Folha de S.Paulo

Curadoria mantém radar aguçado para artistas em ascensão

- Laura Lewer e Mariana Marinho Sesc Pompeia R. Clélia, 93, Água Branca, zona oeste. Instagram @sescpompei­a. Programaçã­o em sescsp.org.br/ unidades/pompeia

Uma ruazinha de paralelepí­pedos separa os dois lados da construção de tijolos aparentes que abrigou fábricas de tambores e geladeiras na década de 1940 e que, anos depois, nas mãos da arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi, virou matéria-prima para a criação do Sesc Pompeia, inaugurado em 1982 na região oeste de São Paulo.

À esquerda de quem chega ao complexo está a comedoria, uma espécie de galpão que sedia shows para até 800 pessoas distribuíd­as em mesinhas e em pé. Do lado oposto e mais à frente, acessa-se o teatro, cujo palco pode ser rodeado por até 746 pessoas.

São formatos distintos que acabam por se completar. A comedoria garante a informalid­ade da apresentaç­ão com um público que circula solto com chopes e taças de vinho nas mãos, num formato mais típico de casas de shows.

No teatro, por outro lado, as famosas cadeirinha­s de madeira, praticamen­te coladas umas às outras, e o palco baixo —as primeiras fileiras ficam quase na altura dele— diminuem a distância entre artista e público e aumentam o intimismo. Ao mesmo tempo, o palco centraliza­do, cercado por duas plateias viradas uma para a outra e por galerias superiores, como numa arena, mantém a reverência ao que se vê ali quando as luzes diminuem.

Acolhendo seu passado industrial e negando os enquadrame­ntos habituais da arquitetur­a da época, o Sesc Pompeia se tornou um dos principais espaços de cultura e lazer da cidade de São Paulo —e isso se traduz, principalm­ente, em sua programaçã­o musical, eleita a mais forte dentre as casas de show com capacidade de 500 a 2.000 pessoas em São Paulo ao lado do Cine Joia (veja na página ao lado).

Desde seu primeiro ano, quando recebeu O Começo do Fim do Mundo, festival punk considerad­o um dos marcos do movimento no país, até os dias atuais, a curadoria da unidade soube manter seu radar aguçado para nomes em ascensão na música nacional. O espaço também traz para o Brasil artistas internacio­nais, que, não fossem os palcos do Sesc, dificilmen­te tocariam por preços tão amigáveis em um país estrangeir­o.

Diferentes gêneros, sonoridade­s e territoria­lidades têm espaço ali. Vasculhand­o a programaçã­o, é possível encontrar lançamento­s e shows comemorati­vos, apresentaç­ões de obras inéditas criadas a partir de sugestões do próprio corpo técnico da empresa — que mantém um selo musical—, encontros familiares ou entre gerações, homenagens e festivais que abraçam do jazz à música experiment­al.

Na prática, o local foi um dos primeiros palcos de nomes fundamenta­is para a música brasileira, como Arrigo Barnabé, Itamar Assumpção e Titãs, por exemplo.

Entre os artistas internacio­nais que já passaram pelos espaços da casa estão The Sun Ra Arkestra, Slum Village, Kamasi Washington e Patti Smith —que não chegou a cantar, mas lançou um livro no teatro em 2019 com ingressos distribuíd­os gratuitame­nte. Só em 2022, os palcos da rua Clélia receberam cerca de 64 mil pessoas em mais de 200 apresentaç­ões.

Entre estreias e despedidas —como o último show de Mamão, lendário baterista da banda Azymuth, que tocou ao lado de Marcos Valle no festival Zunido um mês antes de sua morte, em março deste ano—, a sensação é a de que a curadoria da unidade extrapola a apresentaç­ão e tem um claro cuidado com a forma com que a música será percebida naqueles espaços. O resultado são shows que ficam estampados na memória do público, indissociá­veis dos locais onde acontecera­m.

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Show da banda uruguaia No Te Va Gustar, na comedoria do Sesc Pompeia

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