Notas para colunas inviáveis
BETH CARVALHO disse nesta segunda na Folha que o Carnaval virou um “esquemão” para a “elite da elite”; e que as escolas de samba são “reféns do patrocínio”. O sucesso do Carnaval de rua, para ela, foi uma forma de protesto.
Talvez por isso se tenha gritado “Fora, Temer” nos blocos, enquanto os desfiles foram a pasmaceira de sempre, apesar de milionária.
Beth falou que não canta mais “O Teu Cabelo Não Nega”. Porque aprendeu que a marchinha é racista: “Se Lamartine Babo errou, por que errar de novo?”
Mas a cantora é exceção. O politicamente correto é ridicularizar o politicamente correto, e seguir com o racismo brejeiro, bem brasileiro.
O politicamente correto chegou com tudo ao Oscar, o que é prova da sua correção moral e ineficácia política.
O ganhador do prêmio de melhor filme, “Moonlight”, soma três categorias (gênero, raça e geração) e três problemas (bullying, drogas e violência) para chegar à cena contemporânea. Debalde.
O concorrente mais politizado era “A Qualquer Custo”. Ele disputou outras três estatuetas e não ganhou nenhuma, nem a de coadjuvante para Jeff Bridges —outra vez excelente. Talvez porque o filme fale de história e economia, disciplinas fora de moda, e se filie a um gênero defunto, o faroeste.
“A Qualquer Custo” explica a opressão por meio da propriedade. Os nativos foram massacrados no Velho Oeste pelos colonos, cujos descendentes, cheios de dívidas, são agora novamente massacrados.
A entidade que financiou a conquista da terra e do ouro, e hoje expropria os endividados, é a mesma: os bancos. Por isso, um personagem diz: “a pobreza é uma doença que passa de geração para geração”. Para sair dessa prisão, só com violência e bandidagem.
No diário do exílio, Brecht defende que Hamlet é um idealista que se converte num cínico. Nesse espírito, se poderia adaptar a peça para o Brasil recente, com Dilma no lugar de Hamlet. Seria um enredo cruel e desordenado, um caos de intrigas, traições e espadas envenenadas. Uma carnificina deplorável e desprovida de moral que mostrasse a autodestruição do clã petista. Fernanda Torres seria uma Dilma excelente.
Ulysses Guimarães afundou no helicóptero de um empresário. Eduardo Campos explodiu num jatinho mutretado. Teori Zavascki caiu no mar com um estalajadeiro de luxo. Aécio Neves rabeou na pista e quase virou outro Mártir da Guerra Alada Contra a Corrupção.
O desejo maior de todo político é não entrar nunca mais num avião de carreira. Aécio ia a São Paulo para um encontro com Fernando Henrique. Como senador, tem direito
Numa página de “O Capital”, explica-se a natureza e o trabalho com a comparação entre criaturas que constroem. Uma abelha hábil pode até envergonhar arquitetos com os favos intrincados que faz. Mas o que distingue o pior arquiteto da melhor abelha é que ele usa a cabeça, tem ideias —obtém um resultado que existiu antes na sua imaginação.
Pois bem: Temer e sua colmeia imaginam construir algo? Ou põem em prática cegamente o que o capital determina?
Comparar o bom selvagem (“Discurso sobre a Origem das Desigualdades”) com o homem automático (“A Ideologia Alemã”). Concluir que é mais fácil imaginar o fim do mundo —da natureza— que o fim do capitalismo.
Ulysses, Campos e Aécio mostram que o desejo de todo político é nunca mais entrar em avião de carreira