Folha de S.Paulo

Parças ao mar

- Ruy Castro

Quando sabemos que alguém foi preso, nossos sentimento­s variam. Dependendo do motivo pelo qual o sujeito foi encanado, lavamos as mãos, por achar que quem errou deve pagar, ou nos revoltamos, por não aprovarmos a injustiça. Neste momento, há três elementos ligados a Jair Bolsonaro engaiolado­s: seu ex-ajudante de ordens, o frajola tenente-coronel Mauro Cid; o repulsivo ex-deputado Roberto Jefferson; o cafajeste e ex-deputado Daniel Silveira. Seu homem de confiança, o cínico ex-ministro da Justiça Anderson Torres, passou quatro meses preso. Outros deveriam estar-lhes fazendo companhia, a começar por Bolsonaro, mas, por ora, é o que temos e já começou bem.

Todos se encontram no primeiro caso citado acima. Ao ouvir que a polícia finalmente os alcançou, achamos que ela já chegou tarde e eles que se virassem para se defender das acusações. Mas não somos os únicos a pensar assim —Bolsonaro também quer que se danem.

Sua reação ao desaire dos asseclas é surpreende­nte: foram presos, mas isso não é com ele, que não tem nada a ver com o que fizeram, mesmo que para beneficiá-lo. Se fizeram alguma coisa, diz Bolsonaro, foi porque quiseram.

Quando militar, ainda que de quinta, Bolsonaro conviveu com certos ensinament­os da tropa, um deles o de que não se abandona um companheir­o na estrada. Obediente, Bolsonaro faz melhor: joga o companheir­o ao mar, e ele que nade se souber. O risco de que os ex-parças se revoltem com seu desprezo não parece perturbá-lo —Bolsonaro conta com fidelidade­s eternas e, até agora, isso tem funcionado.

É fascinante imaginar como será quando o garrote se fechar em torno de pescoços mais íntimos, como o de seus filhos e o de Michelle, sua mulher. No caso desta, ela será tranquilam­ente atirada aos cães. Mas, no dos filhos, Bolsonaro terá de optar: ou o pescoço deles ou o seu. Aí, sim, veremos se aquela história da família acima de tudo era para valer.

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