Decisão sobre família de Lula pode afetar filhos do presidente
Veto atingiria as candidaturas de Eduardo e Flávio Bolsonaro a prefeito em 2020
Com votações expressivas, o deputado federal reeleito Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e seu irmão, o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), têm sido citados como potenciais candidatos para disputar prefeituras em 2020.
Mas uma decisão que barrou a candidatura de um enteado do ex-presidente Lula há dez anos pode ser empecilho para isso.
Os filhos de Bolsonaro esbarram em um dispositivo na Constituição conhecido como “inelegibilidade por parentesco”.
Previsto no artigo 14, determina em seu parágrafo 7º que “são inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção”, do presidente, governadores ou prefeitos —salvo se for candidatura à reeleição.
Foi esse dispositivo que barrou a candidatura de Marcos Claudio Lula da Silva a vereador em São Bernardo do Campo (SP) em maio de 2008, por decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Lula estava em seu segundo mandato como presidente.
Na época, considerou-se que o território de jurisdição de Lula era todo o país. Assim, a aplicar-se a mesma regra, Eduardo e Flávio, especulados como candidatos a prefeito de São Paulo e Rio respectivamente, estariam impossibilitados de concorrer.
Já Carlos Bolsonaro (PSCRJ), outro filho do presidente eleito e que é vereador no Rio de Janeiro, poderia concorrer, mas apenas à reeleição.
No entanto, especialistas ouvidos pela Folha afirmam que poderia haver uma reinterpretação do caso. Para eles, o conceito de jurisdição na Constituição dá margem para duas linhas distintas de exame.
“O texto [da Constituição] é meio sofrível nessa parte, em não ser claro sobre o que é essa circunscrição. Porque o município está dentro da nação, mas não é circunscrição federal. Aliás, nem a eleição é a mesma”, pondera Diogo Rais, professor de direito eleitoral da Universidade Mackenzie e FGV.
A outra linha de interpretação, que foi voto vencido no julgamento da candidatura do enteado do ex-presidente Lula, defende que a jurisdição do presidente é válida apenas para cargos federais.
Por essa visão, os três filhos de Bolsonaro estariam aptos para disputar as eleições de 2020.
“Os ministros do TSE e os juízes dos tribunais eleitorais servem por dois anos e nunca por mais de dois biênios consecutivos, o que pode trazer uma grande dinâmica para a jurisprudência”, diz a ex-assessora de Comunicação do TRE-SP (Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo) Eliana Passarelli, que não descarta mudanças futuras no entendimento da Justiça sobre o assunto.
Rais também acredita em uma possível releitura da norma, à medida que se aproximar o próximo pleito.
“Creio que isso vai voltar para o Judiciário em 2020, porque a redação do artigo [da Constituição] é controversa e há defesas nos dois sentidos. A última decisão que tivemos é de vedação desse direito. Porém, foi em outro tempo”, declarou.
O dispositivo da inelegibilidade por parentesco previs- to na Constituição tem como função evitar favorecimentos dos titulares de cargos executivos em relação aos seus parentes e também para que não haja perpetuação no poder por grupos familiares.
Além do clã dos Bolsonaro, outros dois exemplos de famí- lias que conseguiram emplacar mais de um candidato nas urnas neste ano são os Barbalho, no Pará, e os Calheiros, em Alagoas.
Enquanto os filhos conquistaram os governos locais, os pais se reelegeram para o Senado.
“No caso dos detentores de cargos no Legislativo, o favorecimento do parente em razão do cargo público é mais complexo, uma vez que não há decisão individual, é necessário que muitos concordem para que haja o favorecimento”, explica Passarelli.