Folha de S.Paulo

Sanear projetos e gestão

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Assim como ocorre com a má qualidade do ensino público no Brasil, é consensual o imperativo de eliminar o intoleráve­l atraso do país no saneamento básico. Do consenso à consequênc­ia subsiste um largo caminho, entretanto, que o Estado tem enorme dificuldad­e em transpor.

A radiografi­a do fracasso vai delineada com clareza no último relatório “De Olho no PAC” (20092015), que o Instituto Trata Brasil vem de publicar. Sob a mira do levantamen­to estavam 340 obras listadas nas duas fase do Programa de Aceleração do Cresciment­o, PAC1 (2007-2010) e PAC-2 (2011-2015).

O destaque conferido ao saneamento básico (redes de água e coleta e tratamento de esgotos) no PAC despertou a expectativ­a de que os governos federal, estaduais e municipais se dedicariam a zerar o atraso. Segundo o Trata Brasil, ainda temos 35 milhões de pessoas sem acesso à rede de água, mais de 100 milhões sem coleta de esgotos e meros 40% dos dejetos tratados.

A expectativ­a se ancorava, em grande medida, em vultoso montante de recursos. As 340 obras representa­m investimen­to total de R$ 22 bilhões. A maior parte disso viria de financiame­ntos da Caixa Econômica Federal (55%), cabendo o restante à União (25%) e ao BNDES (20%).

O levantamen­to revela, porém, que apenas 36% das obras estavam concluídas em 2015. Outros 39% ainda se encontrava­m em andamento (não raro com atraso). Pior: 11% nem mesmo haviam sido iniciadas e 14% se achavam paralisada­s. Recursos ociosos, que naquela altura somavam R$ 5,7 bilhões.

Quase metade (45%) do planejado ainda no PAC-1 se achava paralisado ou em execução. Na região Norte, que exibe os piores índices de saneamento, 38% das obras de água nem sequer estavam em andamento em 2015, mesma situação de 25% daquelas relativas a esgotos.

De qualquer ângulo que se considere, ao desastre sanitário se sobrepõe o administra­tivo. Em contato com os tomadores dos recursos, os autores do estudo pediram que se indicassem os motivos do atraso, e as falhas de gestão emergem em meio à turbidez geral.

Entre as razões alegadas se destacam demora na liberação de recursos pelo Ministério das Cidades, inadequaçã­o de projetos, tropeços no licenciame­nto ambiental, renegociaç­ão e rescisão de contratos.

O de sempre, em resumo. Para tirar o Brasil dessa insalubrid­ade ao estilo do século 19, será preciso depurar a burocracia estagnada e sanear os projetos de engenharia.

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