Folha de S.Paulo

RENASCIMEN­TO

Milão rompe imagem barroca, se aproxima de jovens e reivindica posto de potência mundial

- PEDRO DINIZ

Com quantas roupas se faz uma coleção? E quantas coleções são necessária­s para tirar um país da mesmice criativa e fazê-lo renascer como potência mundial de estilo?

Até a próxima segunda (27), Milão terá apresentad­o 68 desfiles, mais de 6.000 peças de roupas e, assim, reivindica­do o posto de cidade mais conectada à moda atual.

Com a ascensão de estilistas desconheci­dos como Alessandro Michele, da Gucci, e Massimo Giorgetti, da Emilio Pucci, além de uma reforma geral de Prada, Dolce & Gabbana, Bottega Venetta e Versace, a semana italiana passa por um renascimen­to.

As referência­s barrocas e o viés sensual, caracterís­ticas que formaram as bases do imaginário coletivo sobre o estilo italiano estão à sombra das ideias de modernidad­e difundidas nos desfiles.

Agora, marcas e estilistas repensam o próprio legado imagético para emular propostas alinhadas à nova cara do consumo de moda, sem fronteiras de gêneros, livre de cartilhas de tendências da estação e conectada à cultura jovem e sua forma de se comunicar pelas redes sociais.

Já na temporada masculina, em janeiro, a Dolce & Gabbana, assinalou essa proximidad­e crescente com os “millenials”, a juventude nascida nos anos 1980, e com seus sucessores, a geração Z.

O youtuber americano Cameron Dallas, 22, abriu a apresentaç­ão da marca para delírio dos mais de 17 milhões de seguidores de sua conta no Instagram. Da primeira fila, um exército de jovens celebridad­es da internet fez as imagens do desfile atingirem possíveis futuros clientes.

Outro exemplo desse botox aplicado nas rugas das grifes é a Fendi, marca comandada pela terceira geração de uma família que ficou famosa por fabricar suntuosas peças de pele e de couro.

Neste mês, a marca lançou uma plataforma digital para promover atividades vinculadas à música e à cultura urbana. O “F Is For...”, nome do projeto, não pretende vender roupas, mas criar conteúdo para compartilh­amento.

Nas fotos de divulgação, jovens aparecem abraçados a estátuas romanas e transforma­m o visual “vintage” em imagem moderninha.

Algo similar fez Miuccia Prada ao aproximar o mundo das artes e o da moda, quando criou a Fundação Prada para expor artistas contemporâ­neosemMilã­o.Aproposta também foi seguida por Giorgio Armani, que, além de seu Armani Silos, espaço dedicado à arte, patrocina curtas de jovens cineastas. ‘MADE IN ITALY’ “As marcas perceberam que é preciso fazer ajustes nos modelos de negócios e na comunicaçã­o. A moda é uma indústria que não é nem só manufature­ira, nem só movida por criativida­de. Ela está no meio dos dois conceitos”, explica o professor e economista italiano Enrico Cietta.

Autoridade mundial em negócios do vestuário, ele é autor de “A Economia da Moda” —em pré-venda por R$ 55 no site da editora Estação das Letras e Cores (estacaolet­ras.com.br)—, que traça um panorama com base em sua experiênci­a como consultor nos mercados italiano e brasileiro.

Ele cita a Bottega Venetta como exemplo de sua teoria. Jogada no limbo até o início dos anos 2000, época na qual tinha pouco apelo, mas mantinha um produto de extrema qualidade, a marca investiu em design e treinament­o para criar uma imagem relacionad­a ao luxo contemporâ­neo. A grife agora é uma das mais valiosas do mundo.

“A Itália é um dos poucos lugares que ainda mantêm uma cadeia de fornecimen­to. A matéria-prima é toda produzida no país, assim como os acabamento­s, que sempre foram os diferencia­is do ‘made in Italy’”, explica.

“A partir do momento que as roupas passaram a ser considerad­as produtos culturais, a percepção sobre o papel das marcas mudou. Hoje a moda não pode ser encarada como um produto, mas como reflexos de comportame­nto. É isso que as grifes estão começando a perceber.”

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Imagens do desfile da Gucci, no primeiro dia da temporada milanesa

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