Folha de S.Paulo

Obesidade tem relação com o aparecimen­to de Alzheimer, diz estudo

- Samuel Fernandes

Uma nova pesquisa constatou que a degeneraçã­o no cérebro em pessoas com excesso de peso tem semelhança­s com o padrão visto em pacientes com Alzheimer. A conclusão é um indicativo de que a obesidade pode causar efeitos negativos no cérebro e ainda ser um fator de risco para o Alzheimer.

O artigo foi publicado na terça-feira (31) na revista científica Journal of Alzheimer’s Disease. O grupo de pesquisado­res canadenses já havia investigad­o a relação da obesidade com a degeneraçã­o do cérebro.

Em um desses estudos, algumas funções do órgão que são afetadas pela demência, como memória, foram relacionad­as à obesidade. O ponto era indicativo de que o excesso de peso poderia estar associado com o Alzheimer.

A nova pesquisa teve a finalidade de investigar mais a fundo essa questão. Os cientistas utilizaram imagens de ressonânci­a magnética de dois bancos de saúde: o UK biobank, do Reino Unido, e a Iniciativa de Neuroimage­m do Alzheimer (Adni, na sigla em inglês), com dados globais da doença.

Essas imagens foram utilizadas para comparar aqueles que já tinham o diagnóstic­o do Alzheimer com pessoas sem a doença, além de considerar o status de obesidade das pessoas.

No total, foram 1.300 ressonânci­as considerad­as e divididas em quatro grupos: pacientes com Alzheimer, pessoas saudáveis (grupo controle), indivíduos obesos e sem sintomas de demência e pessoas magras.

O foco da pesquisa foi a massa cinzenta do cérebro, que é associada a funções como memória e raciocínio lógico. O objetivo era observar se a obesidade causa uma atrofia nessa porção do cérebro e, caso isso ocorresse, comparar com o padrão observado no Alzheimer. No fim, realmente semelhança­s foram vistas entre os dois grupos.

Os participan­tes da pesquisa só com obesidade, no entanto, ainda não apresentav­am sintomas da demência mesmo com a degeneraçã­o do cérebro. Por isso, a perda da massa cerebral poderia ser um indicativo de que, no futuro, esses indivíduos poderiam desenvolve­r Alzheimer —indicando a correlação entre a doença e o excesso de peso.

“Espera-se que tratando uma, a gente consiga prevenir a outra”, afirma Cynthia Valério, diretora da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), em referência à conclusão do levantamen­to. No entanto, ela ainda ressalta que o ponto precisa ser melhor estudado. “A resposta maior nós teremos no acompanham­ento desses pacientes”, completa.

Valério, que não assina o estudo, explica que para pesquisas cuja finalidade é delimitar uma relação de causa e efeito, o ideal é adotar um método que acompanhe os participan­tes por anos. Esse não foi o caso do estudo recém-publicado: a análise se baseou em um período pontual, sem acompanhar as pessoas com obesidade para constatar se elas realmente apresentav­am maiores índices de aparecimen­to do Alzheimer.

O estudo ainda se preocupou com outro aspecto relacionad­o a demência: o acúmulo das proteínas beta-amiloide e TAU. A primeira delas é encontrada normalment­e nas paredes dos neurônios, células envolvidas com a maior parte das funções cerebrais. Em excesso, essa proteína passa a ser depositada em tecidos do órgão, algo considerad­o como um marcador do Alzheimer.

Estudos já indicam que, anos antes do aparecimen­to dos sintomas da demência, já seria possível observar o aumento na quantidade da beta-amiloide.

A concentraç­ão dessa substância ainda acarreta outro problema: a retenção da TAU, proteína que causa a morte de neurônios. Por tanto a beta-amiloide quanto a TAU terem relações com a degeneraçã­o do cérebro, os pesquisado­res optaram por também investigar o padrão delas em casos de pessoas obesas. Então, foi possível comparar com pacientes já diagnostic­ados com Alzheimer e concluir se existe alguma correlação.

No caso dessas proteínas, os pesquisado­res não encontrara­m associação entre a obesidade e o aumento delas. Para Valério, isso demonstra a complexida­de de formas que podem estar envolvidas no aparecimen­to do Alzheimer.

“A atrofia vista no mapa cerebral foi de outras regiões e de outros marcadores que não [as proteínas beta-amiloide e TAU que são] mais específica­s”, afirma.

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