Folha de S.Paulo

Cada agonia no seu tempo. Se ficar provado alguma coisa contra ele, o processo continuará. Mas acho que

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Folha - Qual é a sua opinião sobre a nomeação de Lula como ministro, apesar de investigad­o pela Lava Jato?

Flávio Rocha - O governo forçou a barra. Veja a rejeição pública. A nomeação foi percebida muito mais como busca de proteção por foro privilegia­do que um reforço aos quadros do governo. Por que o senhor acha que Dilma tomou essa decisão?

É uma tentativa desesperad­a de ganhar sobrevida para um ciclo que se esgotou. A destruição de valor no país acontece dia a dia. Não temos tempo a perder.

O quanto antes encerrarmo­s esse capítulo da história dentro da legalidade prevista pela Constituiç­ão, melhor. Qual é a melhor saída hoje?

A solução ideal seria convocar eleições. Um governo respaldado por milhões de votos e com um projeto bem delineado seria a melhor maneira de mudar esse ciclo econômico. E não tem ministério. É só utilizar o binômio democracia e livre mercado.

Veja o poder desse binômio na Argentina. Os argentinos chegaram mais perto do fundo do poço do que nós, mas apenas a entrada de um governo de inspiração liberal já vem mudando o país.

Também existe outra saída mais viável politicame­nte, que é a renúncia ou o impeachmen­t, assumindo o vice-presidente Michel Temer.

Ele é muito preparado para a costura política e tem um bom programa de governo, que é o “Uma Ponte para o Futuro” [documento propos- to pelo PMDB que congrega várias reformas estruturai­s].

Tenho certeza de que Temer passaria para a história se conseguiss­e nos deixar esse programa como legado. O documento sintetiza o que o país precisa neste momento para crescer. O vice-presidente também está envolvido na Lava Jato, assim como outros líderes do PMDB. Elestemcap­acidadede formar um governo? até agora foram só impressões em delação. Nada está comprovado.

O caminho que a Constituiç­ão nos dá é este: assumir o vice. Resta torcer para que não exista nada contra o Temer e para que ele possa fazer a pacificaçã­o política e construir o consenso em torno de um projeto de país. A crise política é culpada pela crise econômica, com recessão de 3,8% no ano passado e que pode repetir a dose neste ano?

Não se pode culpar a crise política, que é uma mera decorrênci­a do caos que reina no governo. Para exigir medidas duras do Congresso, é preciso criar consenso dentro de casa. Não estou nem falando da base parlamenta­r, mas dos próprios ministério­s.

O ajuste fiscal fracassou pelas sinalizaçõ­es de dissenso no Planalto. O tapete do ex-ministro Joaquim Levy [Fazenda] foi puxado sucessivas vezes num momento decisivo para o país. Se Lula se mantiver no comando da Casa Civil, ele deve promover uma guinada à esquerda na política econômica?

Esse é o pior dos cenários. O discurso do Lula está muito diferente do primeiro mandato, quando promoveu um expressivo ajuste fiscal.

Os pontos do programa do PT são assustador­es e mostram que o partido não aprendeu nada e também não esqueceu nada.

É a repetição de todos os erros que nos levaram a esse caos, principalm­ente o reforço da “nova matriz econômica” [expansão fiscal, abandono da meta de inflação, câmbio controlado e crédito barato], adotada desde 2008.

O discurso de Lula indica que ele vai por essa via de mais estatismo, cresciment­o de gasto público e escancarar a porta dos bancos estatais.

Quando ele foi anunciado ministro, as ações do BB despencara­m, porque o mercado entendeu que seria a ruína dos bancos estatais. A Fiesp “envolveu” na quarta (16) seu prédio numa faixa de luz preta pedindo a renúncia de Dilma. Qual é a sua avaliação sobre essa iniciativa?

Estamos encerrando um ciclo estatizant­e, caracteriz­adopelacri­açãodoscam­peões nacionais e por um capitalism­o de conluio.

Agora será o início de um novo ciclo baseado no livre mercado, cujos protagonis­tas serão os empresário­s e a livre-iniciativa.

Por isso, vejo com bons olhos os empresário­s estarem saindo da toca. Uma posição arredia do setor poderia retardar esse processo.

Manifestaç­ões corajosas como as de Pedro Passos [dono da Natura, que pediu a renúncia da presidente em coluna na Folha] e de Lawrence Pih [ex-dono do Moinho Pacífico, que disse que a saída de Dilma é inevitável] passam confiança para a opinião pública. Deixam claro que os empreended­ores brasileiro­s têm condições de assumir a locomotiva desse novo ciclo econômico.

Não se pode culpar a crise política, que é uma mera decorrênci­a do caos que reina no governo. Para exigir medidas duras do Congresso, é preciso criar consenso dentro de casa “

Cada agonia no seu tempo. Se ficar provado alguma coisa contra ele [Michel Temer], o processo continuará. Mas acho que até agora foram só impressões em delação. Nada está comprovado

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