A realidade de governar
Culpar o governo Temer por querer cumprir seu dever de governar, rendendo-se à dispersão partidária, é viver na irresponsabilidade política
As armas da comunicação política não são os longos enredos lógicos produzidos pela razão. São as palavras fortes, as que dizem, com o mínimo, o bastante para o diálogo ou a discussão. Sem tempo para explicações ou para nuances. Tudo o que é preciso saber é servido em pílulas, cujo conteúdo mágico se dissolve fora da nossa vista.
Bom exemplo disso é o que se dá hoje a respeito da natureza do governo presidencial. Há quem pense que bons governos devem ter maiorias próprias; outros se satisfazem com maiorias conquistadas por coalizão entre partidos diferentes, e quase todos, por fim, condenam as maiorias formadas pela chamada cooptação. Cada um desses regimes envolve causas, processos e consequências complexos, mas nunca há tempo suficiente para investigá-los. O que interessa são as palavras: maioria, coalizão e cooptação.
Governos com maiorias próprias e estáveis tornam mais fácil a tarefa de governar e dão ao governante maior liberdade para aplicar suas políticas, sem submetê-las a compromissos desfiguradores. Em compensação, são mais indiferentes aos desejos instáveis da opinião pública, pelo menos nos primeiros tempos dos mandatos.
Quem escolhe dar maioria aos governos é o eleitor, mas é o sistema eleitoral vigente que viabiliza essa escolha. Se o voto parlamentar é o distrital simples, majoritário, é mais provável a formação de maioria. Se o sistema é o proporcional puro, é quase impossível. Governos parlamentaristas só são possíveis, na prática, com o sistema distrital, ou pelo menos, com o distrital misto.
Onde há fragmentação partidária, maiorias só podem ser obtidas por coalizão de partidos. As moedas do compromisso e das alianças nem sempre são abertas e mostradas ao grande público, mas o governo exibe sempre uma postura protocolar de grandeza e de dignidade, o que às vezes retrata a realidade, mas nem sempre.
Quando a fragmentação partidária passa dos limites razoáveis, como entre nós, onde a Câmara tem quase 30 partidos, e quando alguns são pequenas organizações ou grupos de deputados sem laços orgânicos ou visões compartilhadas, não se fala mais de coalizão, mas de cooptação, que é uma palavra à qual se deu forte sentido pejorativo.
Do Olimpo dos analistas políticos, quer na academia, quer na imprensa, disparam-se flechas enve- nenadas contra o governo Temer. É um governo de cooptação e, por isso, deve ser atacado, não importa o que faça e os seus resultados.
É justa a acusação? Winston Churchill (ex-primeiro-ministro britânico) disse uma vez que a primeira tarefa de um governo é governar, e, como sempre, ele estava certo. Para isso ser possível, é imprescindível contar com maioria parlamentar. Só pode pertencer à maioria quem tem mandato e foi escolhido em eleições livres, segundo as regras definidas pela Constituição. Pode-se até dizer que no Brasil de 30 partidos não é o governo que escolhe sua maioria, mas é a maioria que escolhe seu governo.
A discussão moral sobre a qualidade da maioria ou a natureza da sua formação —coalizão ou cooptação— é um bom caminho para se refugiar da realidade e de suas consequências. E culpar o governo por querer cumprir o dever de governar, reco- nhecendo a legitimidade do Parlamento e se rendendo à dispersão partidária, é viver no terreno perigoso da fantasia e da irresponsabilidade política. Ou será que, no fundo, o que desejam mesmo é que o governo não governe nem reforme o país?
É óbvio que o sistema político que temos não é criação deste governo. É resultado de nossa história política, de nossa Constituição, de decisões da Justiça, inclusive da Corte Suprema, e de sucessivas legislaturas. É com ele que se governa, ou não se governa!
A quem olha para o futuro em busca de milagres, é bom se prevenir: com as regras que temos sobre partidos e eleições, o próximo governo, qualquer que seja, terá de fazer o chamado governo de cooptação. Ou não vai governar! Por isso, poucos têm a ousadia de pensar que, mais importante que as próximas eleições, seria uma reflexão mais séria sobre um sistema que deixou de ser funcional e precisa de ser reformado. E, quem sabe, não perder mais uma vez esta oportunidade. MOREIRA FRANCO,
Perguntar não ofende. A banca de advogados que negociou e depois empregou o doutor Miller não tem nenhuma culpa no cartório? Não tem responsabilidade? Não infringiu nenhuma lei? Não há dúvida ética? Nada, nada? Com a palavra a OAB e o Ministério Público (“Miller ajudou JBS antes de deixar MPF, sugerem e-mails”, “Poder”, 12/9).
FLÁVIO FONSECA
Michel Temer agora fala em ruptura do Estado de Direito porque se vê envolvido em ações ilegais. Mas, ao apoiar o golpe contra a presidente Dilma Rousseff, não se manifestou dessa forma. Cobiçava o poder a qualquer preço, mas quem com ferro fere com ferro será ferido. Agora, prova de seu próprio fel.
VILMA AMARO
Temer não precisa mais ficar com inveja de Lula. Agora, ele também tem o seu PowerPoint (“Flechas da PF apontam para Temer em gráfico do ‘quadrilhão’ do PMDB”, folha.com/no1917721).
JORGE A. NURKIN
Malas de dinheiro Pelas normas do Banco Central, os bancos são obrigados a informar à Receita Federal a realização de qualquer operação acima de R$ 2.000 e ao Coaf as acima de R$ 10 mil. Essas normas visam coibir os crimes financeiros e, com certeza, são aplicadas com todo o rigor sobre os simples mortais como nós. Além disso, há uma norma específica sobre operações realizadas por “pessoas politicamente expostas”, como ministros, senadores, deputados etc. Com todo esse cuidado, é de se perguntar de onde saíram os R$ 51 milhões da Bahia.
FERNANDO PACINI,
Cargos públicos
Não aprecio esse tipo de arte, então não iria à exposição, mas penso que o MBL não possui qualificação para incentivar a censura. Antes de mais nada, penso que a liberdade de expressão deve ser preservada. Se constatarem alguma prática criminosa, que processem o curador. Simples assim.
ROBERTO J. F. MOREIRA JR
Foro privilegiado O foro privilegiado é uma praga, porque demonstra que nem todos são iguais perante a lei. Para mim, pode ser o presidente da República. Se transgrediu a lei, precisa ser responsabilizado criminalmente, e em primeira instância. Assim, o país caminha para a frente.
DIOGO MOLINA GOIS
Drogas Depois de ler a reportagem “Polícia de SP ganha aval para dizer que droga ‘não é droga’” (“Cotidiano”, 12/9) cheguei à conclusão de que o Estado de São Paulo é igual à Turquia e à Rússia: tem governantes que mandam feito ditadores e fazem de tudo para se perpetuarem no poder. No caso de São Paulo, desde 1995.
MARCELO CIOTI
Absurda e irresponsável a decisão da Polícia Cientifica de São Paulo. Não bastassem os milhares de jovens e seus familiares que sofrem com a ausência de políticas públicas de saúde eficazes para dependentes de drogas e álcool, um órgão público quer justificar o injustificável, alegando “falta de padrão de confronto” para materiais periciados. É um desrespeito à nação.
JONAS NILSON DA MATTA
Colunistas Nunca li nada mais verdadeiro no jornal do que a conclusão de Hélio Schwartsman em “Lula, o Maluf da esquerda” (“Opinião”, 12/9). Parabéns, Hélio!
ZEEV CALMANOVICI