Folha de S.Paulo

Para autor de PEC pró-diretas, é um erro retirar decisão do povo

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DE BRASÍLIA

Responsáve­l pela PEC (Proposta de Emenda à Constituiç­ão) que estabelece eleições diretas em caso de renúncia ou cassação do presidente da república, o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ) afirma entregar a escolha de um próximo presidente ao povo é a melhor solução para a atual crise política brasileira. Por que o sr. fez esta emenda?

O código eleitoral que alteramos em 2015 diz que quando houver causas eleitorais para a vacância, a eleição será direta a qualquer tempo. O procurador-geral da República arguiu a inconstitu­cionalidad­e deste artigo. Quando vi a arguição e vi o Supremo dar um ritmo especial para a tramitação desta Adin [ação de declaração de inconstitu­cionalidad­e], imaginei fazer a PEC.

O relator, Esperidião Amin (PP-SC), deu parecer favorável. Procurei o então presidente da Comissão de Constituiç­ão e Justiça, Osmar Serraglio (PMDB-PR), para que ele pautasse. Ele disse que não pautaria porque não achava oportuno. Logo depois, ele sai ministro da Justiça. E quem é o suplente dele? Rocha Loures (PMDB-PR) [um dos pivôs do atual escândalo]. As peças vão se encaixando. Por que em 1988 optou-se por colocar eleições indiretas na Constituiç­ão?

Havia preocupaçã­o com direitos individuai­s e acabava se repetindo a Constituiç­ão de 1946. Parecia razoável porque, por exemplo, a cédula era de papel.

A preparação da eleição demorava muito naquela época. Então manteve-se a mesma redação. Agora, isso não tem o menor sentido. Voltou-se a discussão de sua PEC nesta semana, antes de a crise estourar. Por quê?

Há algumas semanas, pessoas que se opunham à PEC começaram a refletir a respeito tendo em vista a proximidad­e do julgamento [da chapa Dilma-Temer] no Tribunal Superior Eleitoral e, de repente, ser reconhecid­a a inconstitu­cionalidad­e do artigo 320 do Código Eleitoral. Membros da Comissão de Justiça, por iniciativa própria, requereram que o presidente pautasse a PEC. O sr acredita que agora a votação é possível?

Depende do apoio social. Acredito que haverá manifestaç­ões a favor das [eleições] diretas. Já está se repetindo o grito das “Diretas já!”. As pessoas querem eleição direta, mas querem também que o Temer reconheça que perdeu as condições de continuar. No caso de ele renunciar, a solução não pode ser uma eleição indireta. Qual o risco disso?

As duas Casas do Legislativ­o eram legítimas para fazer o impeachmen­t da Dilma. Não é essa a discussão.

E não há como prever se vai ser algo muito bom ou muito ruim. A questão é que o poder de eleger é do povo. Temos essa delegação do poder originário da Constituin­te para, nesta hipótese dos dois últimos anos, dar o voto para um candidato.

Diante de tudo o que assistimos, não sei se o processo indireto não acabaria mais viciado do que foi o processo direto de 2014. Acho que é um risco menor se entregar ao povo a deliberaçã­o. O povo pode acertar ou errar —se estiver bem informado, acerta. Tem algo errada no sistema brasileiro. Não imagino que alguma correção surgirá da retirada do povo do processo, é o contrário. (DC)

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