Folha de S.Paulo

Setor da construção civil aposta no desenvolvi­mento

De novos materiais e mecanismos para diminuir desperdíci­o em obra e aumentar conforto de morador

- ANAÏS FERNANDES

Empresasde­construção­civil e decoração estão investindo em tecnologia para criar produtos mais eficientes. Para facilitar o dia a dia dos moradores, até as paredes precisam entrar nos trilhos.

Foi o que fez, literalmen­te, a incorporad­ora Trust Real Estate. Num edifício construído no Alto da Lapa, zona oeste de São Paulo, a solução encontrada para a planta do imóvel foi “suspender” a parede em trilhos e motorizá-la.

Ao toque de um botão, o morador do prédio que será entregue em junho poderá “eliminar” um dos dois quartos da unidade, de 68 metros quadrados, expandindo a sala se necessário, e vice-versa.

“Primeiro, tentamos fazer em uma fábrica de estruturas metálicas, mas ficou grosseiro.Depois,pedimospar­auma empresa de divisórias; melhorou, mas ainda não parecia uma parede”, conta Martim Gross, sócio da Trust.

Com dois engenheiro­s civis, um mecânico e outro elétrico, a incorporad­ora tocou o projeto e patenteou a “flexwall”, tecnologia desenvolvi­da em seis meses com R$ 100 mil —o apartament­o custa a partir de R$ 820 mil.

A ideia inicial era que a movimentaç­ão da parede fosse manual, mas testes mostraram que puxar a estrutura era inviável. A empresa adicionou um motor à parede, o que gerou outro “problema”.

“A parede ‘anda’ em dez segundos. Foi preciso instalar sensores para detectar se havia algum obstáculo no caminho e não ter risco de esmagament­os”, diz Gross.

Tentativa e erro também marcaram o caminho do empresário Rafael Sorano, 43. Quando ele teve a ideia de criar pastilhas de garrafa PET, achou que havia tecnologia disponível no mercado. “Mas precisei desenvolve­r tudo.”

Foram três anos e meio e R$ 5,5 milhões investidos em pesquisa e desenvolvi­mento, como prototipag­em de máquinas e criação de cores especiais para as peças.

O resultado foram pastilhas compostas 85% por PET reciclado e 15% por aditivos minerais reaproveit­ados. Máquinas, materiais e todo o processo foram patenteado­s no Brasil, nos EUA, no Canadá e na Europa, e os planos da fábrica para este ano incluem o início da exportação para o mercado norte-americano, com a construção de um depósito e uma loja.

Cada metro quadrado do revestimen­to retira 66 garrafas do ambiente, segundo Sorano. Hoje, a fábrica em Santo André produz 15 mil metrosquad­radosdepeç­as/mês.

“O modelo extrativis­ta de ocupação do planeta vai gerar um esgotament­o rápido dos recursos. Vamos precisar investir em tecnologia­s para usar várias vezes o mesmo produto”, diz Luiz Henrique Ferreira, diretor da consultori­a Inovatech Engenharia. CIMENTO X BRITA O “boom” vivido pelo setor da construção entre 2010 e 2014 estimulou a busca por soluções inovadoras, mas a desacelera­ção seguinte impôs novos desafios.

“A preocupaçã­o com o corte de custos e tempo se tornou essencial, e isso passa pela utilização de novos materiais”, diz Marco Antonio Barcelos, gerente de Engenharia da Finep (Financiado­ra de Estudos e Projetos).

No Departamen­to de Construção Civil da Escola Politécnic­a da USP, pesquisado­res querem saber como reduzir o cimento na composição do concreto sem a perda de propriedad­es como resistênci­a.

“Cerca de 20% do custo da obra de um prédio é só concreto, isto é, cimento, areia, brita e água”, diz o professor Flávio Maranhão, um dos responsáve­is pela pesquisa.

Para reduzir o componente da mistura, é preciso preencher o espaço com outro material. “Podemos colocar mais brita e areia, diminuindo a quantidade de cimento.”

Encontrar esse equilíbrio é o desafio, e o impacto no custo da obra pode ser grande. Segundo o professor, uma tonelada de cimento custa R$ 300 —a mesma quantidade de brita sai por até R$ 50.

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