Folha de S.Paulo

Temer diz que vai cortar ponto de grevista

- PAULO SALDAÑA

DE BRASÍLIA

No dia em que serão realizados protestos contra as reformas governista­s, o presidente Michel Temer cortará o ponto de servidores públicos que faltarem ao trabalho para aderir à greve geral marcada para sexta-feira (28).

Para adotar a medida, a atual administra­ção tem se baseado em decisão de outubro do STF (Supremo Tribunal Federal), a qual estabelece­u que o poder público deve cortar os salários de servidores em paralisaçã­o.

O Palácio do Planalto tem lembrado que nesta sexta não haverá ponto facultativ­o, mesmo às vésperas do Dia do Trabalho, e que, portanto, o entendimen­to da Suprema Corte pode ser adotado.

A expectativ­a de assessores e auxiliares presidenci­ais é que a adesão de categorias de trabalhado­res ao protesto desta sexta seja maior que o da manifestaç­ão anterior, realizada em março.

O monitorame­nto das redes sociais, no entanto, tem apontado que a mobilizaçã­o tem se concentrad­o nos grandes centros urbanos, tendo pouca repercussã­o nos municípios de médio e pequeno portes. CENTRAIS Para reduzir o potencial das manifestaç­ões, aliados do presidente consideram buscar centrais sindicais mais próximas ao governo peemedebis­ta, como a Força Sindical e a UGT (União Geral dos Trabalhado­res).

As duas entidades, contudo, não têm demonstrad­o disposição em desistir das paralisaçõ­es.

O presidente avaliava viajar no dia da manifestaç­ão, mas decidiu permanecer em Brasília, onde acompanhar­á as mobilizaçõ­es. O receio é que o aumento do movimento eleve a pressão sobre a base aliada contra a reforma previdenci­ária, a principal bandeira política da atual gestão.

Nas últimas semanas, o Palácio do Planalto tem tentado blindar parlamenta­res governista­s que têm recebido queixas de sua bases eleitorais sobre as reformas previdenci­ária e trabalhist­a.

Com esse objetivo, além de aumentar a publicidad­e em veículos de comunicaçã­o, o presidente tem concedido uma bateria de entrevista­s, incluindo programas populares, como dos apresentad­ores José Luiz Datena, da Bandeirant­es, e de Carlos Roberto Massa, o Ratinho, do SBT.

Em campanha nacional, a gestão peemedebis­ta já gastou até agora R$ 29,5 milhões só com produção e veiculação de propaganda­s favoráveis às mudanças na aposentado­ria. (GUSTAVO URIBE)

DE SÃO PAULO

Após uma série de escolas privadas de São Paulo cancelarem as aulas desta sexta-feira (28) por causa da adesão de professore­s ao chamado de greve geral, um grupo de 14 alunos do colégio Santa Cruz, tradiciona­l instituiçã­o da zona oeste de São Paulo, divulgou carta defendendo a reforma da Previdênci­a.

A carta é endereçada aos professore­s da escola, que, ao expor a adesão à paralisaçã­o, haviam divulgado texto criticando as reformas do governo Michel Temer.

A carta foi divulgada pelas redes sociais. Nela, os estudantes dizem reconhecer “o direito à greve e à livre manifestaç­ão de ideias”, mas questionam o posicionam­ento contra a reforma.

Outras escolas tradiciona­is da capital paulista, como Palmares, Equipe e Lourenço Castanho, também cancelaram as aulas.

A decisão dos professore­s de escolas particular­es de cruzar os braços tem provocado um intenso debate entre alunos, pais e a direção das unidades.

A legitimida­de de esses profission­ais entrarem em greve tem sido questionad­a, mas a discussão expõe ainda mais as posições antagônica­s entre apoiadores e críticos das medidas.

Os professore­s do Santa Cruz, em seu texto, haviam defendido que as propostas, citando sobretudo a reforma trabalhist­a, podem “acentuar sistemas já excludente­s”.

Na resposta dos estudantes, eles dizem que “defender políticas públicas pautadas em ideais de ‘justiça’ e ‘defesa dos mais pobres’ é meio caminho andado para a irresponsa­bilidade fiscal”.

“[O rombo da Previdênci­a] impede tanto a estabilida­de fiscal como maiores investimen­tos em outros setores. Em um país em que, falando de Previdênci­a, estão postas duas opções, a reforma proposta pelo governo ou o sistema atual, defender a segunda opção é usar o discurso da defesa de direitos para, na realidade, defender privilégio­s.”

Procurada, a direção do Santa Cruz preferiu não se manifestar sobre a carta. ESTREMECER A RELAÇÃO Pai de dois alunos no Santa, o engenheiro Marcelo Schaeffer, 44, diz que o episódio vai “estremecer” a relação entre famílias e professore­s. “Podia ser mais discutido antes. E os professore­s são contra, mas não propõem.”

O clima em outros colégios também esquentou. O médico Carlos Eduardo Barsotti, 37, vai analisar se quer os filhos na escola Stance Dual (centro) depois que leu a carta dos docentes.

“Não se pode confundir Previdênci­a com assistênci­a. E a carta me incomodou porque mostrou um viés de esquerda da maioria dos professore­s, sem outras visões. Quero que meus filhos tenham outros pontos de vista”, diz Barsotti, que apoia as medidas de Temer.

A greve não produziu apenas descontent­es. A pedagoga Juliana Leodoro, 34, apoiou os professore­s da Nova Escola (zona sul), onde estudam suas duas filhas.

“A atitude mostra que os professore­s são cidadãos e que todos, inclusive os alunos, devem se manifestar quando entendem que seus direitos estão em risco”, diz.

“E, para quem acredita que isso seria um prejuízo, as aulas ainda serão repostas.”

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