Justiça derruba ‘lista negra’ de pichador em lei de Doria
TJ também barrou patrocínio em muro, mas manteve multa contra infratores
Rigor contra pichação foi bandeira de tucano, que não vai recorrer de decisão por avaliar que ela não prejudica a lei
A Justiça de São Paulo derrubou dois artigos da lei antipichação encampada pelo prefeito João Doria (PSDB) como uma das prioridades de seu começo de mandato.
A criação de uma “lista negra” para pichadores e a reparação de muros por empresas em troca de propaganda foram consideradas inconstitucionais pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça em julgamento nesta quarta (13).
O restante da lei, em vigor desde fevereiro e que também prevê multa de até R$ 10 mil aos infratores, foi mantido.
A prefeitura diz que não vai recorrer da decisão. O PSOL, responsável pela ação judicial, entrará com recurso para que a lei inteira seja considerada inconstitucional.
As regras mais duras contra os pichadores foram articuladas por Doria na Câmara Municipal —que desenterrou um antigo projeto.
O prefeito sancionou a nova lei em meio à “guerra do spray” —como ficou conhecida a disputa da gestão com pichadores e grafiteiros, que reagiram à ofensiva do tucano com protestos em muros.
Um dos artigos barrados pela Justiça estabelecia uma “lista negra” de pessoas flagradas pichando e a proibição de elas serem contratadas no futuro para cargos municipais.
Outro permitia que empresas privadas arcassem com a pintura de muros pichados recebendo propaganda em troca —uma placa no local identificando quem patrocinou determinado restauro.
O desembargador relator do processo, José Henrique Arantes Theodoro, considerou essas duas medidas inconstitucionais e teve seu voto seguido pelos demais 22 desembargadores presentes.
As ONGs Pastoral Carcerária, Artigo 19 e ITTC (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania) emitiram nota conjunta em que afirmam que a proibição de contratação dos infratores pelo município significava uma “pena perpétua claramente inconstitucional”.
Sobre a criação de cadastro das pessoas identificadas como pichadoras, elas afirmaram que a medida “viola o direito à privacidade”.
As entidades contestam outros artigos da lei, como multas que consideram “desproporcionais” —R$ 5.000 para os infratores e R$ 10 mil se a pichação for em monumento tombado, valores que dobram em caso de reincidência.
A lei também determina que estabelecimentos não vendam sprays para menores de 18 anos e que mantenham notas fiscais com a identificação dos compradores. 23 DE MAIO Em meio ao discurso duro contra pichadores, Doria chegou a apagar grafites do corredor 23 de Maio. Alvo de críticas, disse depois ter avalia- do mal a ação, por ter sido à revelia dos grafiteiros, e anunciou museus a céu aberto para esses artistas.
Pesquisa Datafolha de fevereiro mostrou que 97% dos paulistanos eram contra as pichações, mas 85% favoráveis aos grafites. Para 61%, porém, elevar a punição não acabaria com a atividade.
A lei sancionada por Doria permite grafites, mas apenas sob autorização —para grafiteiros, a essência desse tipo de obra é a liberdade de ação, sem que tenham aval prévio.
O texto da lei diferencia grafite de pichação, mas não esclarece como a distinção entre as duas coisas deve ocorrer na hora do flagrante.
A gestão Doria diz que não vai recorrer da derrubada de dois artigos pela Justiça por considerar que eles não interferem na aplicação da lei.
“O Tribunal de Justiça reconhece a validade e a relevância da Lei Cidade Linda (...) contra os pichadores”, disse nota da prefeitura, em referência à manutenção dos demais artigos e ao nome do projeto de zeladoria de Doria, que inclui as ações antipichação.