ENTREVISTA Previdência vai precisar de nova reforma em 2019
PARA ESPECIALISTA EM CONTAS PÚBLICAS, HÁ ESPAÇO PARA NEGOCIAR ALGUMAS MUDANÇAS NA PROPOSTA DO GOVERNO, MAS REGRA DE TRANSIÇÃO JÁ É BRANDA E TERÁ QUE SER REVISTA
que pertença, que duvide que a aprovação do teto dos gastos públicos levou calmaria ao mercado financeiro nos últimos quatro ou cinco meses.
E, se o coração da reforma for derrubado, é muito difícil que essa calmaria continue. O mercado financeiro está comprando a ideia de que boa parte da reforma vai passar.
Se houver dúvidas disso, veremos uma mudança na trajetória dessas variáveis, na perspectiva muito clara de a inflação estar em torno de 4,5% em 12 meses já em meados do ano e, o que é mais importante, a perspectiva de os juros se reduzirem até 9% sem absolutamente nada de artificialismo, em contraste com o que houve em 2012 —e com vantagens inequívocas para 100% dos brasileiros.
Sobre os deputados, há um processo de construção da maioria, que leva seu tempo.
É importante que o grosso da batalha seja vencida, que não seja como no governo Fernando Henrique, em que, a cada etapa, a reforma sofria um processo de lipoaspiração que a transformou em um arremedo da proposta original. A atual tem gordura para sobreviver a uma lipoaspiração?
Tem menos, porque boa parte do otimismo do mercado financeiro está calcada na perspectiva de que 80% ou 90% da reforma passe.
Se o ponto de chegada for preservado, há três grandes questões para discussão: primeiro, a do regime dos militares e análogos. Seria melhor se já estivesse na mesa. Mas, pela analogia com os regimes estaduais, entendo a prudência do governo em evitar mexer num tema tão nevrálgico num momento de crise tão dramática como a dos Estados.
Será preciso encarar em algum momento, não é possível continuar indefinidamente com aposentadorias precoces de salários mais elevados etc.
A segunda questão é um conjunto de detalhes paramétricos que poderiam ser ligeiramente modificados sem afetar o todo. E o terceiro é a regra de transição. E o salário mínimo?
Podemos considerar um quarto ponto. Mas vamos falar antes da regra de transição.
Do jeito que a proposta foi enviada, pode haver diferenças substanciais nas regras para pessoas que façam aniversário de 45 anos, se mulheres, ou 50 anos, se homens, pouco antes ou depois de quando ela for aprovada.
A única forma de evitar o problema seria uma transição sem mudanças abruptas, mas isso implica espaço fiscal, que o país perdeu. Num país que passou a ter deficit da ordem de 8% ou 10% do PIB, o espaço fiscal ficou mais restrito. Qual seria o impacto de uma transição mais suave?
Sejamos francos: a proposta do governo é bastante benigna para as pessoas próximas de se aposentar.
Mesmo aprovando a reforma, conviveremos nos próximos anos com duas realidades que vão se chocar e gerar tensão para o governo de 2019: um teto rígido e uma despesa do INSS que talvez continue crescendo em termos absolutos, o que achata o espaço de Bolsa Família, investimento...
Já estamos na presença do que tenho denominado de canibalismo do gasto social.
Eu, como cidadão que mora no Rio de Janeiro, gostaria de ter mais segurança na rua. É uma função do Estado, ou do município, mas qual o espaço para o governo federal ajudar?
Zero. Por quê? Porque há quem se aposente aos 50 anos. Onde está a justiça social? É um Estado disfuncional, que beneficia pessoas específicas e prejudica a sociedade como um todo, por causa da má provisão de serviços importantes para o bem-estar. O principal vetor de crescimento do gasto previdenciário em relação ao PIB foi a regra de reajuste real do salário mínimo. Eliminar a vinculação não resolveria uma parte desse problema?
Não tenho dúvida de que a desvinculação é importante. Mas essa não é uma discussão madura na sociedade. O tema da reforma previdenciária, sim, está caindo de maduro.
Por outro lado, vamos avaliar objetivamente: não há ninguém que ache que vai aprovar 100% do que o governo mandou para o Congresso.
Alguma concessão vai ter que ser feita. O que este governo perde se retirar a desvinculação do salário mínimo com o BPC? Nada. Para 2018 e mesmo 2019, é um tema inócuo.
O próximo governo terá que suar a camisa. Há toda uma agenda vasta de reformas no país, e o próximo governo precisará dar continuidade a elas. Onde é possível mexer?
Um ponto é a regra dos 51% mais 1 ponto por ano para o cálculo do benefício, que gera a famosa crítica dos 49 anos.
Para mim, está claro que é um convite à negociação. Só espero que o país tenha cuidado para que os 51% não virem 60%, porque aí a conta já fica muito salgada.
Um número que faz sentido é 55%, porque quem entrar aos 20 anos pode se aposentar aos 65 com 100% do benefício.
Os outros se aposentarão com menos. Mas por que seria