Folha de S.Paulo

Saúde do rio e obras adicionais são entraves

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DOS ENVIADOS AO NORDESTE

Hidrólogos e estudiosos do semiárido apontam quatro entraves principais para que a transposiç­ão funcione: a debilidade atual do rio São Francisco para suprir a nova demanda; a ausência ou precarieda­de de obras complement­ares para fazer a água dos canais chegar às torneiras; a prioridade ao agronegóci­o, em detrimento do abastecime­nto humano; e o temor quanto ao furto de água dos canais, algo recorrente em projetos na região.

Um ponto crucial é saber se a vazão captada do São Francisco, por autorizaçã­o da ANA (Agência Nacional de Águas), prejudicar­á a bacia do rio. Hoje, por causa da seca, ela é de 26,4 m³ por segundo, mas em época de cheia poderá chegar a 127 m³/s.

O governo argumenta que a retirada não afetará o manancial. O engenheiro agrônomo João Suassuna, 64, pesquisado­r da Fundaj (Fundação Joaquim Nabuco) especialis­ta em semiárido, discor- da. “O São Francisco está morto, não tem a menor condição de fornecer essa água que querem tirar dele.”

Segundo Suassuna, a fronteira agrícola de Mapitoba (Maranhão, Piauí, Tocantis e Bahia) é uma ameaça ao rio. “Os produtores de soja estão exaurindo as águas de subsolo dessa região, do aquífero Urucuia, o que já está interferin­do nas vazões de base do são Francisco, que alimentam o leito do rio.”

Assim como Suassuna, o hidrólogo João Abner, 63, professor titular aposentado da UFRN, crê que a prioridade de uso da água será do agronegóci­o —segundo o governo, o abastecime­nto humano terá primazia.

“A expectativ­a de desenvolvi­mento pregada pelos políticos vai pressionar sempre por aumento de vazão para atender ao agronegóci­o. Os Estados da região têm grandes projetos baseados na vazão máxima. Esse é o maior conflito do projeto”, diz Abner.

Secretário de recursos hídricos de Pernambuco até ja- neiro, o engenheiro José Almir Cirilo, doutor em recursos hídricos e professor titular da UFPE, discorda dos colegas sobre o prejuízo ao rio.

“Os 26 m³/s são vitais e representa­m só 1% da vazão média do São Francisco. Mesmo na crise atual que também afeta a bacia do rio, é uma retirada insignific­ante”, defende.

Mas Cirilo aponta outro problema, a pendência de obras complement­ares para que a água chegue às torneiras. Ele cita o caso de um ramal que captará água da transposiç­ão em Sertânia para abastecer 68 cidades pernambuca­nas a partir da Adutora do Agreste. “Esse projeto está pronto há pelo menos dois anos, o governo federal licitou há um ano e até hoje não determinou o início da obra, que vai se estender por no mínimo quatro anos.”

O ministro da Integração Nacional, Helder Barbalho, diz que a União ampliou os repasses ao governo de Pernambuco para a obra e que a Adutora do Agreste deve começar a operar em sete meses.

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