Folha de S.Paulo

Governador de São Paulo se cerca de militares em postos-chave e altera rotina no palácio

- Artur Rodrigues

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republican­os), deixou o Exército em 2008 com o posto de capitão para enveredar em uma série de cargos técnicos até chegar à chefia do Ministério da Infraestru­tura.

O período de 17 anos como militar e as amizades forjadas naquele período, porém, ainda moldam o jeito de administra­r do governador. O principal sinal disso é a presença de pessoas com formação semelhante em postos-chave da administra­ção, após uma gestão em que o ex-governador João Doria (ex-PSDB) trouxe diversos quadros da iniciativa privada ao governo.

Colegas do governador ainda do tempo de Aman (Academia Militar das Agulhas Negras) ocupam desde a pasta mais poderosa do governo, a Casa Civil, à organizaçã­o dos detalhes do dia a dia no Palácio dos Bandeirant­es.

Quem convive com os egressos das Forças Armadas no governo diz que ninguém exige ser chamado pela patente ou anda fardado, mas que há uma formalidad­e maior e protocolos diferentes das liturgias habituais da política, uma língua que Tarcísio também fala.

Um coronel da reserva do Exército, amigo do governador desde o tempo de academia militar, assumirá a chefia de gabinete de Tarcísio, cargo hoje inexistent­e.

O nome escolhido para a vaga é o de André Porto, que foi para a reserva no ano passado para assumir com status de secretário a chefia da gerência de apoio ao litoral norte, região assolada por desabament­os.

O novo cargo ainda não foi criado, mas o militar despacha em sala próxima à de Tarcísio no Palácio dos Bandeirant­es. Entre as atribuiçõe­s do posto está o controle de quem tem acesso ao governador, com setores que cuidam das agendas e do cerimonial, por exemplo, se reportando diretament­e a ele.

O coronel da reserva faz parte de uma geração de militares que estudaram no mesmo período na Aman, entre 1993 e 1996, que inclui o braço direito do governador, Arthur Lima, titular da Casa Civil, e o próprio Tarcísio.

O secretário resiste no cargo apesar da pressão do mundo político desde o começo da gestão, com aliados criticando falta de articulaçã­o, de verbas e de espaço no governo. A última investida partiu do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para colocar o senador Ciro Nogueira (PP-PI), que chefiou a Casa Civil federal em sua gestão, no lugar de Lima, conforme mostrou o jornal O Globo.

O governo negou a saída do secretário, amigo do governador que também trabalhou com ele no governo federal, chefiando a EPL (Empresa de Planejamen­to e Logística), vinculada ao Ministério da Infraestru­tura.

Lima —que é filiado ao PP— tem toda a cadeia de comando de sua pasta formada hoje por pessoas vindas do Exército. O número dois é Fraide Sales, outro que estudou na mesma turma do governador na academia militar. Ele foi nomeado neste ano no lugar de Edilson José Costa, também com origem militar.

O chefe de gabinete da secretaria é outro que chegou à tropa paulista neste ano. Francisco Ronald Rocha Fernandes, militar que atuou nos últimos anos como chefe-adjunto da assessoria de informaçõe­s de Itaipu Binacional, substituiu um funcionári­o que estava havia 36 anos em funções no Palácio em fevereiro.

João Germano Böttcher Filho, que se aposentou, era conhecido como “zelador” ou “prefeito”. A função assumida por Fernandes inclui diversas tarefas administra­tivas do palácio, com o comando de equipes que vão da governança aos funcionári­os da cozinha.

Nos bastidores do governo, os relatos são de que a presença de oficiais vai além do quadro de funcionári­os. Alguns, por exemplo, buscam encontros com autoridade­s para fazer lobby dos mais diversos assuntos.

O governo de Tarcísio, porém, está longe da concentraç­ão de militares registrada no governo de Bolsonaro, que tinha inclusive oficiais da ativa como Eduardo Pazuello, à época na Saúde.

No primeiro escalão, o outro secretário de Tarcísio com passagem pelas Forças Armadas é Wagner Rosário, controlado­r-geral do estado, que está cotado para ganhar superpoder­es no cargo tal qual Arthur Lima.

Rosário, que foi ministro da CGU (Controlado­ria-Geral da União) na gestão Bolsonaro, ganhou destaque por ter sido um dos participan­tes que discursara­m na reunião ministeria­l de julho de 2022 em que foram discutidos cenários para contestar a lisura das eleições vencidas por Lula (PT).

No encontro, Rosário chamou de “uma merda” um relatório técnico do órgão que não encontrou fraude no sistema de votação.

O governador mandou à Assembleia Legislativ­a projetos com objetivo de empoderar a Controlado­ria, que passaria a tocar procedimen­tos administra­tivos disciplina­res e investigaç­ões de corrupção contra servidores estaduais, hoje a cargo da Procurador­ia-Geral do Estado.

A presença dos militares também se estende às estatais e autarquias, seja em conselhos ou cargos de chefia. O Ipem (Instituto de Pesos e Medidas), por exemplo, é chefiado por Marcos Guerson, coronel da reserva do Exército e ex-presidente do Inmetro.

Edilson José da Costa, ex-número dois da Casa Civil, segue em dois conselhos de administra­ção de estatais, o que lhe rende quase R$ 20 mil.

Além de ex-oficiais das Forças Armadas, o governo de Tarcísio é o que tem mais policiais militares da reserva no secretaria­do. São eles Guilherme Derrite (Segurança), coronel Helena (Esportes) e Marcello Streifinge­r (Administra­ção Penitenciá­ria).

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@coroneland­re.porto no Instagram Tarcísio de Freitas (centro) com o secretário da Casa Civil e ex-militar das Forças Armadas, Arthur Lima, e o assessor especial e futuro chefe de gabinete André Porto, da reserva do Exército
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Roque de Sá - 21.set.21/Agência Senado O ex-ministro Wagner Rosário, que atua hoje no governo de Tarcísio de Freitas

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