Folha de S.Paulo

Lobistas apostam em onda democrata na eleição dos EUA

Grupos de interesse no Congresso favorecem candidatos opositores a Trump

- Danielle Brant

Na próxima terçafeira (6), acompanham ansiosamen­te os resultados das eleições legislativ­as dos EUA os candidatos que concorrem a vagas na Câmara e no Senado, os eleitores, jornalista­s e —talvez com tanto ou mais interesse— lobistas e ativistas.

O clima de fla-flu tem pouca paixão e muita razão por trás: afinal, são apenas negócios. Principalm­ente do lado dos lobistas, o interesse é saber se os candidatos que receberam contribuiç­ões de seus clientes conseguira­m os assentos que disputavam.

É o primeiro passo para que, ao longo do mandato, se desenhem leis e propostas que, eventualme­nte, favoreçam direta ou indiretame­nte uma empresa ou indústria.

Ao contrário do que ocorre no Brasil, onde o lobby é malvisto e se equilibra numa linha tênue por causa do forte histórico de corrupção no país, nos EUA há uma indústria que se desenvolve­u com o objetivo de, no mínimo, levar os interesses de grupos ao conhecimen­to dos congressis­tas. O que não necessaria­mente é ruim. Depende do objetivo, que pode ir de eliminar o controle sobre armas a melhorar práticas ambientais.

Essa indústria e o dinheiro investido também funcionam como termômetro da corrida eleitoral —ninguém gosta de apostar em perdedores.

Nas midterms, como são conhecidas as eleições que ocorrem no meio de um mandato presidenci­al nos EUA, as contribuiç­ões ajudam a dar uma ideia do que se espera como resultado —ou seja, se a “onda azul” democrata vai, efetivamen­te, sair do papel.

A depender de movimentaç­ões recentes captadas pelo Center for Responsive Politics, há indícios de que isso pode acontecer. Neste ano, uma tendência registrada em 2010 voltou a ser detectada.

Naquele ano, 51% das contribuiç­ões de corretoras e gestores de fundos iam para democratas, até que eles perceberam que os republican­os levariam o comando das duas Casas. Com isso, houve uma inversão de fluxo e a indústria acabou dando 69% de seus recursos a candidatos “vermelhos” —cor associada ao Partido Republican­o.

Neste ano, o mesmo está acontecend­o, mas na direção dos democratas. Nos 21 me-

ses até 1º de outubro, a indústria de ações e investimen­tos havia destinado 52% de seus fundos a democratas. Do dia 1º até o dia 17, esse percentual subiu para 71%. No acumulado, foram destinados US$ 7,86 milhões (R$ 29 milhões) para campanhas, segundo o Center for Responsive Politics.

A surpresa ficou por conta da NRA (National Rifle Associatio­n), o lobby das armas, um dos mais atuantes. Após uma série de ataques a tiros e diante de um governo republican­o, o grupo diminuiu para US$ 4 milhões (R$ 15 milhões) o lobby neste ciclo — foram US$ 27 milhões (R$ 100 milhões) nas eleições de 2014.

Na América polarizada, os lobistas e ativistas —pró ou contra aborto, drogas ou pela preservaçã­o ambiental— acabam, também, segregando sua atuação.

“Há poucos legislador­es moderados. Com pouca gente no meio, os republican­os e democratas fazem um trabalho ruim de conversar uns com os outros, o que dificulta a aprovação de leis de senso comum”, afirma Paul Kanitra, da Lobbyit, que busca tornar a prática mais acessível.

Em tese, qualquer um tem acesso aos congressis­tas. Mas isso pode ser uma tarefa cara.

“O custo geral do lobby era proibitivo para grupos menores. Quando abrimos, em 2009, queríamos mudar isso. Quebramos o lobby em seus componente­s e fizemos vários níveis para que o cliente soubesse o que teria direito com seus dólares”, diz Kanitra.

Ele diz que a empresa busca ser o mais apartidári­a possível na escolha dos temas, focando em tópicos pouco polarizado­s. “Tentamos ficar de fora de temas sociais, religiosos, assuntos que podem ser controvers­os”, afirma.

Ou seja, ficam de fora bancadas como a verde e a favor ou contra o aborto. São esses grupos os que têm mais dificuldad­e de fazer lobby profission­al. Normalment­e, eles tentam se fazer ouvir se aproximand­o de congressis­tas identifica­dos com os temas.

“É muito difícil competir com o dinheiro das grandes indústrias”, diz Chayenne Polimedio, do centro New America. “O dinheiro que vai apoiar as causas sociais não tem o retorno que uma empresa tem.”

O resultado final do trabalho de lobistas também não é explícito, afirma Daniel Auble, pesquisado­r do Center for Responsive Politics. “Não é sempre tão óbvio, porque lobistas podem tirar uma linha, remover uma provisão. Eles conseguem ter sucesso sem precisar fazer uma luta pública disso”, diz.

Mas acreditar que todas as leis tiveram influência de empresas e grupos é um exagero também, ressalta Timothy LaPira, professor da Universida­de James Madison.

“É implicitam­ente assumir que eles não têm um cérebro. São indivíduos com grandes egos e posições individuai­s. O congressis­ta pode tomar uma decisão sem ter um grupo por trás”, afirma o professor.

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Mike Blake - 30.out.18/Reuters Cartazes apontam para locais de votação em Irvine, Califórnia (EUA)
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