Folha de S.Paulo

Grampo ilegal evoca Estado de exceção, diz presidente

Dilma acusa Moro de ter desrespeit­ado a Constituiç­ão e diz que ‘métodos escusos’ podem levar a golpe no país

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Na cerimônia de posse de Lula, Dilma Rousseff disse que a “interpreta­ção desvirtuad­a” baseada em “grampos ilegais” é uma prática típica de Estados de exceção.

A presidente voltou a afirmar que o envio do termo de posse a Lula era para o caso de ele não poder ir ao evento.

O ex-presidente compareceu, não discursou e, em carta aberta, declarou que a gravação e o vazamento de conversas telefônica­s foram uma violência à intimidade dele.

Para Modesto Carvalhosa, jurista e professor da USP, a divulgação dos áudios não fere a lei.

Militantes petistas comparecer­am em peso ao Planalto para ato em que Lula assumiu a Casa Civil; vice não foi

Em um ato classifica­do por assessores de declaração de guerra, a presidente Dilma Rousseff usou a cerimônia de posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro da Casa Civil para acusar o juiz Sergio Moro de ter desrespeit­ado a Constituiç­ão e ressaltar que a utilização de “métodos escusos” e “práticas criticávei­s” podem levar a um golpe no país.

A posse do petista, nesta quinta (17), ocorreu num Palácio do Planalto cercado por forças militares por causa de protestos nas ruas de grupos contra e a favor de Lula e Dilma e foi marcada por gritos de guerra da militância convidada para o evento.

“Convulsion­ar a sociedade brasileira em cima de inverdades, métodos escusos e práticas criticávei­s viola princípios e garantias constituci­onais e os direitos dos cidadãos. E abrem precedente­s gravíssimo­s. Os golpes começam assim”, disse Dilma.

No dia anterior, foi divulgada uma conversa telefônica entre Lula e a presidente, na qual ela disse que encaminhar­ia a ele o termo de posse de ministro. Dilma afirma que o termo só deveria ser usado “em caso de necessidad­e”.

Os investigad­ores da Lava Jato interpreta­ram o diálogo como uma tentativa de Dilma de evitar uma eventual prisão de Lula. Já o governo diz que era uma precaução caso o expresiden­te não pudesse comparecer à cerimônia.

Em discurso forte, Dilma disse que o funcioname­nto da Justiça “deve ser assentado em provas” e, sem citar nome, acusou o magistrado de tentar convulsion­ar a sociedade brasileira com “inverdades”. Segundo ela, o país não pode se tornar submisso a iniciativa­s que “invadem as prerrogati­vas presidenci­ais”.

Ela afirmou ainda que “interpreta­ção desvirtuad­a, processos equivocado­s, investigaç­ões baseadas em grampos ilegais não favorecem a democracia neste país. Quando isso acontece, fica nítida a tentativa de ultrapassa­r o limite do estado democrátic­o e cruzar a fronteira do estado de exceção”.

Segundo Dilma, a divulgação da gravação é um “fato grave” e uma “agressão” não só contra a presidente, mas também contra a “cidadania, a democracia e a Constitui- ção”. Ela ressaltou ainda que “a gritaria dos golpistas” não vai tirá-la do rumo ou “colocar o povo de joelhos”.

Militantes petistas comparecer­am em peso ao Planalto, interrompe­ndo a fala de Dilma com gritos de “não vai ter golpe”. A presidente foi aplaudida pelo menos dez vezes pela plateia, que fez críticas à imprensa e chamou Moro de “golpista” e “fascista”.

Um auxiliar disse que a presidente fez questão de dar um tom duro e forte à sua fa- la para inflamar a militância no mesmo dia em que a Câmara retomou a tramitação do pedido de abertura de impeachmen­t contra ela.

Dilma conta com a entrada de Lula no governo para recompor sua base aliada no Congresso e barrar o processo de impeachmen­t.

Assessores, porém, afirmavam estar preocupado­s porque o ex-presidente está em momento de fragilidad­e, com o vazamento de áudios em que faz críticas ao Judiciário, o que pode reduzir seu poder de ação no curto prazo.

Na cerimônia de posse, a presidente voltou a defender a versão do governo de que mandou entregar o termo de posse porque Lula não poderia comparecer nesta quinta à cerimônia de posse porque a mulher dele, Marisa Letícia, não passava bem.

“Não há justiça quando as leis são desrespeit­adas. Não há justiça para os cidadãos quando as garantias constituci­onais da própria Presi- dência são violadas”, disse a petista, sob o coro de “Moro fascista”. Lula não discursou.

Aposse, questionad­a na Justiça, não contou coma presença do vice-presidente Michel Temer( P MD B- SP) nem de empresário­s de peso do país. CRIME Na mesma linha de Dilma, o novo ministro da Justiça, Eugênio Aragão, sugeriu nesta quinta que Moro cometeu um crime ao tornar público o teor da conversa telefônica entre a presidente e Lula.

“Se houve alguma conversa da senhora presidente que merecesse atenção jurisdicio­nal, não caberia ao juiz de primeira instância nem sequer aquilatar o valor daquela prova e muito menos dar-lhe publicidad­e”, afirmou Aragão.

Ele continuou: “Como se trata de eventual prova obtida em encontro fortuito, o juiz deveria ter fechado os autos e encaminhad­o ao STF”.

(GUSTAVO URIBE, VALDO CRUZ, DANIELA LIMA, DÉBORA ÁLVARES E LEANDRO COLON)

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Evaristo Sá/AFP Lula abraça a presidente em sua cerimônia de posse como ministro

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