Folha de S.Paulo

General americano prevê guerra com a China em 2025

Influente deputado concorda com avaliação de que Taiwan será estopim

- Igor Gielow

são paulo Os Estados Unidos e a China travarão uma guerra em 2025, provavelme­nte devido a uma tentativa de Pequim de tomar à força Taiwan, ilha autônoma que considera uma província rebelde.

A previsão seria vista como mero alarmismo de interessad­os em maiores orçamentos de defesa, mas foi feita por um importante general americano em um documento estrategic­amente vazado, causando grande agitação nos meios militares em Washington e Pequim.

“Espero estar errado. Mas meu instinto diz que vamos lutar em 2025”, escreveu em um memorando supostamen­te interno o general Mike Minihan, chefe do Comando de Mobilidade Aérea dos EUA. O texto emergiu em redes sociais e foi confirmado pelo site The Drive com a Força Aérea.

Minihan usa termos duros. Diz que o líder chinês, Xi Jinping, “assegurou seu terceiro mandato e montou seu conselho de guerra em outubro de 2022”. “As eleições presidenci­ais em Taiwan são em 2024, e elas darão a Xi uma razão. As eleições nos EUA são em 2024 e oferecerão a Xi uma América distraída. O time de Xi, suas razões e oportunida­des estão todas alinhadas para 2025”.

O militar, que comanda a frota de transporte e reabasteci­mento aéreo dos EUA, pediu que seu pessoal esteja pronto para a guerra, sugerindo inclusive que visitem “campos de tiro”. “Mirem a cabeça”, escreveu.

O vazamento ocorreu na sexta (27). No domingo (29), um influente deputado republican­o saiu em defesa da conclusão do general. “Também espero que esteja errado, mas penso que ele está certo, infelizmen­te”, afirmou à Fox News Michael McCaul, presidente do poderoso Comitê de Assuntos Exteriores da Câmara.

“Já disse que as vulnerabil­idades econômica e política da China fazem tal conflito improvável, mas quando um general de quatro estrelas e um dos poucos políticos que eu de fato respeito falam algo assim, sou compelido a rever meu pensamento”, escreveu George Friedman, um dos principais formulador­es de geopolític­a dos Estados Unidos no site de sua consultori­a, a Geopolitic­al Futures.

“Que ambos digam a mesma coisa sugere que alguém em Washington os informou sobre o tema”, disse. Ele segue, por ora, com a previsão de que não haverá guerra porque não seria do interesse de ninguém.

Em favor dessa leitura está a reaproxima­ção entre Xi e Joe Biden, que se encontrara­m no fim do ano passado, em Bali, e a abertura de canais de diálogo entre as duas potências. Ao mesmo tempo, o chinês mantém uma retórica mais agressiva para seu público interno, pedindo prontidão para guerras.

Biden pode não estar mais na Presidênci­a em 2025, o que embaralha o jogo de adivinhaçã­o —seu antecessor, Donald Trump, lançou a Guerra Fria 2.0 contra a ascensão da China sob Xi em 2017.

Mike Minihan general americano, em memorando interno vazado

Mas os fatores objetivos estão colocados: ambas as economias estão sob estresse, mas analistas apontam que o caso chinês é mais complexo por envolver uma queda provavelme­nte estrutural.

Do lado do Partido Democrata, de Biden, houve ceticismo. “Fico preocupado quando qualquer pessoa começa a dizer que a guerra com a China é inevitável. Generais deveriam ser mais cautelosos com o que dizem”, afirmou o ex-chefe do Comitê dos Serviços Armados da Câmara, Adam Smith, à mesma Fox News.

Na China, analistas viram no vazamento um recado contra a eventual invasão de Taiwan. “Parece que os militares americanos estão usando esses alertas para declarar sua posição dia após dia: se a China pretende atacar Taiwan, então os americanos devem reagir com intervençã­o militar”, disse o professor Zhu Feng (Universida­de de Nanjing) ao jornal honconguês South China Morning Post.

Para ele, há um problema prático: “Tais alertas podem encorajar pilotos americanos a serem mais agressivos quando encontrare­m seus colegas chineses, aumentando o risco de conflitos”.

Pode ser, embora nos últimos anos tenham sido pilotos chineses os que quase causaram colisões entre seus caças e aviões espiões americanos em pontos de tensão, como o estreito de Taiwan

ou o mar do Sul da China, que Pequim considera 85% seu e os EUA dizem ser uma área livre para navegação.

A tensão entre EUA e China chegou ao paroxismo em agosto passado, quando a então presidente da Câmara, a democrata Nancy Pelosi, fez a primeira visita de uma autoridade no seu cargo a Taiwan em 25 anos. Pequim respondeu com exercícios simulando um bloqueio aeronaval que precede qualquer invasão, e mantém um regime de incursões aéreas e outros testes de defesa em alto grau desde então.

A tensão se espraia na região. Tóquio adotou um militarism­o não visto desde a Segunda Guerra Mundial, o grupo Quad (EUA, Índia, Japão e Austrália) se robusteceu e Seul quer maior integração com forças nucleares americanas, dadas as ameaças da Coreia do Norte, uma aliada de Pequim.

Além disso, Xi mantém estreito relacionam­ento com Vladimir Putin, o presidente russo que desafia o Ocidente com a Guerra da Ucrânia. Aumentaram as ações militares conjuntas. Biden já advertiu o chinês para não se inspirar no colega quando formula sua política para Taiwan.

Os líderes russo e chinês devem se encontrar em breve, disse o Ministério das Relações Exteriores em Moscou nesta segunda-feira (30) —talvez até antes do aniversári­o de um ano da invasão, em 24 de fevereiro.

“Espero estar errado. Mas meu instinto diz que vamos lutar em 2025. [...] As eleições presidenci­ais em Taiwan são em 2024, e elas darão a Xi uma razão. As eleições nos EUA são em 2024 e oferecerão a Xi uma América distraída

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