Espaço valoriza experiência de estar em prédio histórico
Não dá para chamar de confortável o caminho até a Casa de Francisca. O espaço, localizado na Sé, no centro de São Paulo, fica numa região cada vez mais esquecida pelo poder público, com baixa circulação de pessoas à noite, pouca iluminação e os perigos que os moradores da capital paulista já estão cansados de saber.
Quem vai de carro ao local precisa desembarcar na esquina das ruas Benjamin Constant e Quintino Bocaiúva e andar pouco mais de 100 metros a pé até a porta do edifício. O entorno contrasta com a beleza imponente do Palacete Teresa, prédio construído no começo do século 20, onde desde 2017 fica a Casa de Francisca.
Mas o desconforto fica da porta para fora. Após subir as escadas, ou pegar o elevador até o primeiro andar, o clima é agradável, em um espaço com paredes e teto altos, em que o canto de shows está separado por paredes do bar, da cozinha e da área dos banheiros. Há também um ambiente destacado, com mesas, no qual dá para comer e beber distante de onde as apresentações acontecem.
Nos dias de música e jantar, é possível pagar pela entrada e pela comida de maneira adiantada, o que evita filas na saída. Mas, mesmo quando a opção é acertar na hora, não há demora para fechar a conta antes de deixar o local.
É muito cômodo assistir aos shows ali independentemente de qual formato a casa adote em determinada noite —no esquema de jantar, com mesas por todo o cômodo, ou com mesas num canto e pista no outro. Há ainda uma área com mesas escalonadas, em que as cadeiras ficam apenas de um dos lados, ou seja, todas as pessoas ficam de frente para o palco.
Mas a arquitetura é o grande diferencial da Casa de Francisca. Antes dos shows começarem, um funcionário da casa sobe ao palco para conversar com a plateia e explicar a origem daquele local, repleto de portas amplas e altas que dão para uma sacada, onde não é permitido fumar. Décadas atrás, era comum que músicos tocassem ali, virados para a rua.
Hoje patrimônio histórico, o Palacete Teresa abrigou a primeira loja de instrumentos de São Paulo, a Casa Bevilacqua, além da editora de música Irmãos Vitale e a rádio Record, esta no auge do sucesso. Tudo isso fez o lugar ser conhecido como a “esquina musical de São Paulo”.
Estar na Casa de Francisca é entrar em contato com a memória de um centro de São Paulo pujante, em que a estrutura clássica faz um contraste com o descaso e o abandono vistos atualmente. Quando a música preenche o espaço, é como se a própria ideia de um glamour decadente se dissipasse no ar.
Isso porque a programação da casa privilegia músicos com abordagem contemporânea, muitas vezes escolhendo a experimentação, ainda que dialoguem com a tradição, em detrimento da reprodução fidedigna daquilo é considerado clássico na música.
Assim, a Casa de Francisca mais amplia e ressignifica do que limita a experiência de estar em um prédio histórico no centro da cidade.