Folha de S.Paulo

‹ Dissimulad­o é Lula, diz defesa de ex-ministro

- ANA LUIZA ALBUQUERQU­E CATIA SEABRA ENVIADAS ESPECIAIS A CURITIBA ESTELITA HASS CARAZZAI

DE CURITIBA

Em seu segundo depoimento ao juiz Sergio Moro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou o ex-ministro Antonio Palocci de “calculista, frio e simulador” e negou que tenha feito qualquer tipo de acerto ilícito com a empreiteir­a Odebrecht.

“É a peça de ficção mais hilariante que eu vi”, disse.

O ex-presidente depôs por duas horas nesta quarta (13), uma semana depois que seu ex-ministro da Fazenda afirmou que ele avalizou um “pacto de sangue” com a Odebrecht, com o pagamento de R$ 300 milhões em vantagens indevidas em troca de manter o protagonis­mo da empreiteir­a no governo.

O petista falou em “desfaçatez” do antigo correligio­nário e disse: “Eu vi o Palocci mentir aqui essa semana”.

Nessa ação, Lula é acusado de se beneficiar de vantagens indevidas pagas pela empreiteir­a Odebrecht —incluindo a compra de um terreno que seria destinado ao Instituto Lula e cuja negociação teria sido intermedia­da por Palocci. O ex-ministro também é réu na ação e negocia delação premiada.

“Foi um conjunto de simulações que o Palocci fez, por isso que usei a palavra simulador, tudo com o objetivo de duas coisas: diminuir a pena dele, ganhar os benefícios da delação, e quem sabe ficar com um pouco dos recursos que foram bloqueados.”

Lula disse que o ex-ministro nem sequer era responsáve­l por assuntos do instituto e que só o encontrava, depois de sua saída do governo, esporadica­mente. O petista afirmou não ter raiva de Palocci e disse que “ele tem o direito de querer ser livre”.

“Se você não quer assumir a tua responsabi­lidade pelos atos ilícitos que você fez, não jogue em cima dos outros.” REUNIÃO Na audiência, o Ministério Público apresentou a Lula uma pauta de reunião de Emílio Odebrecht, patriarca da empreiteir­a, com Lula, que foi entregue à investigaç­ão.

A reunião ocorreu no dia 30 de dezembro de 2010, fim do governo Lula, no Palácio do Planalto.

O primeiro item da pauta é “‘Passagem’ do histórico de foi o valor que a Odebrecht desembolso­u com as duas operações, segundo a acusação. O apartament­o custou R$ 504 mil Marcelo Odebrecht Em depoimento na semana passada, o empreiteir­o reiterou que Lula sabia da existência de uma conta de propina da empresa a seu favor e que a empresa bancava gastos do ex-presidente Palocci Afirmou que Lula fez um “pacto de sangue” com a Odebrecht ao fim do seu governo. Afirmou que a empreiteir­a disponibil­izou R$ 300 milhões em propina, sendo parte para o petista Defesa de Lula Vem negando as acusações. Diz que o instituto nunca funcionou no terreno mencionado e que Palocci faz acusações apenas para conseguir firmar um acordo para sair da cadeia TRÂMITE O caso tramita desde o fim de 2016 Já falaram testemunha­s indicadas pela acusação e defesa Os réus estão sendo ouvidos Ainda falta depor um dos réus, Roberto Teixeira, advogado de Lula que teve depoimento adiado para o dia 19 Após a fase de audiências, as partes vão apresentar suas alegações finais Moro expede a sentença Não há prazo definido para a sentença. No caso do tríplex de Guarujá, a decisão do juiz saiu dois meses depois do depoimento de Lula

DE CURITIBA

O advogado do ex-ministro Antonio Palocci, Adriano Bretas, rebateu as afirmações do ex-presidente Lula sobre seu cliente e afirmou que “dissimulad­o é ele [Lula], que nega tudo o que lhe

ações penais já foram abertas contra o ex-presidente no Paraná e no DF

denúncias foram oferecidas contra Lula desde a semana passada. A Justiça ainda vai decidir se abre processos contraria”.

“Enquanto o Palocci mantinha o silêncio, ele era inteligent­e e virtuoso; depois que resolveu falar a verdade, passou a ser tido como calculista e dissimulad­o”, afirmou o defensor.

A defesa manteve o teor do depoimento de Palocci, dado na semana passada, e acusou Lula de se esquivar dos fatos e “ter a pachorra” de dizer que se encontrava pouco com o ex-ministro.

Lula ainda aproveitou o depoimento para fazer duras críticas ao Ministério Público Federal, acusando-o de promover uma “caça às bruxas”.

“O que menos preocupa vocês agora é prova”, disse.

Para ele, a Lava Jato ficou “refém da imprensa”. “Estamos vendo o que está acontecend­o com o [Rodrigo] Janot”, disse, se referindo ao procurador-geral da República.

Lula afirmou que o Ministério Público “da Lava Jato” enveredou por um caminho para incriminá-lo e que “contaram uma grande mentira com PowerPoint”.

Houve momentos de tensão entre o ex-presidente e Moro. Lula chegou a acusar o juiz de ser desrespeit­oso, e o magistrado pediu por pelo menos duas vezes que ele “não fizesse campanha ou discurso” e se ativesse à ação.

Ao final da audiência, o petista fez uma pergunta a Moro: se ele poderia dizer aos netos que foi prestar depoimento a um juiz imparcial. Ele respondeu que sim, ao que Lula retrucou: “Porque não foi o procedimen­to na outra ação”.

Em certo momento, Moro afirmou que Lula “talvez estivesse um pouco rancoroso”.

Lula responde: “Eu fico preocupado quando as pessoas inventam uma história e tentam a cada momento transforma­r aquela inverdade em verdade”.

Em julho, dois meses após prestar o primeiro depoimento a Moro, Lula foi condenado a nove anos e seis meses de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro em outro caso —ele é acusado de receber propina da empreiteir­a OAS com a cessão e reforma de um tríplex em Guarujá (SP).

Para o advogado Cristiano Zanin Martins, que defende o ex-presidente, a Lava Jato “não busca a verdade”.

Zanin afirmou que a base do caso atual envolve oito contratos firmados pela Petrobras e que Moro e os procurador­es não fizeram qualquer pergunta sobre isso.

Para ele, não há prova de que qualquer valor oriundo de contratos da estatal tenha sido dirigido ao ex-presidente, direta ou indiretame­nte.

FELIPE BÄCHTOLD MARIO CESAR CARVALHO, CAROLINA LINHARES, JOÃO PEDRO PITOMBO,

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