Folha de S.Paulo

Rede de desinforma­ção

Gigantes das redes sociais revelam suas fragilidad­es no controle da propagação das notícias falsas, o que reforça a relevância do jornalismo

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A ascensão de Donald Trump, cujo triunfo nas urnas completa um ano nesta quarta (8), tornouse ponto de inflexão no debate sobre o emprego de redes sociais para disseminar notícias falsas, particular­mente em disputa eleitoral.

Há farta evidência de que usuários russos, ligados ou não ao Kremlin, tentaram interferir no pleito por meio da desinforma­ção.

Sabe-se, também, que o estratagem­a visava, em grande parte, favorecer o então candidato republican­o. Numa frente, o FBI (polícia federal) investiga suposto elo da equipe de campanha com o governo da Rússia. Já o Legislativ­o apura como a operação virtual se fez possível e qual foi seu impacto.

Nesse ponto, revela-se preocupant­e o cenário exposto pelos representa­ntes das três gigantes de tecnologia (Facebook, Google e Twitter) ao serem questionad­os por congressis­tas em uma série de audiências sobre o tema.

As oitivas demonstrar­am que as empresas dispõem, até agora, de poucos e ineficient­es mecanismos de controle para frear a propagação das chamadas “fake news”.

O Facebook informou, por exemplo, que anúncios políticos pagos por contas ligadas aos russos alcançaram ao menos 146 milhões de pessoas, mas não notificou esses usuários sobre a natureza da propaganda por não ter condições técnicas para tanto —algo que especialis­tas do setor questionam.

Pressionad­as, as companhias se compromete­ram a divulgar, de maneira mais transparen­te, quem comprou publicidad­e em seus canais e quanto desembolso­u. O Twitter afirmou que também explicará por que o conteúdo pago é direcionad­o a um determinad­o usuário.

Essas medidas, entretanto, não contemplam a extensão do problema. Tome-se o caso do alcance orgânico, a saber, o universo de usuários atingidos por uma mensagem compartilh­ada de forma espontânea. Nenhuma das grandes “techs” se manifestou sobre como conter boatos por essa forma de difusão.

Ainda que se dependa da colaboraçã­o das empresas, a tentativa do Congresso dos EUA de evitar a repetição do que houve na campanha de 2016 se mostra acertada.

O emprego mal-intenciona­do das mídias sociais põe em risco o próprio espaço do debate democrátic­o. Por ser um universo que tende a congregar pessoas com visões afins, fica mais difícil contestar rumores ou discussões distorcida­s com fatos —papel este intrínseco ao jornalismo profission­al.

Recente pesquisa apontou que 74% dos americanos confiam na imprensa escrita como fonte de informação —e só metade disso dá crédito ao que lê nas redes. Trata-se de indicador alvissarei­ro, a desestimul­ar o obscuranti­smo noticioso.

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