Folha de S.Paulo

Gêmeo de corintiano, Óscar Romero lutou contra xenofobia na Argentina

- ALEX SABINO

Tal qual o irmão gêmeo Ángel, que já reclamou do uso da expressão “paraguaio” como crítica, Óscar Romero, 24, se revolta com a xenofobia. Mesmo que venha da sua própria torcida.

Em partida da Libertador­es de 2016, o meia pediu aos torcedores do Racing, da Argentina, equipe em que jogava, que parassem com insultos contra bolivianos e paraguaios. O ataque era direcionad­o à torcida do Boca Juniors, mas atingiu Óscar, que se ofendeu.

O canto da torcida do Racing dizia que paraguaios e bolivianos só serviam “para serem explorados.”

“Não sou ninguém para mudar o povo. É uma torcida maravilhos­a a do Racing, mas sendo paraguaio não gostei de ser discrimina­do. Dói muito escutar algo contra o meu pais, olhei para a torcida e pedi para que parassem um pouco.”, disse após o jogo.

“Não gosto dessas coisas. Creio que me entenderam, tanto que a maioria do público do estádio ficou do meu lado”, relembra em entrevista à Folha menos de um ano depois.

A reação a situações de xenofobia e a aparência física não são as únicas semelhança­s dos irmãos que, pela seleção paraguaia, enfrentam o Brasil terça (28), no Itaquerão.

Quando chegou ao Corinthian­s, Ángel não ficava em São Paulo em muitas folgas que tinha. Corria para o aeroporto e pegava voo para Assunção ou Buenos Aires. Viajava mesmo que fosse para passar um dia e voltar a São Paulo. Tudo para estar algumas horas perto do irmão gêmeo Óscar.

Chamou a atenção de funcionári­os do clube a ligação entre os dois. Mais de uma vez Ángel disse sentir que o irmão não estava bem e, quando telefonou para se certificar, ele não estava mesmo.

Poderiam estar juntos no Corinthian­s se a diretoria tivesse cumprido a promessa de contratar a dupla.

“Quando ele [Ángel] viajou para o Brasil [em 2014], foi a primeira vez que nos separamos. O combinado era o Corinthian­s voltar para me contratar seis meses depois. Passou esse tempo e eles não vieram. Apareceu o Racing”, diz Óscar, hoje no Alavés (ESP). APENAS MULHERES Ángel e Óscar sempre tiveram apenas um ao outro como referência masculina na família. O pai os abandonou quando a mãe, Maria Lucia, estava grávida de sete meses. Viram-no apenas uma vez, quando tinham dez anos.

Os gêmeos foram criados apenas por mulheres. A mãe, a avó Dora e a tia Margarida. Foram elas que receberam todas as camisas das estreias dos irmãos por Cerro Porteño, Racing, Corinthian­s, seleção paraguaia e Alavés. Maria Lucia os sustentou trabalhand­o 12 horas por dia em empresa de cana de açúcar.

“Nós matamos a saudade um do outro conversand­o pelo celular. Nunca achamos que iríamos nos separar. Havia uma brincadeir­a de quando éramos crianças e dizíamos que o time que quisesse contratar um, teria de levar o outro”, completa Óscar.

Esta equipe poderia ter sido o Boca Juniors . Eles foram aprovados em teste no clube, mas como eram menores de idade, precisavam de autorizaçã­o dos responsáve­is legais. Por duas semanas tentaram localizar o pai. Não conseguira­m. Tiveram de irpara o Cerro Porteño (PAR).

Estrearam na equipe principal no espaço de uma semana. Primeiro Ángel, depois Óscar. Os colegas brincavam que onde se via um, estava sempre o outro. “Esperamos juntos disputar uma Copa do Mundo”, finaliza Óscar.

 ?? Norberto Duarte/AFP ?? Óscar Romero (à frente) em treino da seleção paraguaia
Norberto Duarte/AFP Óscar Romero (à frente) em treino da seleção paraguaia

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil