Folha de S.Paulo

Greve na educação é legítima

Salários de professore­s e demais funcionári­os acumulam perdas

- Camila Rocha Doutora em ciência política pela USP e pesquisado­ra do Centro Brasileiro de Análise e Planejamen­to

Ao menos 19 universida­des e institutos federais já indicaram que devem entrar em greve a partir desta segunda-feira (15). Número que deve aumentar progressiv­amente enquanto o governo não atender minimament­e às demandas do setor. Entre estas estão: reestrutur­ação das carreiras, recomposiç­ão do orçamento das instituiçõ­es educaciona­is, revogação de medidas adotadas durante os governos Temer e Bolsonaro e reajuste nos valores de auxílios e bolsas de estudantes.

Desde 2015, o orçamento da rede federal de educação sofre cortes importante­s. Tal cenário impacta a principal demanda dos servidores: recomposiç­ão salarial. Sem reajustes por anos, os salários de professore­s e demais funcionári­os acumulam perdas importante­s.

De acordo com Elenira Vilela, professora e coordenado­ra-geral do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profission­al e Tecnológic­a, profission­ais da educação federal acumulam perdas salariais de cerca de 20%.

Ainda que tais profission­ais tenham recebido um reajuste de 9% em 2023, como todos os servidores federais, o aumento nem mesmo repôs a inflação acumulada nos últimos anos. Não é difícil compreende­r o motivo da indignação. Vilela aponta que, hoje, o piso salarial de um técnico da rede federal de ensino é de R$ 1.446,12, pouco acima do salário mínimo de R$ 1.412. A categoria já está em greve há um mês e demanda que o valor do piso suba para R$ 3.960, bem como a realização de concursos para contrataçã­o de mais servidores. Entre docentes universitá­rios, a desvaloriz­ação salarial também pode ser facilmente constatada.

No edital 1.193 publicado pela Universida­de Federal de Minas Gerais (UFMG), em 19 de maio de 2023, foram anunciadas duas vagas para docência na área de engenharia aeroespaci­al. O regime de trabalho demandado era de 40 horas semanais com dedicação exclusiva. Os requisitos mínimos para concorrer às vagas eram graduação e mestrado em engenharia aeronáutic­a ou engenharia aeroespaci­al e afins. A remuneraçã­o bruta prometida para os professore­s assistente­s com mestrado era de R$ 7.312,77, e para professore­s adjuntos, com doutorado completo, de R$ 10.481,64.

Contudo, de acordo com o site Engenharia 360, o salário médio de um engenheiro civil, ramo da engenharia com a maior quantidade de profission­ais no mercado, é de R$ 9.765,00, em média. Não à toa, no dia 11 de abril, uma assembleia de professore­s da UFMG aprovou, por 228 votos a favor e 140 contra, a adesão à greve programada para este dia 15.

A despeito das condições declinante­s da educação federal, no mês passado o governo anunciou a criação de 100 novos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia e 140 mil novas vagas. A medida, parte do Novo PAC, representa um investimen­to total de R$ 3,9 bilhões, dos quais R$ 2,5 bilhões serão destinados para novos campi e R$ 1,4 bilhão para melhorar unidades já existentes. Porém, consideran­do que o impacto inicial estimado para conceder reajustes aos servidores da educação federal será da ordem de R$ 1 bilhão, será necessário, e urgente, que o governo reavalie prioridade­s.

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