Segunda recuperação judicial é rara, e Oi terá mais dificuldade
Empresa tem agora menos ativos para vender, afirmam especialistas
A Oi deve pedir em breve uma segunda recuperação judicial, algo até então inédito entre as grandes empresas brasileiras.
Na quarta-feira (1º), a Oi entrou com um pedido de tutela de urgência cautelar na 7ª Vara Empresarial do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro) para impedir que seus ativos sejam bloqueados a pedido de credores. A empresa declara ter dívidas de R$ 29 bilhões.
No pedido de tutela, a companhia diz que o não pagamento de mais de R$ 600 milhões que vencem no dia 5 acarretaria o vencimento antecipado da quase totalidade da dívida financeira (R$ 29 bilhões), por causa das cláusulas previstas em seus contratos financeiros.
A companhia havia concluído seu processo de recuperação em dezembro. A necessidade de um novo pedido em tão pouco tempo surpreendeu profissionais do setor, que não se recordam de ver uma empresa de grande porte passar por uma situação assim.
A lei brasileira determina que uma empresa só pode pedir uma nova recuperação judicial cinco anos após o início do primeiro processo.
A Oi entrou com pedido de recuperação judicial em junho de 2016, no Tribunal de Justiça do Rio, depois de acumular uma dívida bruta de aproximadamente R$ 65 bilhões, com mais de 55 mil credores. A lista atual de credores ainda não foi divulgada.
A primeira recuperação judicial da Oi foi concedida só em 5 de fevereiro de 2018. Assim, teoricamente, poderia fazer um novo pedido a partir de 5 de fevereiro de 2023, próximo domingo. No entanto, há dúvidas sobre isso, porque o processo teve aditivos.
“Há uma discussão legal e jurisprudencial se esse prazo deveria contar do início do processo ou da apresentação do último aditivo. Muito provavelmente os credores que discordem da nova recuperação vão entrar com medidas judiciais para tentar impedir o processo”, analisa Filipe Denki, diretor da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência do Conselho Federal da OAB e sócio do Lara Martins Advogados.
“Ficam dúvidas se [a situação da Oi] é um problema do setor de telefonia, de má gestão econômica-financeira da empresa ou do próprio instituto da recuperação judicial.”
A apresentação do pedido de tutela de urgência cautelar serve para antecipar os benefícios de um pedido de recuperação judicial em si, especialmente impedir que ativos sejam bloqueados para pagar credores.
Se a Justiça aprovar essa medida cautelar, a Oi ficará então protegida contra os credores e terá até 30 dias para apresentar um pedido de recuperação. Não há, porém, um prazo para que a Justiça avalie o pedido de tutela de urgência cautelar. Até as 19h25 desta quinta (2), não havia notícia sobre essa decisão.
Uma vez apresentado um novo pedido de recuperação judicial, ele terá de ser aceito pela Justiça. Caso o pedido seja negado, a empresa acabaria tendo de declarar falência, pois os credores poderiam tomar patrimônios para compensar o pagamento das dívidas.
“Não acredito que o juiz vá negar [o pedido de recuperação] por causa do tamanho da empresa, que gera muitos empregos, impostos e tem muitos credores, mas não tem tantos ativos assim para pagar a todos. Mas ele vai se debruçar muito para tentar evitar que haja uma terceira recuperação judicial”, avalia Irineu Soares, coordenador de pesquisa do curso de direito do Mackenzie Rio.
Em um processo de recuperação, a empresa pode deixar de pagar aos credores por algum tempo, mas precisa apresentar um plano para acertar as contas e seguir operando depois.
Em caso de falência, os ativos são vendidos para levantar dinheiro para pagar as dívidas da empresa, que deixa de existir.
Para pagar as dívidas, é comum que a empresa em processo de recuperação venda parte de seus ativos. Foi o que a Oi fez: vendeu seus ativos de telefonia móvel para TIM, Claro e Telefônica Brasil (Vivo) em leilão no final de 2020, com uma proposta conjunta de R$ 16,5 bilhões, mas o valor é alvo de disputa.
Agora, caso o segundo pedido de recuperação avance, haverá menos ativos a vender, o que dificultará os planos. A Oi atualmente oferece serviços de telefonia fixa, banda larga e TV por assinatura para residências e serviços digitais para empresas, como conexões de internet e armazenamento de dados em nuvem.
No final de 2021, a Oi atendia 3,4 milhões de casas com internet via fibra óptica, segundo sua demonstração de resultados.
“Quando uma empresa entra em recuperação, ela geralmente não consegue mais fazer compras a prazo. Só consegue comprar à vista ou pagando antecipado. O crédito fica muito caro”, explica Denki.
Uma saída é o tipo de empréstimo chamado de DIP (do inglês debtor-in-possesion financing, ou “financiamento do devedor em posse”), modelo de financiamento estudado pela Americanas. Por esse modelo, a empresa paga juros mais altos para captar recursos, e pode pagá-los depois com ações, caso a recuperação prospere.
Procurada, a Oi respondeu nesta quinta que a solicitação de tutela foi uma medida para proteger a companhia e suas subsidiárias contra a exigibilidade de créditos e garantias, além de permitir o avanço das discussões e tratativas com os credores.
“Ciente da relevância do seu papel no mercado brasileiro, a Oi deve e continuará explorando todas as opções disponíveis para otimizar sua liquidez, e garantir a plena execução de seu plano estratégico de longo prazo, atendendo não apenas aos seus interesses econômicos e sociais, mas também os de seus acionistas e demais stakeholders.”,
No texto, a empresa reconhece ainda que acabou de sair do maior processo de recuperação judicial da história do Brasil, mas que, “infelizmente, diversos fatores imprevisíveis, não controláveis, e a sua situação econômico-financeira atual tornaram imprescindível recorrer à proteção judicial para implementar nova etapa de sua reestruturação e garantir a preservação da empresa, enquanto grande geradora de empregos e renda”.
A Oi diz ainda que a primeira recuperação judicial teve “inquestionável sucesso”, mas que a estrutura de capital da companhia continua insustentável.
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Não acredito que o juiz vá negar [o pedido de recuperação] por causa do tamanho da empresa, que gera muitos empregos, impostos e tem muitos credores, mas não tem tantos ativos assim para pagar a todos. Mas ele vai se debruçar muito para tentar evitar que haja uma terceira recuperação judicial
Irineu Soares coordenador de pesquisa do curso de direito do Mackenzie Rio