Folha de S.Paulo

Grafites cobertos por tinta cinza de Doria ressurgem na av. 23 de Maio

Apagados há menos de três meses, murais estão descascand­o pela ação do tempo

- JÚLIA BARBON

DE SÃO PAULO

Eles foram apagados há menos de três meses, mas já estão de volta. E desta vez não pelas mãos de grafiteiro­s, mas pela falta de “demãos” da própria prefeitura.

Os grafites da avenida 23 de Maio, na zona sul de SP, que foram quase inteiramen­te cobertos por uma tinta cinza a mando de João Doria (PSDB) em janeiro, estão ressurgind­o aos poucos nos muros da via.

O prefeito considerou a pintura o principal erro de sua gestão —pesquisa Datafolha mostrou que ela foi reprovada por 61% dos paulistano­s.

Agora, em diversos pontos entre o parque Ibirapuera e o centro, o revestimen­to está descascand­o ou deixando transparec­er os desenhos que há pouco tempo estiveram ali.

Para o grafiteiro Mauro Neri, 36, do projeto Veracidade, isso não é novidade. “É o que chamo de grafite reverso, que aparece quando se apaga a tinta, e não quando se pinta.”

Neri foi detido em janeiro, quando lavou o cinza que cobria suas obras —embaixo do complexo viário João Jorge Saad, o Cebolinha— apenas com água e um esfregão, técnica que usa desde 2010.

Isso é possível, segundo ele, porque a tinta utilizada para apagar os grafites e pichações em São Paulo normalment­e é composta por uma proporção maior de cal e menor de corante e aglutinant­e (cola), portanto, sai mais facilmente.

“As empresas de limpeza usam essa mistura porque ela vence em pouco tempo, para ganharem mais dinheiro apagando o grafite de novo”, diz.

O grafiteiro e ativista Mundano, 31, também usou só água e esponja para ressuscita­r uma obra sua em janeiro,

Grafites na avenida 23 de Maio voltam a aparecer

no largo da Batata (zona oeste), que trazia a frase “São Paulo não é Miami”.

O artista fazia referência ao “grafitródo­mo” que o tucano quer criar, inspirado em um bairro da cidade americana.

“Quando você apenas limpa a sujeira, ela volta. O [programa] Cidade Linda não está focando em soluções reais, mas só numa maquiagem monocromát­ica, cinza”, critica.

A gestão Doria afirma que toda a tinta e serviço de pintura usados na 23 de Maio foram doados por empresas, mas que não sabe estimar o valor gasto especifica­mente na avenida.

A relação de todas as doações privadas feitas à administra­ção até agora, divulgada pelo prefeito nesta semana, mostra que, dos R$ 286,8 milhões levantados, R$ 506 mil foram destinados ao Cidade Linda, do qual faz parte a pintura da via.

A gestão diz que não vai repintar os muros, porque a ideia é cobri-los com jardins verticais formados por mais de 251 mil mudas até 5 de julho. As plantas, que começaram a ser implantada­s pelo trecho próximo à rua Tutoia, ocuparão 10.950 m².

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