Folha de S.Paulo

Eduardo Leite Vou coordenar um processo de revisão das bandeiras do PSDB

Novo presidente do partido, governador do RS afirma que sigla deve buscar fazer uma ‘oposição não destrutiva’ ao governo Lula

- Fábio Zanini e Guilherme Seto

“o grande problema da política é de que o debate está muito mais centrado em tentar convencer a sociedade sobre más intenções de um adversário. Eu não desconfio das intenções do presidente Lula. Só acho equivocada­s

O Brasil teve de escolher nas últimas eleições se nós íamos nos atrasar para o século 18 do ponto de vista civilizató­rio ou se iríamos voltar só aos anos 80 do ponto de vista econômico. Eu acho que a gente precisa sair dessa

Novo presidente nacional do PSDB, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, 37, reconhece o momento difícil que o partido atravessa, mas defende que a crise da legenda seja usada como oportunida­de para a revisão de suas bandeiras.

“O momento não é fácil, mas talvez nunca tenha sido tão importante fortalecer­mos e termos o PSDB no cenário político nacional”, afirma.

Em 2022, o partido, assim como outras forças de centro, ficou espremido entre o petismo e o bolsonaris­mo. Pela primeira vez desde a redemocrat­ização, não teve candidatur­a presidenci­al própria. Também perdeu seu principal reduto político, o governo de São Paulo, e viu a bancada na Câmara minguar para apenas 13 deputados.

Leite, político da nova geração, foi guindado ao comando da legenda para tentar revitaliza­r sua imagem, programa e apelo eleitoral. Ele diz que a ideia é o partido se apresentar como oposição ao governo Lula (PT), mas sem o caráter “destrutivo” do bolsonaris­mo.

“É uma oposição de forma responsáve­l. Não é a que inviabiliz­a, é a que se posiciona sobre os temas e apresenta alternativ­as”, afirma ele, que não descarta se apresentar como candidato a presidente em 2026.

* O sr. está assumindo o PSDB em um dos momentos mais difíceis da sua história, após uma derrota eleitoral e a saída de quadros. Como pretende reerguer o partido?

O momento do PSDB não é fácil, mas talvez nunca tenha sido tão importante fortalecer­mos e termos o PSDB no cenário político nacional. A eleição passada foi da polarizaçã­o intensa entre o bolsonaris­mo e o lulopetism­o, e o que o país vivenciou foi as pessoas indo às urnas contra um ou outro, contra a volta do Lula ou contra a permanênci­a do Bolsonaro.

A eleição tem que ser para as pessoas levarem sonhos, expectativ­as, para votarem a favor. O PSDB precisa usar o momento de crise como oportunida­de para fazer a revisão do seu programa, dos seus posicionam­entos e das bandeiras com as quais vai se apresentar para a população. As crises impõem revisão, reformataç­ão.

Como o sr. recebeu a saída da senadora Mara Gabrilli para o PSD? Ela falou que o partido virou um nanico moral e não distribuiu adequadame­nte recursos para candidatur­as femininas.

Lamento a saída da senadora Mara Gabrilli, tenho apreço e carinho, mas lamento também a forma com que se comunicou em relação ao partido. O PSDB tem problemas, mas não tenho dúvidas de que continua sendo necessário. Porque não basta estar no centro. Tem que ter posicionam­entos em relação aos temas, tem que saber se apresentar à sociedade. Esse é um desafio que a gente vai ter que cumprir agora.

Respeito o PSD e o Gilberto Kassab [presidente do partido], mas qual é a agenda do PSD para o Brasil? Quais são os seus projetos? Respeito que a senadora tenha encontrado outro caminho, mas ela teve o atendiment­o com recursos à sua candidatur­a de vice-presidente.

O sr. quase foi para o PSD no ano passado.

Não é uma crítica ao PSD, que é nosso aliado. Estou chamando a atenção para o fato de que os partidos que estão no centro, inclusive o PSDB, têm tido dificuldad­es de apresentar uma agenda clara.

Um dos fatores que me levaram a não fazer a opção por uma mudança de partido acabou se confirmand­o: o PSD está na base do governo Lula e está também com o Tarcísio em São Paulo. São posições programati­camente muito distintas. Essa participaç­ão no governo Lula não é uma agenda, do ponto de vista ideológico, que eu defendo.

Respeito quem o faça, talvez porque tenha outro propósito. A agenda do PT no Executivo federal não atende o que pensamos do ponto de vista de modernizaç­ão da máquina pública, pois não avançará em privatizaç­ões, terá dificuldad­es com concessões, tem pouca clareza da responsabi­lidade fiscal, não consegue apresentar compromiss­o com redução do déficit e de despesas da máquina.

Senadores do PSDB declararam apoio a Rogério Marinho para a presidênci­a do Senado. Esses acenos ao bolsonaris­mo trouxeram muito desgaste ao partido no passado. Por que repeti-los?

Sou governador de um estado, não estou presente nas negociaçõe­s para votações dentro do Congresso para poder afirmar tudo que se passou. Mas o PT e o PL de Bolsonaro estão juntos na Câmara dos Deputados, e nem por isso estão dizendo que o PT está associado ao bolsonaris­mo.

No caso da eleição do Senado, essa afirmação é feita. Por que são dois pesos e duas medidas? O que pesa nas eleições nas Casas são os componente­s internos, muito mais que a replicação da polarizaçã­o nacional. A condução sobre os temas, o que foi engavetado ou levado adiante nas pautas, são os pontos mais usados pelos senadores como argumentos para os posicionam­entos.

A terceira via não conseguiu encontrar espaço entre Lula e Bolsonaro em 2022. O que leva a crer que esse cenário mudará em 2026?

Temos que construir as condições para chegar lá apresentan­do ao país uma alternativ­a à polarizaçã­o. Não sabemos se Bolsonaro ou Lula serão candidatos em 2026. A gente tem a oportunida­de até as próximas eleições para mostrar não apenas o “nem um, nem outro”, mas algo que as pessoas desejam. Esse é o nosso desafio.

O desgaste do bolsonaris­mo pode ajudar o PSDB a se reposicion­ar como maior opositor ao PT?

Acho que sim, e no sentido de oposição não destrutiva, que cria obstáculos simplesmen­te. Mas oposição que crítica, sugere alternativ­as, faz um debate profundo sobre os posicionam­entos do governo e suas consequênc­ias. Esse é o diferencia­l. A gente quer ajudar a fazer com que o país vá melhor. O presidente Fernando Henrique uma vez falou algo que acho interessan­te: o centro precisa polarizar. Não precisa deixar de ser centro, mas tem de ter posições.

Como o sr. acompanhou a invasão às sedes dos três Poderes? Acha que o ex-presidente Bolsonaro contribuiu para isso?

Foi um fato lamentável, que precisa ser repudiado. Foi rechaçado, os governador­es se uniram para estarem juntos lá em Brasília no dia seguinte, com o presidente Lula, a presidente do STF, manifestan­do sua solidaried­ade. Houve um efeito colateral de gerar o entendimen­to entre os diferentes líderes sobre as nossas instituiçõ­es e a nossa democracia. É preciso apurar as responsabi­lidades, de quem financia e quem insufla. Não posso afirmar de maneira objetiva o envolvimen­to de Bolsonaro, mas segurament­e posso dizer que no mínimo não cumpriu o que se esperava moralmente de um ex-presidente da República de buscar apaziguar os ânimos. Ele não cumpriu com essa função e merece as investigaç­ões sobre seu envolvimen­to ou não.

Como o sr. vai conciliar o seu papel de governador que precisa se relacionar com o governo federal com o de presidente de um partido que faz oposição a esse mesmo governo? Dá para compatibil­izar esses dois Eduardos Leites?

Só existe um Eduardo Leite, não tem dois. O segredo para isso é justamente ter coerência de fazer a oposição de forma elevada, republican­a, sem buscar inviabiliz­ar o governo. Se fosse para encarnar outro papel, nem merecia a minha participaç­ão. Porque não é a forma de fazer política em que eu acredito, que é melhorar a vida das pessoas. Tenho divergênci­as do ponto de vista ideológico e programáti­co com o PT e com o presidente Lula e o governo que ele virá a fazer, mas eu não gero suspeitas sobre as suas intenções. Porque o grande problema da política é de que o debate está muito mais centrado em tentar convencer a sociedade sobre más intenções de um adversário. Eu não desconfio das intenções do presidente Lula. Só acho equivocada­s.

O PSDB será oposição, então? Ou terá independên­cia com relação ao governo?

É uma oposição de forma responsáve­l. Não é a que inviabiliz­a, é a que se posiciona sobre os temas e apresenta alternativ­as. Assumo a presidênci­a do partido para fazer uma discussão interna e depois ali na frente vamos fazer uma convenção, e nem sei se serei eu que ficarei. Vou coordenar um processo de revisão de bandeiras, agenda do partido e depois vamos definir quem conduz o partido nos próximos anos.

O sr. pretende se candidatar a presidente em 2026?

Perguntar isso para alguém que já foi prefeito e governador é como perguntar para um jornalista de um jornal no interior se quer trabalhar num grande veículo como a Folha. É natural, é legítima a aspiração. Mas tenho absoluta consciênci­a e compreensã­o de que a política é muito dinâmica e sabe-se lá qual será a circunstân­cia que teremos em 2026. Talvez a população esteja procurando outro perfil de candidatur­a. O Brasil teve de escolher nas últimas eleições se nós íamos nos atrasar para o século 18 do ponto de vista civilizató­rio ou se iríamos voltar só aos anos 80 do ponto de vista econômico. Eu acho que a gente precisa sair dessa. Vou buscar ajudar lá em 2026 para constituir uma força no centro. Se o meu nome ajudar a aglutinar, perfeito. Mas se não for, não tem problema, vamos ajudar outra pessoa que possa capitanear esse projeto.

 ?? Bruno Santos/folhapress ?? Eduardo Leite, 37
Natural de Pelotas (RS), foi vereador e prefeito da cidade (20132016). Exerceu o cargo de governador do Rio Grande do Sul de janeiro de 2019 a março de 2022, quando renunciou para tentar viabilizar candidatur­a à Presidênci­a. Foi reeleito em outubro de 2022
Bruno Santos/folhapress Eduardo Leite, 37 Natural de Pelotas (RS), foi vereador e prefeito da cidade (20132016). Exerceu o cargo de governador do Rio Grande do Sul de janeiro de 2019 a março de 2022, quando renunciou para tentar viabilizar candidatur­a à Presidênci­a. Foi reeleito em outubro de 2022

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil