Folha de S.Paulo

MARIO CESAR CARVALHO

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Foro privilegia­do de políticos é perverso para a democracia

SÃO PAULO - Qual é a maior aberração: o ex-presidente Lula virar ministro para escapar do juiz Sergio Moro ou a existência do foro privilegia­do, que cria uma classe especial de cidadãos, os políticos, que só podem ser processado­s pelo Supremo? O foro privilegia­do é mil vezes mais perverso para a democracia do que a estratégia de Lula e Dilma. Políticos, afinal, trazem no DNA o instinto de fugir de punições.

A figura do foro privilegia­do foi criada em 1689 na Inglaterra, para evitar que o rei fizesse gato e sapato com os parlamenta­res. A lei nasceu com duas vertentes: o “freedom of speech”, que garantia a liberdade de expressão, e o “freedom from arrest”, a imunidade de não ser preso arbitraria­mente por atividades no Parlamento.

O sentido da lei era robustecer a nascente democracia moderna. Antes dessas leis, era comum um rei calar ou mandar prender um desafeto.

Crimes comuns, como o recebiment­o de propina ou de benesses de empreiteir­as, não eram protegidos pelo foro privilegia­do. A razão é óbvia: crimes não fazem parte da atividade parlamenta­r, ou não deveriam fazer.

O Supremo brasileiro já deu indicações de que não aceita manobras de políticos para escapar de punição. O deputado federal Natan Danadon (PMDB-RO) renunciou ao cargo nas vésperas do julgamento para escapar de uma ação no Supremo, na qual era acusado de ter desviado R$ 8,4 milhões. O Supremo refutou a manobra e condenou o deputado a 13 anos de prisão em 2010.

Após as grosserias que Lula disse sobre ministros do Supremo nos grampos captados pela Polícia Federal, seria muito fácil que essa corte repetisse com o ex-presidente o que fez com um deputado sem prestígio.

O Supremo, porém, poderia aproveitar essa oportunida­de histórica para acabar com o foro privilegia­do para crime comum e mandar todos os políticos investigad­os para juízes de primeira instância.

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