Folha de S.Paulo

ANÁLISE Afastar juiz seria medida extrema, e áudios já influencia­m congressis­tas

- JOAQUIM FALCÃO JOAQUIM FALCÃO, mestre em direito pela Univ. Harvard (EUA) e doutor em educação pela Univ.

Sim, viola o artigo 10 da lei das intercepta­ções telefônica­s. É crime fazê-lo sem autorizaçã­o judicial, que já havia se encerrado naquele momento. Moro, no entanto, diz que estava amparado por justa causa e autorizaçã­o legal anterior para a intercepta­ção. 4

Essas questões podem resultar na invalidaçã­o do grampo?

Caso sejam comprovada­s, podem torná-lo nulo, constituin­do prova obtida ilicitamen­te 5

O monitorame­nto telefônico de advogados que defendem Lula é ilegal?

Sim. A conversa com advogados é inviolável, segundo o Estatuto do Advogado. Moro diz que não identifico­u “com clareza relação cliente-advogado a ser preservada entre o ex-presidente” e Roberto Teixeira 6

Moro pode sofrer alguma sanção caso seja entendido que ele cometeu irregulari­dades?

Sim. O juiz pode sofrer processo administra­tivo (como no CNJ) ou mesmo judicial, já que é crime intercepta­r conversas sem autorizaçã­o judicial

FOLHA

A divulgação das conversas do ex-presidente Lula com a presidente Dilma levanta muitas questões. A captação da conversa foi legal ou não? Sua divulgação foi legal ou não? Quais as consequênc­ias, tanto em relação ao juiz Sergio Moro, quanto a Lula e à Dilma? Vamos devagar.

A captação foi feita às 13h32 de quarta (16). Neste momento, Lula não detinha foro privilegia­do. Ele só conquista o foro depois de publicada a nomeação no “Diário Oficial”, por volta das 19h. Ou mesmo depois da posse, nesta quinta (17), às 10h. De qualquer forma, no momento da captação, Moro era juiz competente. Assim como mandara suspender, aceitou de fato que continuass­e. Uma aceitação “a posteriori”. Polêmica.

A divulgação do áudio é outra questão. Diz respeito à sua validade como prova no processo contra Lula, em eventual processo contra Dilma e em eventual responsabi­lização do juiz Moro.

No processo contra Lula, mesmo que a divulgação tenha sido ilícita, não se anula seu efeito como prova. A produção foi lícita.

Se houver processo contra Dilma, o áudio não valerá como prova. Dilma tem foro privilegia­do, só o Supremo poderia autorizar a gravação.

Até agora, nas investigaç­ões com intercepçõ­es telefônica­s envolvendo pessoas com foro privilegia­do, o ministro Teori Zavascki mandou consultar o STF antes. De qualquer modo, a lei diz que a nulidade de uma prova não afeta um juízo condenatór­io se outras provas conduzirem ao mesmo resultado.

O que importa é analisar se Moro avançou o sinal. E quais as consequênc­ias. São duas as vias possíveis de análise.

Primeiro, a via do Judiciário. É possível afastá-lo da Lava Jato, como já tentaram diversas vezes? Essa é medida extrema. Teria que haver inicialmen­te provocação por parte dos prejudicad­os junto ao próprio Moro para que se julgasse suspeito. Depois, haveria recurso para o TRF-4 (Tribunal Federal da 4ª Região). E recurso ainda ao STF.

É possível afastá-lo alegando que praticou crime? Difícil aceitar que uma decisão em processo judicial possa ser criminaliz­ada. Não há, em princípio, criminaliz­ação do livre convencime­nto do juiz. Pode-se ainda acionar o Conselho Nacional de Justiça, para aplicar pena funcional.

Finalmente, a outra via de análise para se avaliar as consequênc­ias da captação e difusão dos áudios diz respeito ao destino político de Dilma.

O fato das conversas é incontrove­rso. Ninguém nega a autenticid­ade das gravações. São, por si, um elo que conecta Dilma às alegações de crime de responsabi­lidade: de obstrução da Justiça ou contra a administra­ção pública.

Essa é a via do impeachmen­t. Os áudios já influencia­m os congressis­tas. O Supremo já definiu o rito. A comissão especial já foi escolhida. O juízo agora é político. O Congresso é competente.

de Genebra, é professor da FGV Direito Rio

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