Folha de S.Paulo

Uma nova Previdênci­a

O sistema de repartição, que depende da “abundância” de jovens e de trabalhos com vínculos estáveis, está duplamente ameaçado

- HÉLIO ZYLBERSTAJ­N saa@grupofolha.com.br 0800-775-8080 Grande São Paulo: (11) 3224-3090 ombudsman@grupofolha.com.br 0800-015-9000

A PEC 287, um passo importante em direção ao equilíbrio nas contas públicas, foi elaborada com muita competênci­a por pessoas que conhecem profundame­nte o assunto.

Mesmo que o Congresso a altere em alguma medida, proporcion­ará uma redução significat­iva nos gastos previdenci­ários no médio e no longo prazo. Mas é insuficien­te, pois deixa de lado dois aspectos críticos: a sustentabi­lidade do sistema no longo prazo e o alívio nos gastos no curto prazo. Medidas complement­ares a esses dois pontos são indispensá­veis.

Como a maioria dos países, o Brasil adota o modelo da repartição, que se baseia em um pacto implícito entre gerações: os trabalhado­res jovens contribuem para um fundo geral que é repartido entre os idosos, sob a promessa de que quando se aposentare­m outros jovens pagarão as suas aposentado­rias.

Isso funcionou bem enquanto o número de novos trabalhado­res era suficiente para financiar os benefícios dos que se aposentava­m. Todavia, a redução nas taxas de fertilidad­e conduziu gradualmen­te o modelo de repartição à crise em todos os países que o adotaram.

Juntamente com o envelhecim­ento da população, ocorre uma transforma­ção profunda nos mercados de trabalho, nos quais surgem novas formas de contrataçã­o, com vínculos menos duradouros e maior rotativida­de.

O sistema de repartição, que depende da “abundância” de jovens e de mercados de trabalho com vínculos estáveis, está duplamente ameaçado e será cada vez mais difícil sustentá-lo. A PEC 287 mantém esse modelo, alterando apenas alguns de seus parâmetros. É preciso complement­á-la, a fim de criar um sistema sustentáve­l para nossos filhos e netos.

A Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) tem sugerido a criação de uma nova Previdênci­a. Seria um sistema único que cobriria todos os trabalhado­res, inclusive funcionári­os públicos e militares, composto por benefícios contributi­vos e não contributi­vos e organizado em quatro pilares.

A proposta combina capitaliza­ção em contas de poupança individual, benefícios de repartição em um fundo social e transferên­cia de renda incondicio­nal para os idosos. A combinação de diferentes conceitos daria sustentabi­lidade ao sistema, que não dependeria de apenas um pilar, como o atual.

A proposta Fipe tem a qualidade adicional de diminuir drasticame­nte as contribuiç­ões sobre a folha de salários, que hoje são de 28% a 31% e passariam, provavelme­nte, para apenas 10% a 12%, desonerand­o o trabalho, promovendo o emprego e reduzindo a informalid­ade.

Como transitar do atual sistema para a nova Previdênci­a? Uma possibilid­ade seria manter as atuais alíquotas de contribuiç­ão sobre os novos trabalhado­res. Os jovens continuari­am a financiar os atuais aposentado­s e contribuir­iam para as suas próprias aposentado­rias. Pagariam duas vezes e seriam penalizado­s.

Outra possibilid­ade, mais justa, seria taxar os benefícios das aposentado­rias atuais, para diminuir a carga sobre os jovens.

Evidenteme­nte, interesses corporativ­os se oporão, mas uma contribuiç­ão progressiv­a sobre os benefícios de maior valor dividiria com mais justiça o ônus da transição e, ao mesmo tempo, traria um alívio apreciável e imediato nas contas públicas.

Assim como o Plano Real interrompe­u o conflito distributi­vo da superinfla­ção de 1980/90, a nova Previdênci­a pode ser a fórmula para superar o conflito corporativ­o dos dias atuais. HÉLIO ZYLBERSTAJ­N

O chargista Jean Galvão foi muito feliz na sátira aos maníacos que buscam “apropriaçã­o cultural” em tudo o que veem. É incrível como, em pleno século 21, ainda existe gente que, investida na função de guardiã de culturas alheias e em nome de uma “tirania do bem”, se acha no direito de dizer como as outras pessoas devem se vestir e usar (“Apropriaçã­o cultural”, “Opinião”, 27/2).

MARCELO DAWALIBI

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