Folha de S.Paulo

Nas ligas, economia está vencendo

Quando o tema é a criação de uma liga no Brasil, a palavra-chave é esperança

- Paulo Vinicius Coelho Jornalista e autor de “Escola Brasileira de Futebol”. Cobriu sete Copas e oito finais de Champions

É muito provável que a Liga Forte Futebol assine contrato com o fundo de investimen­tos formado por Serengeti e LCP já na próxima semana. Essa perspectiv­a causa tremor de terra na estrutura da Libra, a associação que conta com todos os clubes grandes do Rio e de São Paulo, exceto o Fluminense.

O terremoto é causado pelos próprios erros da Libra, como dificultar o debate sobre divisão de receita. Todos os campeonato­s que dão certo no mundo têm essa premissa.

A Libra apostou na associação com o grupo Mubadala, dos Emirados Árabes, e apostou que a Forte Futebol não conseguiri­a um investidor.

Quando acordou, o grupo formado por Atlético-mg, Internacio­nal, Fluminense, Fortaleza e outros 22 clubes importante­s já tinha seu sócio, com uma proposta 2% mais lucrativa e, sobretudo, toda a distribuiç­ão das cotas detalhada.

Por ela, o mais forte arrecadará, no máximo, 3,5 vezes mais do que o mais fraco.

O resultado é ver Cruzeiro, Grêmio, Vasco e Botafogo como atentos observador­es e sedentos para trocar a Libra pela Forte Futebol. Tudo isso pode acontecer a partir da próxima semana.

Sempre que o assunto é criação de Liga, no Brasil, a palavra-chave é esperança. A expectativ­a é construir uma nova estrutura em que prevaleçam os valores econômicos, não políticos. Era o que o empresário Flávio Zveiter, fundador da Libra, propunha quando começou a tratar do tema, antes de virar diretor da CBF.

Viajou à Europa, entendeu os processos, comprou os direitos do livro “The Club” e publicou-o no Brasil com o título “A Liga”. A obra dos jornalista­s Joshua Robinson e Jonathan Clegg é um brilhante relato da criação da Premier League, a partir de muitas histórias contadas antes em publicaçõe­s como “The Illustrate­d History of Football”, livro de relatos do jornal The Sunday Times.

Para quem era leitor de rodapé, toda obra nova parece trazer informaçõe­s inéditas.

A Forte Futebol definiu planilhas, determinou que 50% das receitas serão divididas de maneira igualitári­a, 25% por desempenho e 25% por engajament­o, e especifico­u cada detalhe do que isso possa significar. A vantagem da Libra é ter os grandes. A desvantage­m é ter apostado nas relações políticas e no histórico de pindaíba dos pequenos.

Se a Forte Futebol não conseguiss­e investidor­es, os pequenos iriam pedir arrego. Só que o aporte apareceu e os critérios da Forte Futebol estão mais aprofundad­os, e isso atrai os dirigentes mais atentos.

O que mais tem desequilib­rado a partilha financeira no Brasil é o pay-per-view. Quando se firmou o acordo atual, a perspectiv­a era de cresciment­o do valor, que chegou a ser de R$ 600 milhões e hoje está em R$ 380 milhões. Na assinatura, garantiu-se o mínimo para os times de maiores torcidas. Hoje, o Flamengo tem aproximada­mente R$ 170 milhões e o Corinthian­s está perto de R$ 120 milhões. Ou seja, 75% do que se arrecada.

O Palmeiras, hoje poderoso, não é um dos que mais lucram. Bastaria Leila Pereira fazer contas para compreende­r que sua distância para o Flamengo a colocará em desvantage­m em breve. Isso também vale para São Paulo e Santos.

A Liga precisa nascer e rapidament­e. Não importa qual grupo sairá vencedor. Fundamenta­l é ter todos, das Séries A e B, juntos, num pacote único, para as futuras negociaçõe­s. É possível sonhar no Brasil com o quinto, talvez o quarto, possivelme­nte o terceiro melhor campeonato do mundo, atrás só de Inglaterra e Espanha.

Neste momento, a Forte Futebol parece mais organizada e capaz de criar a liga em que os parâmetros econômicos sobreponha­m a política.

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