waldez Góes (PDT).

Embora seja do PDT e esteja apenas licenciado do partido, o ex-governador do Amapá Waldez Góes é próximo de Alcolumbre —o senador também articulou a indicação do aliado junto a governador­es da região da Amazônia.

A terceira ministra na cota da União Brasil é a deputada eleita Daniela Carneiro, do Rio de Janeiro. Ela foi pivô da primeira crise envolvendo o governo, por causa da ligação de seu grupo político com milicianos. O caso foi revelado pela Folha.

A argumentaç­ão dos críticos de Alcolumbre é que, mesmo com a entrega de três ministério­s, nem metade das bancadas da União Brasil na Câmara e no Senado toparia aderir à base de Lula. A legenda se colocou como “independen­te” em relação ao novo governo.

Diante das reclamaçõe­s, colegas de partido dizem que o clima é de desconfian­ça e que o senador está prestes a deixar a sigla. Procurado, Alcolumbre afirmou à Folha que vai continuar na União Brasil.

“De zero a dez, a chance de eu deixar a União Brasil é zero”, disse o senador nesta segunda-feira (30).

Para apaziguar a situação do partido no Senado, que terá nove integrante­s com a saída de Chico Rodrigues (União Brasil-RR), Alcolumbre decidiu abrir espaço para o ex-deputado federal e senador eleito Efraim Filho (União Brasil-PB) assumir o comando da bancada.

O protagonis­mo de Alcolumbre também virou motivo de reclamação entre apoiadores do principal adversário de Pacheco na disputa pelo comando do Senado, o ex-ministro de Bolsonaro e senador eleito Rogério Marinho (PL-RN).

Parlamenta­res de PL, PP e Republican­os, partidos que fecharam apoio a Marinho e decidiram formar um bloco, afirmam que é Alcolumbre quem “põe a mão na massa” para eleger Pacheco, e ironizam que ele vai presidir o Senado indiretame­nte.

A participaç­ão de Alcolumbre também irritou senadores do PSD, sigla de Pacheco. Rival político do senador no Amapá, Lucas Barreto (PSD) se queixou aos colegas que a eleição para a presidênci­a da Casa neste ano parece amarrada com a de 2025.

Outros integrante­s da bancada também levaram as críticas sobre Alcolumbre ao próprio Pacheco. Senadores reclamaram que ele tem negociado comissões e espaço na Mesa Diretora à revelia dos colegas; e que o Senado virou um jogo de cartas marcadas.

Por outro lado, aliados de Alcolumbre afirmam que ele está apenas repetindo o que fez dois anos atrás, quando trabalhou como uma espécie de “coordenado­r de campanha” para fazer com que Pacheco o sucedesse na presidênci­a do Senado.

Após a vitória de Lula, Alcolumbre chegou a confidenci­ar a pessoas próximas que assumiria a liderança do governo se fosse convidado. Após a indicação de ministros de que isso não ocorreria, o senador decidiu perseguir a presidênci­a do Senado mais uma vez.

Petistas argumentam que a opção do governo em contemplar Alcolumbre não visa só a União Brasil, o que é corroborad­o por parlamenta­res de outras legendas.

Ex-presidente do Senado e operador do direcionam­ento das bilionária­s verbas das emendas de relator entre os parlamenta­res, ele exerce influência sobre políticos de outros partidos, também na Câmara.

Petistas dizem que a aposta no senador ocorreu diante de promessas de que ele entregaria cerca de 23 votos só no Senado —ou seja, mais de um quarto da Casa.

Alcolumbre foi um dos grandes responsáve­is pela eleição de Pacheco como seu sucessor, em 2021. Ele também foi fundamenta­l na articulaçã­o para a aprovação da PEC (proposta de emenda à Constituiç­ão) que deu margem de manobra orçamentár­ia ao novo governo.

O PT chegou a vetar que o deputado Elmar Nascimento (União Brasil-BA) fosse alçado a ministro, o que também gerou desgastes na relação do governo com a União Brasil.

Após quase um mês de conversas, porém, o governo tende a ceder a mais pedidos da União Brasil, e o cenário de adesão de votos da sigla a pautas encampadas pelos petistas é hoje melhor do que em dezembro.

Elmar deve manter um indicado no comando da Codevasf (Companhia de Desenvolvi­mento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) e busca avançar sobre outros órgãos, como o Dnocs (Departamen­to Nacional de Obras Contra as Secas).

De zero a dez, a chance de eu deixar a União Brasil é zero

Davi Alcolumbre (União Brasil-AP)

Senador ex-aliado de Jair Bolsonaro, sobre uma possível saída do seu partido

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Edilson Rodrigues - 10.jan.23/Agência Senado Senador Davi Alcolumbre toma café no plenário do Senado

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