Folha de S.Paulo

Mercado espera anúncio da morte

- VINICIUS TORRES FREIRE

DILMA ROUSSEFF passou ontem o controle do PAC, do Programa de Aceleração do Cresciment­o, do Ministério do Planejamen­to para a Casa Civil, pasta que Lula talvez tenha assumido, a depender da decisão da Justiça.

E daí? Nada ou quase nada. Quase ninguém liga.

Mesmo as associaçõe­s empresaria­is, políticas por natureza, inclusive as sempre governista­s, abandonam Dilma Rousseff.

Na praça do mercado, pouco se presta atenção ao que faz o governo, com exceção de medidas que afetem a gestão imediata do dinheiro. Por exemplo, ontem o Banco Central resolveu aproveitar a calmaria mundial e a baixa do dólar para anunciar que vai intervir menos no câmbio (vinha agindo para evitar desvaloriz­ação do real).

Política econômica é, por ora, motivo de piada.

Isso quer dizer que a fatura está decidida? Claro que não. Sabe-se lá o que virá da Lava Jato, se a cúpula do PMDB cai inteira nas denúncias, se a deposição da presidente se arrasta etc. No entanto, o pessoal do dinheiro pensa na data do passamento do governo.

No “mercado”, as conversas especulati­vas do dia a dia agora parecem voltadas para: 1) Antecipar vazamentos da Lava Jato; 2) Prestar atenção às decisões da Justiça, em especial do STF; 3) Acompanhar o placar do impeachmen­t.

Por exemplo, se o governo começa sem maioria na comissão do impeachmen­t e o PMDB indica já nes- ta sexta que vai desembarca­r, isso decide o destino de uns milhões aqui, outros ali, para fazer uma caricatura da coisa. Em suma, o pessoal vive agora de “precificar” o “último fim” do governo, como se diz no jargão. Isto é, decidir quando deve vender ou comprar tal ou qual ativo financeiro, dado que a morte cerebral do governo estará decretada em tal ou qual dia, embora o corpo morto ainda possa respirar por aparelhos.

E o PAC nas mãos de Lula, o que significa?

Nada, porque discutir medidas de governo, em particular de administra­ção econômica, tornou-se atitude ociosa, pois o Planalto ora pouco mais é do que um comitê alucinado de salvação de si próprio.

Ou perto de nada. A mudança do PAC é uma anotação relevante do diário de bordo no navio que afunda. Isto é, um indicativo das tarefas que seriam assumidas por Lula, caso a ruína do governo não fosse tão frenética. Ressalte-se o que é o PAC: é o nome de fantasia que se dá à administra­ção de quase todos os dinheiros de investimen­tos em obras. O que Lula fará disso, ou faria, é ainda um mistério.

Na tarde de quarta-feira, antes do terremoto que quase acabou de destruir a muralha do Planalto, discutia-se ainda se Lula no governo seria Lula 3, com nova administra­ção econômica. Discutia-se a “virada à esquerda”, a “saída pela direita” ou a continuaçã­o do presente arroz com feijão queimado, enriquecid­o por um torresmo de crédito. Lula quer “esperança”, medidas que reanimem a economia catatônica.

Dilma Rousseff então foi à TV e procurou dizer que ainda estava no controle da economia, que nada mudaria na Fazenda ou no Banco Central. Duas horas depois, a revelação das escutas de Lula dissolveu ainda mais no éter, no espaço, as intenções da presidente e as especulaçõ­es sobre a política econômica de Lula 3.

Mesmo empresário­s mais políticos abandonam Dilma; mercado faz apostas na hora da morte

vinicius.torres@grupofolha.com.br

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