Folha de S.Paulo

Agnaldo e os cangurus

- ALVARO COSTA E SILVA

RIO DE JANEIRO – Um amigo, que costuma caminhar no aterro do Flamengo e (reconheço) é dado a exageros, se sentiu dentro da cena de abertura de “O Resgate do Soldado Ryan”, aqueles intensos 27 minutos com que Steven Spielberg retratou o ataque dos aliados à praia de Omaha, Normandia, no dia 6 de junho de 1944. Na realidade, ao fundo estava o Pão de Açúcar. É a Rio-2016.

O exercício militar na semana passada envolveu mais de mil fuzileiros, que simularam um cerco ao Monumento dos Pracinhas. Em outro treinament­o, uma barca Rio-Niterói, com terrorista­s do fictício país da Bugolávia, foi intercepta­da. (Bugolávia? Se fosse numa comédia dos Irmãos Marx, seria um ótimo nome.)

Às vésperas da abertura da Olimpíada, o carioca tenta manter a rotina, ignorando a presença das Forças Armadas, mais de 22 mil homens com fuzis, tanques nas ruas e caças nos céus. Há quem se sinta mais seguro. Mas é inegável o desconfort­o de andar num cenário lindo — dias feitos de azul — mas também de guerra, e saber que o perigo, invisível, pode estar logo ali na esquina.

Se o clima de paranoia, ampliado pelos atentados na Europa, não fosse suficiente­mente ruim, ainda temos de conviver com a autossabot­agem: as péssimas instalaçõe­s da Vila dos Atletas — sanitários entupidos, vazamento de pias, fiação exposta, tetos caídos, falta de luz — levaram a delegação da Austrália a procurar um hotel. Perfeito anfitrião, o prefeito Eduardo Paes fez uma piada boba, sobre recepcioni­stas cangurus.

Melhor deixar a brincadeir­a para quem é do ramo: a turma de boêmios que segue firme na campanha para fazer do Agnaldo, famoso garçom do Galeto Sat’s, em Copacabana, o acendedor da pira. Sábado (30) acontece o “tour da tocha”, por 12 bares no bairro. No fim do trajeto Agnaldo acenderá a churrasque­ira e servirá coraçõezin­hos de galinha.

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