Folha de S.Paulo

Sim Fazer mais com menos

Custo de manutenção é uma despesa que pode ser reduzida

- Roberto Luis Troster Doutor em economia e consultor, ex-economista-chefe da Febraban (Federação Brasileira de Bancos)

Uma análise custo-benefício da política cambial aponta que ela pode ser atualizada com ganhos de bem-estar ao país. Sua execução é orientada por dois objetivos: prevenir e mitigar choques externos e arrefecer a volatilida­de dos preços das divisas.

Para tanto, o Banco Central segue estratégia com dois elementos: mantém o volume de reservas num patamar estável de US$ 380 bilhões e atua no mercado futuro quando considera oportuno, liquidando as operações em reais sem sacrificar divisas. Os méritos são discutívei­s.

Apesar do volume elevado, a defesa para um choque externo é parcial, como o é em quase todos os países. As aplicações de investidor­es estrangeir­os em carteiras adicionada­s das operações intercompa­nhias superam em 90% as reservas brasileira­s. Protegem, mas não blindam totalmente.

O Brasil tem um excesso de reservas. São maiores do que as da França, da Alemanha e do Reino Unido. O custo é elevado. Para carregar as divisas, o Banco Central gasta R$ 70 bilhões por ano, o que equivale à metade do déficit primário do país. É uma despesa que pode ser reduzida.

Estudos técnicos do Fundo Monetário Internacio­nal indicam que o volume de reservas razoável para a economia brasileira seria de US$ 240 bilhões, um montante 37% menor do que o atual.

Além de exageradas, há também uma rigidez que deveria ser repensada. Quando se fixou o patamar atual, o déficit em transações correntes era cinco vezes maior do que agora. Com contas externas mais sólidas, o razoável seria observar uma redução no volume.

Há outro custo da política cambial que é o da volatilida­de da taxa. É uma das mais altas do mundo. Tem efeitos adversos no agro, na indústria, no turismo e no risco de operações financeira­s. Ilustrando o ponto, o vaivém dos preços dos combustíve­is, por conta da influência do dólar, aponta como é ruim para a atividade econômica.

A questão é o que fazer. O mais urgente é diminuir o volume de reservas. Atualmente, correspond­e a 27% da dívida pública. Com um nível menor, haveria uma redução no mesmo montante do endividame­nto do governo com despesas de juros menores e ganhos para a solvência do país.

A segunda correção seria modernizar a anacrônica legislação cambial. A lei foi assinada há 85 anos, quando o país era outro. A alteração mais importante seria permitir contas em divisas para cidadãos e empresas no Brasil. Atualmente, só estão autorizada­s no exterior.

A medida teria três vantagens: a primeira seria um ganho fiscal, pois o custo de carregamen­to das reservas internacio­nais seria dos correntist­as, e não do governo. Outra é que daria um “hedge” natural para empresas se protegerem dos humores dos mercados financeiro­s. Terceiro, diminuiria a volatilida­de do câmbio ao aumentar a dimensão e capilarida­de do mercado.

A raiz das disfunções é a demora da política econômica em se adequar à realidade em transforma­ção. No mercado de câmbio, o cidadão pode ter posições de bilhões de dólares no mercado futuro e contas em bitcoins, o que é razoável em 2018, mas não é autorizado a ter contas em dólares em bancos no Brasil, algo que fazia sentido em 1935.

Não é um caso único. O sistema de pagamentos atual convive com uma oferta de crédito de meio século atrás. Pode-se fazer mais ainda, como criando uma jurisdição offshore ou melhorando os canais de transmissã­o da política monetária. Urge uma política econômica adequada ao Brasil de 2019. Ano novo, vida nova!

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