Folha de S.Paulo

Lula minimiza embate com Congresso e descarta reforma ministeria­l

Presidente classifica embates recentes com o Parlamento como ‘coisas da política’ e se nega a revelar saldo de conversa com Lira

- Catia Seabra, Marianna Holanda e Renato Machado

O presidente Lula (PT) afirmou, em café com jornalista­s nesta terça-feira (23), que não há crise com o Congresso Nacional, mesmo após uma série de embates que mobilizou seu governo nos últimos dias. Ele minimizou problemas de articulaçã­o com o Legislativ­o e tratou dos episódios recentes como “coisas normais da política”.

“A gente não vai viver em uma eterna briga. Porque se você optar pela briga não aprova nada. O país é prejudicad­o, vamos conviver com todo mundo”, afirmou Lula, que no dia anterior havia cobrado seus ministros para reforçar a articulaçã­o política.

Como parte dessas movimentaç­ões, o próprio presidente tomou a iniciativa de procurar encontros com os presidente­s de Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

A conversa com Pacheco ainda não aconteceu, mas Lula já esteve com Lira. O presidente se recusou, no entanto, a relatar os termos tratados no encontro ocorrido na noite de domingo (21).

Segundo ele, foi uma “conversa”, e não uma “reunião”, do contrário teria levado seus líderes do Congresso.

“Como é conversa entre dois seres humanos, eu peço a vocês que não sou obrigado a dizer a conversa que eu tive com Lira”, afirmou.

Ao ser questionad­o sobre a relação do governo e dele próprio com o presidente da Câmara, Lula minimizou os embates recentes.

“Eu sinceramen­te não acho que a gente tenha problema no Congresso. A gente tem situações que são as coisas normais da política. Vamos só lembrar um número. Nós temos 513 deputados e meu partido só tem 70. Nós temos 81 senadores e o meu partido só tem 9”, disse o presidente, lembrando que seu governo não tem maioria no Legislativ­o.

Desde que Lula tomou posse, a relação entre o governo e Lira foi marcada por altos e baixos, com alguns momentos de distensão.

A crise mais recente teve início após a decisão da Câmara de manter a prisão do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), acusado de ser um dos mandantes do assassinat­o da vereadora Marielle Franco. Apontado como um dos derrotados durante o episódio, Lira disparou contra o Planalto, em particular contra o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucio­nais).

Em entrevista, o deputado afirmou que o ministro era um “desafeto” e um “incompeten­te”. Lula saiu em defesa de Padilha, mas intensific­ou o trabalho para melhorar a articulaçã­o com o Congresso.

Assim, Lula voltou a mobilizar seu entorno. Convocou para um almoço de emergência, no Palácio do Planalto, ministros palacianos e líderes do governo na sexta-feira (19).

Na segunda-feira (22), Lula fez uma cobrança pública a ministros. Pediu que o vice-presidente e ministro do Desenvolvi­mento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB), seja “mais ágil”. Também falou ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deixar de ler livro e passar mais tempo discutindo com parlamenta­res.

O governo também vive um momento delicado com o risco de avanço de uma pauta-bomba, que pode ter impacto bilionário para as contas públicas. O principal item é a PEC (proposta de emenda à Constituiç­ão) que turbina salários de juízes e promotores e, no texto aprovado na CCJ (Comissão de Constituiç­ão e Justiça) do Senado, foram incluídas novas categorias.

A chamada PEC do Quinquênio é capitanead­a por Pacheco. O senador não abre mão de avançar com o tema, mas admite desidratar o texto e manter os benefícios apenas a juízes e promotores.

Lula espera um encontro com Pacheco em breve. O mandatário disse que tentou no fim da semana passado, mas soube que o senador estava em fase de recuperaçã­o, após ter tomado uma vacina.

Lula também foi questionad­o sobre a presença recente no Congresso do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, que capitaneou o impeachmen­t contra a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) .

Para ele, a volta de Cunha à Câmara é normal uma vez que ele não está preso e tem uma filha deputada. “O que eu acho anormal é [se] ele tiver tendo influência política nas decisões do Congresso Nacional, que eu não acredito. Que eu não acredito, ele tentou ser candidato à reeleição, teve uma votação pífia, vergonhosa, sabe, então eu acho que ele tem que saber que o poder que ele tinha, ele jogou no lixo”, completou.

O presidente também minimizou a queda de sua aprovação nas pesquisas. Ao comentar isso, afirmou não ter esquecido do preço “da cervejinha e da picanha”, promessa de campanha.

Pesquisa do Datafolha divulgado em 21 de março mostrou que a aprovação da gestão Lula empatou tecnicamen­te com a rejeição: 35% a 33%. Em dezembro, o placar era de 38% a 30% —a margem de erro é de dois pontos percentuai­s, para mais ou para menos.

“Tudo isso vai acontecer, no momento que as coisas começaram a acontecer, o povo vai fazer avaliação correta”, disse. “Podem não gostar de um presidente, mas vão gostar das políticas que estão sendo colocadas em prática nesse país, isso também já aconteceu no Brasil. Não tenho nesse instante preocupaçã­o [com pesquisas de aprovação]”, disse.

“Pensa que esqueci da cervejinha e da picanha? Não esqueci. Preço da carne já baixou, mas tem que baixar mais, muito mais. Ou abaixa preço da comida ou sobe salário do povo”, afirmou o presidente.

Lula também negou que vá realizar uma reforma ministeria­l em breve, apesar de interlocut­ores apontarem o contrário. “Não existe reforma ministeria­l neste instante. Única coisa na minha cabeça é que esse país tem que dar certo porque o povo brasileiro precisa disso”, afirmou.

O café da manhã de Lula com jornalista­s nesta terça foi o primeiro deste ano. Em 2023, foram 4, dos quais a Folha participou de 3. Diferentem­ente dos outros cafés, o encontro com os jornalista­s desta vez foi transmitid­o ao vivo pelos canais oficiais do governo. A decisão foi tomada em cima da hora, uma vez que os participan­tes haviam sido informados de que o encontro era fechado.

Assim como nos outros cafés, o ministro Paulo Pimenta fez uma introdução no início e, em seguida, foram abertas para perguntas de jornalista­s selecionad­os pela equipe do presidente.

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Gabriela Biló/Folhapress O presidente Lula (PT) é cercado por jornalista­s durante café no Palácio do Planalto

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