Troca-troca
No futebol, as mudanças cada vez mais dinâmicas ainda não são assimiladas pelos torcedores
“AQUI NÃO te amamos, morra Neymar”, foi uma das frases repetidas por parte da torcida durante o amistoso entre a Chapecoense e o Barcelona, nesta semana. Atitude bastante antidesportiva que quebrou um pouco o clima da confraternização do jogo e totalmente equivocada diante da ocasião.
Não dá para desejar a morte de uma pessoa nunca. Jamais a de um jogador justamente na homenagem feita a dezenas de outros que morreram de forma trágica. Mas os torcedores do Barça não parecem dispostos a perdoar a saída do atacante, que ainda foi chamado de “puta do PSG”.
Nesse episódio sobrou até para o jornalista que cravou a transferência do jogador para o time francês. Marcelo Bechler, do Esporte Interativo, recebeu ameaças e precisou fechar seus perfis nas redes sociais por causa do assédio negativo.
Neymar caiu em desgraça na Espanha, não apenas entre os torcedores, mas também entre os jornalistas, e será julgado porque resolveu que era hora de mudar. Foi chamado de vendido e mercenário. Em Barcelona, cartazes com sua foto, traziam estampada a frase “se busca traidor”, com cifrões ao lado.
A explicação para tanta revolta, dizem, é porque o contrato tinha sido renovado até 2021 e também porque o jogador não convocou a torcida para fazer um anúncio formal e uma despedida. Parece que sobra paixão pelo time e falta habilidade para lidar com o fato de que cada vez menos os clubes terão ídolos que permaneçam lá durante o tempo que suas carreiras durarem.
Isso não é uma novidade no mercado de trabalho, onde cada vez mais os profissionais ficam menos tempo na mesma empresa e estão sempre à procura de novos desafios, que envolvam mais dinheiro ou apenas satisfação pessoal. É uma tendência do século 21. No futebol, as mudanças cada vez mais dinâmicas, talvez ainda não tenham sido assimiladas, pelo menos em relação aos jogadores.
O troca-troca entre os treinadores é até exagerado. No Brasil a média de permanência no mesmo emprego é de cinco meses. Na Alemanha, um ano e dois meses. Dá para ver a diferença no resultado. Mas esse é outro assunto.
“Eu queria algo novo, diferente”, disse Neymar. Não deveria ser difícil entender essa necessidade vinda de alguém com 25 anos. As pessoas, no entanto, preferem achar que a decisão foi movida a dinheiro. Bobagem. Certamente não é o cerne da questão, mas ser remunerado à altura de sua excelência não deveria ser pecado. É bom lembrar que Neymar deixou o Santos a caminho do time espanhol por mais dinheiro e, claro, por mais desafios na carreira.
Craques de várias gerações serão eternamente lembrados pelos clubes onde se tornaram ídolos. Impossível desassociar a imagem de Nilton Santos do Botafogo, de Zico do Flamengo, de Rogério Ceni do São Paulo, de Sócrates do Corinthians. O futebol mundial também tem inúmeros exemplos. Steven Gerrard no Liverpool, Paolo Maldini no Milan e Totti na Roma. Alguns jamais vestiram a camisa de outro time e ficarão para a história também por sua lealdade.
Neymar deu adeus ao Barcelona, virou a página da história e vai escrever outros capítulos memoráveis. Daqui a pouco passa a raiva e os fãs do esporte devem voltar a focar no que importa, no futebol de qualidade do craque, que pretende ser o melhor do mundo. Se a chance estiver no PSG, não tem dinheiro que pague.