Folha de S.Paulo

O dilema da saúde

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SÃO PAULO - Existem situações em que o administra­dor público sempre perde. O caso clássico é o do bebê doente que precisa de um remédio de alto custo não coberto pelo sistema de saúde. Se o gestor segue as regras e nega o tratamento, será visto como um monstro insensível à dor da família. Se, por outro lado, ele autoriza a compra do fármaco, será censurado por ter agido de forma antirrepub­licana, passando por cima dos interesses de um número muito maior de pacientes que não padecem de moléstias midiáticas.

É bem esse o dilema dos ministros do STF que julgam a chamada judicializ­ação da saúde. Serão criticados por qualquer decisão que tomem. Ou estarão privando alguns doentes com nome, rosto e história do direito à saúde, ou estarão agindo de forma fiscalment­e irresponsá­vel, o que, ao fim e ao cabo, também resulta em subtrair direitos vitais a um um conjunto anônimo de pacientes.

O fato de não haver como o tomador da decisão ficar bem na foto não significa que não exista uma decisão certa. Por mais difícil que seja fazêlo, agentes que atuam em nome do Estado precisam despir-se de todas as emoções e preferênci­as e pautar suas escolhas pelo princípio utilitaris­ta do “maior bem para o maior número de pessoas”, permanecen­do deliberada­mente cegos para a identidade dos indivíduos envolvidos.

Na prática, penso que os ministros precisam, sim, limitar a possibilid­ade de pacientes conseguire­m na Justiça acesso a tratamento­s não previstos no SUS, que deve permanecer universal, isto é, prestando os atendiment­os a todos, sejam eles ricos ou pobres. O que os magistrado­s poderiam cobrar do Ministério da Saúde é que desenvolva um mecanismo para avaliar rapidament­e a incorporaç­ão de novos medicament­os e terapias ao SUS, segundo critérios transparen­tes de custo e benefício. Existe hoje toda uma família de ferramenta­s estatístic­as, como Qaly, Daly e Haly, que ajudam nessas decisões. helio@uol.com.br

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