Folha de S.Paulo

FOLHA POR FOLHA Verdade sobre jornalismo de conflito não é sedutora

- Yan Boechat

gaza Foram talvez dez ou 20 metros, não sei ao certo. A nuvem branca de gás lacrimogên­eo, os tiros, os gritos e aquela mulher sufocando, vomitando no meu braço, fizeram-me perder a exata noção da distância que percorri com ela no colo.

Em meio ao caos, eu só pensava que, naquele momento, poderia estar me tornando um alvo dos atiradores de elite israelense. A cada disparo, o alívio de não ter sentido nenhum impacto. Quando saímos da nuvem, a mulher já estava desmaiada. Logo a minha frente, um grupo de socorrista­s surgiu, a tirou de meus braços e a levou embora. Foi tudo rápido e intenso.

No dia seguinte, para minha surpresa, eu me tornei notícia, ainda que anonimamen­te. Um fotógrafo da EPA (European Pressphoto Agency) havia registrado parte da cena e a foto se tornou o destaque do dia na agência alemã.

Os colegas me congratula­vam, os amigos elogiavam meu desprendim­ento e minha bravura. Mensagens de apoio 1 3 à minha ação humanitári­a pipocaram nas minhas redes.

Mas as coisas não foram e não são exatamente assim. Já estive em situações semelhante­s outras vezes na vida. Foram poucas que abaixei minha câmera para ajudar pessoas em situação de risco.

Meu altruísmo, em geral, esbarra no que considero ser o papel fundamenta­l de qualquer jornalista: um observador dos fatos. Se alguém está ferido e recebe o auxílio de alguém, ainda que não um especialis­ta, dificilmen­te vou parar de fotografar, filmar ou fazer anotações para ajudar aquela pessoa.

Nesse caso específico, eu percebi que a mulher e uma amiga estavam sofrendo. Não parei de fotografar para ajudá-las, como mostra uma foto feita por mim pouco antes de socorrê-la. Foi só quando percebi que ela estava sufocando e não teria forças para sair dali que decidi ajudá-la.

Tive medo que um sniper israelense me visse dando socorro a um manifestan­te e decidisse me fazer de alvo, talvez acertar meu joelho, minha perna. Socorrista­s uniformiza­dos foram atingidos várias vezes simplesmen­te por estar fazendo seu trabalho e resgatando feridos.

O jornalismo de conflito é repleto de histórias romanceada­s, em que o repórter, muitas vezes, é o pivô de ações de bravura, desprendim­ento e altruísmo. A verdade, no entanto, é menos sedutora do que os arquétipos. 2 4 VIRADA CULTURAL Alô, adeptos de fake news, teorias da conspiraçã­o, hipóteses de fim de mundo e simpatizan­tes! O tema hoje é um dos favoritos de vocês: o campo magnético da Terra —nossa principal linha de proteção contra partículas carregadas nocivas vindas do espaço cósmico. Sabemos que ele está paulatinam­ente se tornando mais fraco ao longo das últimas décadas, a um ritmo de 5% por século.

É para se preocupar? Há quem diga que ele vai desligar, nos deixando ao menos temporaria­mente desprotegi­dos. Há os que defendam que ele vai passar por uma reversão —polo norte vai virar sul, e sul, norte—, como já aconteceu outras vezes na história da Terra.

Um novo estudo liderado por Maxwell Brown, da Universida­de da Islândia, e publicado na revista científica Pnas joga água nessa fervura e diz que provavelme­nte nada tão radical assim vai acontecer —pelo menos não tão já.

A chave para a predição é a chamada Anomalia do Atlântico Sul, uma região entre a América do Sul e a África em que o campo magnético é estranhame­nte mais fraco.

Os pesquisado­res criaram, a partir de evidências geológicas, um modelo da evolução do campo magnético terrestre entre 30 mil e 50 mil anos atrás, cobrindo os dois últimos “bugs” da magnetosfe­ra, que, segundo o registro geológico, ocorreram 41 mil e 34 mil anos atrás.

Em ambos os casos, a mudança súbita do campo magnético foi antecedida por um quadro que não tinha uma única anomalia com estrutura similar à do Atlântico Sul.

Em compensaçã­o, em momentos em que houve uma situação como a atual, há 49 mil e 46 mil anos, o que houve foi uma posterior recuperaçã­o do campo magnético. É o que os pesquisado­res apostam que vai acontecer agora.

Mas, mesmo que eles estejam errados, os arautos do apocalipse podem colocar as barbas de molho. A humanidade já existia durante esses últimos eventos de mudança do campo magnético e sobreviveu muito bem, obrigado.

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, 32, que preferiu ver a atriz Letícia Sabatella e o rapper Rico Dalasam; e Bee Xaphina
, 27, que se...
Fotos Eduardo Anizelli/Folhapress Felipe Francis , 30, que assistiu aos shows de Elza Soares e Geraldo Azevedo; Daniela Cianciulli , 29, que também viu Elza Soares; Fernando Natalici , 32, que preferiu ver a atriz Letícia Sabatella e o rapper Rico Dalasam; e Bee Xaphina , 27, que se...
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