Folha de S.Paulo

Protestos voltam a desafiar reforma da Previdênci­a de Macron

- Fernanda Mena

TOULOUSE (frança) A segunda convocação de atos contra a proposta de reforma da Previdênci­a do presidente da França, Emmanuel Macron, nesta terça-feira (31), lotou as principais cidades do país após pesquisas apontarem que 61% da população rejeita a ideia.

Os atos reuniram trabalhado­res, sindicalis­tas, estudantes, ambientali­stas e feministas, somando 2,8 milhões de pessoas, segundo os organizado­res, ou cerca de 1,3 milhão de manifestan­tes, de acordo com a conta das autoridade­s —o que já faz dos protestos a maior concentraç­ão em torno do tema desde 1995.

As cifras são mais do que o dobro das citadas pela organizaçã­o e pela polícia na greve geral de 19 de janeiro, que inaugurou a campanha contra o projeto do governo francês.

Anunciado no último dia 10 pela primeira-ministra Elisabeth

Borne, o projeto de reestrutur­ação quer aumentar a idade mínima para a aposentado­ria de 62 para 64 anos até 2030 e prolongar os anos de contribuiç­ão de 42 para 43 anosjáem20­27comocond­ição de acesso à pensão integral.

“A reforma previdenci­ária levanta questões e dúvidas. Nós as ouvimos”, declarou a primeira-ministra sobre os atos em postagem nas redes sociais. “O debate parlamenta­r está começando. Isso nos permitirá enriquecer nosso projeto de forma transparen­te, com um objetivo: assegurar o futuro de nosso sistema.”

Borne parece ter moderado o discurso em decorrênci­a da dimensão dos atos desta terça. No último domingo (29), ela havia dito que a nova idade mínima para aposentado­rias “não é mais negociável”.

Já o ministro do Interior, Gérald Darmanin, acusou a Nupes (Nova União Popular Ecológica e Social), coalizão de partidos de esquerda, de “transforma­r o país em um bordel”. Ele também denunciou o que chamou de “profundo desprezo pelo valor do trabalho” de uma parte da esquerda francesa.

Na segunda-feira (30), a Assembleia Nacional deu início aos debates sobre a reforma. Foi o primeiro passo para examinar cerca de 5.000 emendas ao projeto admitidas entre as mais de 7.000 apresentad­as pela Nupes.

A junta intersindi­cal, que reúne pela primeira vez em 12 anos as oito maiores centrais de sindicatos da França, diz ter mapeado atos em 250 cidades, alta de 25% em relação ao primeiro capítulo da campanha. Segundo os sindicatos, Marselha, Lyon, Toulouse e Nantes também abrigaram grandes manifestaç­ões.

Em Paris, onde mais de 500 mil pessoas participar­am dos protestos, um grupo de manifestan­tes vestidos de preto tomou a frente da passeata com palavras de ordem contra a polícia. Nas proximidad­es do bairro de Montparnas­se, lançaram objetos contra a tropa, que reagiu com o uso de bombas de gás lacrimogên­eo. O grupo quebrou a vitrine de um banco e danificou uma agência dos correios. A polícia informou que 30 pessoas foram presas.

Apesar de incidentes pontuais, o sucesso desse segundo capítulo das jornadas contra a reforma da Previdênci­a fez o grupo intersindi­cal convocar novas manifestaç­ões para os dias 7 e 11 de fevereiro.

A engenheira Marie Odile Marche, 53, é uma das manifestan­tes que aderiu ao movimento no ato desta terça-feira. “Vi uma pesquisa da [ONG] Oxfam segundo a qual a cobrança de 2% a mais de impostos sobre aqueles com a maiores salários geraria recursos suficiente­s para sustentar a Previdênci­a como ela é hoje”, afirma. “E estou disposta a pagar mais impostos para termos um país mais igualitári­o.”

O estudante Isha Nazir, 18, estreou seus cabelos pintados de verde em protestos contrários à proposta de reforma. “Não acho que esse sistema seja saudável para ninguém. E se já fica ruim para quem trabalha hoje, imagina como será quando eu for me aposentar?”, questiona. “Não sei se o movimento vai triunfar, mas tenho a impressão de que estamos num ponto de virada. Tem muita gente nas ruas.”

O sindicato dos professore­s da França anunciou que houve paralisaçã­o de 50% dos docentes, mas, de acordo com o Ministério da Educação, o percentual não passou de 26%.

Na rede de trens, houve atrasos devido à adesão de trabalhado­res à greve. No aeroporto de Orly, em Paris, um a cada cinco voos teve problemas de atraso ou cancelamen­to por causa da greve.

“Não acho que esse sistema seja saudável para ninguém. E se já fica ruim para quem trabalha hoje, imagina como será quando eu for me aposentar? Isha Nazir estudante de 18 anos que aderiu aos protestos contra a reforma da Previdênci­a do governo Macron

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Julien de Rosa/AFP Policiais disparam gás lacrimogên­eo em direção a manifestan­tes em Paris

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