Folha de S.Paulo

Meu nome é ninguém

- Alvaro Costa e Silva

Gringo velho exilado no México, suposto filho bastardo do kaiser Guilherme 2º e membro da SS nazista, amigo íntimo de Frida Kahlo, comparado pela crítica a Joseph Conrad e favorito de Albert Einstein, B. Traven —o escritor cuja existência parece um puzzle— está de volta.

O selo Imprimatur acaba de mandar às livrarias “O Navio da Morte” e prepara o relançamen­to de “O Tesouro de Sierra Madre”. Pouco se sabe a respeito do homem que escreveu romances e contos com forte carga social, usando como pano de fundo a Revolução Mexicana. Ele teria morrido em 1969, e suas cinzas jogadas no rio Jataté, na selva de Chiapas. O resto são pistas falsas, contradiçõ­es, desmentido­s, trabalho de detetive sem solução.

B. Traven é o mais fascinante pseudônimo da literatura moderna (que me desculpe a italiana Elena Ferrante). Com manhas de espião, escondia-se sob diversas nacionalid­ades: inglesa, americana, sueca, norueguesa, lituana. E utilizou, na ficção e na realidade, um chorrilho de assinatura­s: Traven Torsvan, Berick Traven, B.T. Torsvan, Ret Marut, Fred Maruth, Otto Wienecke, Adolf Feige, Goetz Ohly, Anton Riderschei­dt.

Humphrey Bogart tinha certeza: o escritor era o tal Hal Croves, que em 1948 trabalhou como consultor durante as filmagens de “O Tesouro de Sierra Madre”, o clássico de John Huston, e ainda fez uma ponta de alguns segundos, ao lado de Walter Huston, no hotel Oso Negro.

Um presidente do México, Adolfo Lopez Mateos, foi obrigado a declarar publicamen­te que nem ele nem sua irmã —Esperanza, uma escritora comunista e lésbica— eram B. Traven. As hipóteses abundam: ele seria outro presidente mexicano (Plutarco Elias Calles), um marinheiro polonês, um arqueólogo dinamarquê­s, um dono de botequim em Acapulco, um grupo de roteirista­s de Hollywood e —a minha preferida— um coletivo de literatos hondurenho­s. Melhor que desvendar o mistério é ler B. Traven.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil