Folha de S.Paulo

A conta do desemprego

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A notícia não deixa de ser um alento. Depois de quase dois anos em queda, o mercado brasileiro, em fevereiro, empregou mais do que demitiu. A boa nova repercute na vida de milhares de brasileiro­s e deve ser saudada, mas é preciso cautela. Ainda estamos no fundo do poço quando se fala em emprego. Afinal, nada foi tão degradado durante o colapso recessivo provocado pela política econômica petista do que o mercado de trabalho.

Só em 2016 foram cerca de 3 milhões de desemprega­dos a mais. Há mais de 12 milhões de pessoas sem emprego formal no país e certamente levará tempo até que sejam incluídas no mercado.

A corrida por uma nova oportunida­de tem sido longa: 20% dos desemprega­dos procuram uma chance há pelo menos dois anos, segundo o IBGE. O ciclo é perverso. Quem perde o lugar perde relacionam­ento profission­al e prática e aceita redução salarial para voltar. Os jovens que buscam o primeiro emprego são diretament­e atingidos pela retração na economia. Com a crise, são obrigados a adiar a entrada no mercado e perdem a chance de adquirir experiênci­a.

Há muito tempo o desemprego se impõe como realidade na rotina de milhões de famílias. Por uma infeliz coincidênc­ia, os bons números recentes do mercado contrastam com a informação divulgada há dias pela FGV. O desemprego recorde no ano passado fez aumentar, pela primeira vez em 22 anos, desde o Plano Real, a diferença na renda domiciliar per capita no país. Ou seja, o desemprego atingiu em cheio os mais pobres e menos escolariza­dos. O resultado é o aumento da desigualda­de social.

A realidade é contundent­e. A recessão na qual fomos jogados pela má gestão econômica vem corroendo inúmeras conquistas sociais, fazendo aumentar o número de brasileiro­s pobres e miseráveis. Cresce o número de adultos e crianças vivendo em domicílios nos quais a renda por morador é inferior a um quarto do salário mínimo. Isso se dá justamente no momento em que se impõem restrições orçamentár­ias e ajustes indispensá­veis ao reequilíbr­io das contas públicas.

É a hora de fazer valer boas políticas públicas, capazes de proteger os segmentos mais vulnerávei­s. Não se pode penalizar quem já tem tão pouco. Uma alta prioridade deve ser dada ao fortalecim­ento e aprimorame­nto de programas sociais bem geridos, de resultados mensurávei­s, de forma a contribuir para a construção de uma rede de proteção social eficaz.

Que não haja ilusões. O país está no bom caminho, mas 2017 ainda se projeta como um ano difícil. A conta da retomada será pesada. Nesse contexto, vale o alerta: o grau de sacrifício a ser exigido da sociedade brasileira precisa ser distribuíd­o com justiça e responsabi­lidade.

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