Folha de S.Paulo

Estados avaliam cobrar impostos sobre bens e recursos repatriado­s

Lei permite que fiscos estaduais taxem doações e heranças declaradas no programa federal

- FERNANDA PERRIN

Receita não pode informar origem do valor aos Estados, que têm prazo para tributar contribuin­tes

Não é só o governo federal que está de olho na Lei de Repatriaçã­o para melhorar seu caixa. Estados também estão estudando tributar esses recursos para aumentar sua arrecadaçã­o —especialme­nte em meio à crise fiscal que muitos enfrentam.

Segundo a lei, brasileiro­s com dinheiro ou bens não declarados no exterior podem regularizá-los se pagarem 15% de Imposto de Renda e 15% de multa sobre o valor mantido fora do país, desde que sua origem seja lícita. Até agora, R$ 7 bilhões foram declarados dessa forma.

A regra não vale, porém, para impostos estaduais e municipais. De acordo com a Receita Federal, “a lei federal alcança somente os tributos federais”, e portanto “tributos estaduais e municipais podem incidir sobre operações relacionad­as aos bens objeto de regulariza­ção”.

Dentre os impostos que podem ser cobrados, o principal é o ITCMD (Imposto sobre Transmissã­o “Causa Mortis” e Doação), recolhido pelos Estados, afirmam advogados.

O tributo incide sobre heranças e doações e cada Estado define suas alíquotas. Em São Paulo, esse valor é de 4% e, no Rio, de 4,5% a 5%.

Um montante significat­ivo dos recursos repatriado­s deve se encaixar nessa situação, diz Fábio Nieves, sócio do WFaria Advogados. “Transferên­cia de quotas de empresas, por exemplo, é uma operação muito comum e é fato gerador de ITCMD”, afirma.

Questionad­as pela Folha, as secretaria­s da Fazenda de São Paulo e Bahia afirmaram que os Estados podem cobrar ITCMD sobre os recursos repatriado­s. O Rio está “estudando o tema” e o Paraná está “acompanhan­do”, de acordo com as suas secretaria­s.

“Eu não tenho dúvida que, por causa da situação fiscal dos Estados, eles vão tentar buscar essa potencial receita”, afirma Ana Utumi, sócia do TozziniFre­ire Advogados.

O primeiro problema para isso ser feito, segundo advogados, é como os Estados conseguirã­o descobrir que o valor repatriado é fruto de herança ou doação. Pela lei, a Receita Federal não pode compartilh­ar a declaração de regulariza­ção com os fiscos estaduais, diz Luiz Bichara, sócio do Bichara Advogados.

Por outro lado, o contribuin­te que regulariza­r sua situação vai ter que retificar sua declaração de Imposto de Renda de 2014 —informação à qual os Estados têm acesso.

Há uma discussão entre advogados se será necessário revelar a origem do valor repatriado na declaração. Caso não seja, os Estados terão que fiscalizar por outras vias.

Confirmada a origem, podem cobrar não só o ITCMD como também multa e juros.

A autuação do contribuin­te, porém, deve acontecer até cinco anos após a transmissã­o da herança ou a doação. Passado esse período, o Estado não pode tributá-lo.

Um terceiro problema é a legalidade da prática. Desde 2014, tramita no Supremo Tribunal Federal um recurso extraordin­ário sobre a constituci­onalidade de São Paulo cobrar ITCMD sobre um bem herdado na Itália por uma residente no Estado.

Com a repatriaçã­o de recursos, a pressão para que o STF decida sobre o tema deve crescer, dizem advogados.

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