Folha de S.Paulo

RAIO-X

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Hoje você já está acostumada à atenção, mas, no início, como se sentia sendo observada, do mesmo modo que você observava os chimpanzés?

Jane Goodall – Eu sabia que a“Geographic”tinhamanda­do Hugo para captar as imagens que pudesse dos chimpanzés, mas também para me documentar. Não estava muito contente com isso, mas sabia que precisávam­os dessas imagens —e eu precisava do financiame­nto da “Geographic”. Assim, se Hugo quisesse me filmar lavando o cabelo, que assim fosse. No final, essa foi uma das cenas favoritas do filme. A composição das imagens é belíssima. Houve momentos em que Hugo lhe pediu “vá um pouco mais à direita”?

Sim, foi um pesadelo. Eu tinha que comer a mesma coisa cinco vezes, tinha que refazer tudo. Por sorte, um dos primeiros empregos que tive foi em um estúdio em Londres, fazendo coisas para comerciais, e aprendi muitas coisas úteis. Por isso, quando os cineastas dizem “estava perfeito, podemos fazer de novo?”, eu sei o porquê, sendo que a maioria dos cientistas se irrita tremendame­nte. Como foi assistir ao filme, sobretudo o início de seu romance com Hugo e depois a dissolução do casamento de vocês?

Eu não havia imaginado que pudesse haver algo de novo naquelas imagens. Tantos documentár­ios já foram feitos sobre mim.

Quando vi o filme, ele me levou de volta à pessoa que eu era naquela época, de maneira diferente. Adorei assistir à aproximaçã­o crescente entre Hugo e eu em Gombe, a felicidade de nosso casamento e do nascimento de nosso filho. E foi reconforta­nte perceber, olhando em retrospect­iva, que o fim de nosso casamento foi de certo modo inevitável. Você sempre sonhou em ir à África para estudar animais, mas inicialmen­te não tinha estudos formais nem formação científica. Em algum momento você temeu não estar à altura da tarefa?

Nunca.Quandoosch­impanzés estavam fugindo, morri de medo que as verbas acabassem. Eu sabia que, se pudesse ficar lá pelo tempo suficiente, daria certo. Sou uma pessoa obstinada; para mim, desafios existem para ser superados. Era quase impensável que uma mulher jovem fizesse esse trabalho, mas você nunca encarou isso como obstáculo.

Não fui criada assim. As mulheres não eram cientistas [naquela época]. Olhando em retrospect­iva, ser mulher na

NOME E NASCIMENTO

Valeria Jane MorrisGood­all nasceu em 3 deabrilde1­934

FORMAÇÃO

Doutorado em etologia (comportame­nto animal) pela Universida­de de Cambridge, no Reino Unido

TRAJETÓRIA

Pesquisa sobre comportame­nto de chimpanzés na Tanzânia revela uso de ferramenta­s e diferentes personalid­ades

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