Folha de S.Paulo

Na chapa

Temer apresenta tese frágil para não ter de responder, na Justiça Eleitoral, por eventuais recursos ilícitos na campanha de Dilma Rousseff

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Soa inconvince­nte, para dizer o mínimo, uma das principais estratégia­s aventadas pela defesa do presidente Michel Temer (PMDB) no processo que enfrenta no Tribunal Superior Eleitoral.

Como se sabe, a chapa de que participou como vice, ao lado de Dilma Rousseff (PT), sofre contestaçã­o no TSE, acusada de irregulari­dades nas contas de campanha.

O impeachmen­t da petista não interrompe­u as investigaç­ões sobre a chapa vitoriosa em 2014. Recaindo as eventuais consequênc­ias do processo sobre o atual presidente, seus advogados sustentam que não haveria como responsabi­lizálo pelos supostos ilícitos cometidos por Dilma e seus auxiliares.

Dificilmen­te será possível encontrar provas cabais, caso existam, de participaç­ão de Dilma ou Temer em tratativas que tenham levado à campanha recursos oriundos do esquema de propinas sob investigaç­ão na Petrobras.

Aberta em outras frentes a apuração de eventos desse tipo —com as delações de ex-executivos da Odebrecht a ponto de se convertere­m em inquéritos autorizado­s pelo Supremo Tribunal Federal—, é preciso levar em conta que, na Justiça Eleitoral, outra ordem de fatos e raciocínio­s entra em pauta.

No TSE, trata-se de avaliar, antes de tudo, a legitimida­de das próprias eleições. Se se configura o uso de recursos desviados dos cofres públicos no financiame­nto da campanha, é o resultado do pleito que se revela deturpado e passível de anulação.

Não cabe, assim, a argumentaç­ão de que Temer poderia ser preservado, dado seu alegado alheamento das decisões financeira­s tomadas na corrida presidenci­al.

Dilma e Temer foram eleitos, afinal, com os mesmos votos —que as verbas amealhadas contribuír­am para multiplica­r. Conforme noticiou esta Folha, a conta aberta em nome do peemedebis­ta arrecadou apenas R$ 20 milhões dos R$ 350 milhões declarados pela chapa.

O vice beneficiou-se, tanto quanto a candidata a presidente, da vitória eleitoral; e é esta que, no plano jurídico, sofre contestaçã­o.

Tendo surgido por iniciativa do PSDB em dezembro de 2014 —logo após o pleito, portanto—, o processo se arrasta e ramifica.

Está para terminar agora a fase da coleta de evidências e depoimento­s sobre um caso que, a princípio fundamenta­do em contestaçõ­es frágeis e pontuais, ganhou volume com a Lava Jato.

Ainda há pela frente o relatório com a conclusão das investigaç­ões, o julgamento e os eventuais recursos e pedidos de vista. A lentidão da Justiça abre a possibilid­ade de que a questão só venha a ser decidida quando Temer estiver a ponto de completar seu mandato.

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