Dor de mãe é encenada em ‘Berço de Pedra’
Espetáculo que estreia nesta sexta (30) no Centro Cultural São Paulo reúne cinco contos inéditos de Newton Moreno
Segundo dramaturgo, mulheres da peça são focos de resistência ‘neste mundo bruto em que vivemos’ FOLHA
Na comédia ou no drama, o dramaturgo Newton Moreno busca transpassar em seus trabalhos as intersecções daquilo que acredita ser o “lugar do feminino” na essência humana. “Eu tenho sempre essa preocupação. Talvez preocupado com o equilíbrio entre o que temos como masculino e feminino”, diz Moreno.
“Um Berço de Pedra”, que estreia hoje no Centro Cultural São Paulo, vai no cerne desta feminilidade para reafirmar o olhar crítico e, em certa medida, poético sobre a mulher. Neste caso, as mães.
Com direção de William Pereira, o espetáculo reúne cinco contos inéditos de Newton Moreno sobre maternidades dolorosas. São relatos independentes, mas que se igualam na condição psicológica.
“Elas tentam, à sua maneira, resistir, em meio a este mundo bruto em que vivemos. Nesse berço de pedra”, afirma.
Os personagens foram criados a partir de observações documentais, segundo Moreno. Como é o caso de “Medeia”, em que o dramaturgo
As atrizes Débora Duboc (à esq.) e Cristina Cavalcanti
adapta o mito grego para o contexto de uma mulher presa por matar o filho.
A morte também está presente em outros dois contos da peça. “Berço de Pedra”, história que dá título à montagem, narra o encontro de duas mulheres numa guerra. Uma delas procura o filho desaparecido; a outra, grávida, quer um lugar para parir.
Já em “Canteiro”, uma mãe que teve seu filho assassinado encontra com a viúva do policial acusado de ter cometido o crime. “São os lutos que não se realizaram”, afirma Moreno.
A figura masculina entra em cena em apenas dois contos da peça. Em “O Caminho do Milagre”, o estuprador é encarado pela mulher abusada sexualmente e grávida dele. E, por fim, “Tráfego” mostra sofrimento de um homem ao ver um menino ser vendido pela mãe na rua.
“O arquétipo da mãe é um libelo a tudo que está acontecendo no Brasil e no mundo: o massacre, a violência, a tirada das mulheres do poder”, diz a atriz Luciana Lyra, parceira de Newton Moreno na companhia Os Fofos Encenam.
Ela divide a cena com Agnes Zuliani, Cristina Cavalcanti, Débora Duboc, Lilian Blanc e Eucir de Souza.
Para o diretor William Pereira, as imagens utilizadas no texto transformam a encenação em um “realismo poético”. “Newton fala de temas muito duros e ásperos, mas com uma imagética que nos joga ao mito”, explica.
Embora fale da maternidade, acrescenta o diretor, “a peça foge do clichê da mulher parideira”. “É uma crítica a esse estereótipo. Os conflitos dessas mulheres surgem justamente por elas viverem em um mundo paternalista.”
Primeira vez na direção de um texto de Newton Moreno, Pereira diz que usou a experiência na direção de ópera para valorizar o lirismo das falas. “A palavra é soberana. Em um mesmo personagem, lido com quatro ou cinco imagens potentes”, conta o diretor. “Eu falo que é um espetáculo muito mais de regência, com ritmos e pausas.” QUANDO sex. e sab., às 21h; dom., às 20. Até 6/11 ONDE Centro Cultural São Paulo, r. Vergueiro, 1.000. tel. (11) 3397-4002 QUANTO R$20.Sóem7/10,às20h,R$3 CLASSIFICAÇÃO 14 anos